Existo onde me desconheço
aguardando pelo meu passado
ansiando a esperança do futuro
No mundo que combato morro
no mundo por que luto nasço
(Identidade, de Mia Couto)
O desejo era o autoconhecimento. Era encontrar pontos de confluência, mas também convergências, que pudessem revelar mais deles mesmos. Afinal, decidiram entregar as suas vidas à arte, ao teatro, como fazem questão de dizer no espetáculo. Então nada melhor do que se debruçar sobre a história desse ofício não só para resgatar o passado, mas para conseguir se livrar de quaisquer amarras, preconceitos, e seguir adiante. Era pretensioso o projeto da Trup Errante, formada em Petrolina, no Sertão pernambucano: trazer à cena a história de 2.500 anos de teatro. Como era mesmo muito amplo, decidiram ao menos se concentrar um pouco mais no olhar feminino sobre essa arte. E assim surgiu Amaranta, espetáculo apresentado no último fim de semana da V Mostra Capiba de Teatro. É também o projeto de conclusão de curso do diretor Thom Galiano, sob a orientação de Érico José.
A execução da proposta do grupo ainda é um desafio a ser construído. Se logo no início a musicalidade, a participação lúdica do público – com estrelas brilhando que ganham nomes de atrizes – , a revelação da personagem Amaranta, prendem a atenção do espectador, isso vai se perdendo aos poucos. Para um grupo que leva ao palco uma organização caótica, a quebra da cena para que os próprios atores possam se colocar, deixa vários espaços para a improvisação, e encena até uma briga entre os próprios atores, é contraditório que, em muitos momentos, a opção seja pelo didatismo – e olhe que uma das próprias personagens brinca com isso. “Isso não vai dar certo, está muito didático”. Talvez o grupo tenha mesmo que aceitar que a identidade do espetáculo está na formalização do “caos”.
Se não dá mesmo para apresentar a história do teatro, como o próprio grupo percebe, há que existir uma apropriação maior e mais natural dessa história, para que o público possa compreendê-la, mas de forma mais fluida. Mesmo caótica, como se propõe a encenação de Thom Galiano, a dramaturgia (e para isso ela não precisa perder os pontos de fuga para a improvisação) precisa ser melhor costurada, repensada. Ao mesmo tempo em que é bom ver as atrizes refletindo em cena sobre o seu papel, assumindo os seus nomes e não o de personagens, não dá para que o espetáculo vire uma terapia de grupo. Isso até é possível, mas se a proposta for mesmo esquecer o público ou ao menos não se importar com a recepção do espetáculo.
Ainda assim, apesar das falhas na sua execução, Amaranta reflete a coragem de um grupo jovem, mas com muito talento. Nesse espetáculo, estão em cena Brisa Rodrigues, Joedson Silva e Raphaela de Paula. Dá para perceber o quanto há empenho e superação das dificuldades, seja na iluminação, nos elementos de cena, no próprio trabalho do ator. A musicalidade é um elemento que acrescenta e a participação do público, se eles conseguirem surpreendê-lo assim como no início da montagem, pode ser bastante efetiva. É um trabalho que tem tudo para amadurecer.