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Ode cômica para Olinda e Recife

O Mascate, a Pé rapada e os Forasteiros, com Diogenes D. Lima

O Mascate, a Pé rapada e os Forasteiros, com Diogenes D. Lima

Em seu livro Locuções tradicionais no Brasil, Luís da Câmara Cascudo registra a expressão pé-rapado como sinônimo de “descalço, de pés nus, pé no chão”. Por metonímia é uma qualificação oferecida à “mais humilde categoria social”. Pé-rapado era o pobretão, sobretudo da zona rural, que andava descalço e por isso era obrigado a raspar (ou rapar) os pés para lhes tirar a lama.

Não se sabe exatamente quando surgiu a expressão, mas aponta Câmara Cascudo que o termo é encontrado na segunda metade do século XVII nos versos que Gregório de Matos. A locução também foi muito utilizada na Guerra dos Mascates, no início do século XVIII, aqui em Pernambuco. Os portugueses, os mascates do Recife chamavam a nobreza de Olinda pelo depreciativo apelido de Pés-rapados. Essa aristocracia rural combatia sem sapatos contra a cavalaria de botas.

O ator Diógenes D. Lima utiliza vários recursos do humor para tratar dessa relação entre Recife e Olinda de várias épocas no espetáculo O Mascate, a Pé rapada e os Forasteiros, que faz uma apresenta nesta quinta-feira, na programação da 9ª Mostra Capiba de Teatro do Sesc de Casa Amarela.

D. Lima manipula os artefatos e interpreta os personagens, articulando signos visuais e sonoros num tom satírico e sarcástico, mas sem perder a visada lúdica.

Com a linguagem do teatro de objetos, uma narrativa cômica e fictícia sobre a história, o artista celebra criticamente as duas cidades. Ele destaca e subverte símbolos e peculiaridades culturais, de ontem e de hoje.

O encenador Marcondes Lima assina a supervisão artística do espetáculo, juntamente com o ator e diretor Jaime Santos, do grupo La Chana da Espanha.  Jathyles Miranda é o responsável pelo plano de iluminação. O bailarino Fernando Oliveira cuida das coreografias do espetáculo. É do ator e designer gráfico Arthur Canavarro a programação visual do projeto e dos diretores de arte Triell Andrade e Bernardo Júnior a confecção dos adereços. A produção-executiva é de Luciana Barbosa.

SERVIÇO
O Mascate, a Pé rapada e os Forasteiros
Onde: Teatro Capiba, Sesc de Casa Amarela
Quando: Nesta quinta-feira, às 20h
Ingressos: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia-entrada)
Duração: 60 min
Classificação: 16 anos

FICHA TÉCNICA
Texto e Atuação: Diógenes D. Lima
Supervisão Artística: Marcondes Lima e Jaime Santos
Coreografias: Jorge Kildery
Adereços: Triell Andrade e Bernardo Júnior
Iluminação: Jathyles Miranda
Execução de Iluminação: Rodrigo Oliveira
Execução de sonoplastia: Júnior Melo
Programação Visual: Arthur Canavarro
Fotografia: Ítalo Lima
Gerente de Produção: Luciana Barbosa
Produção: AGM Produções

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Mascate passeia por Recife e Olinda

Espetáculo O Mascate, a Pé rapada e os Forasteiros em cartaz no Hermilo Borba Filho. Foto: Antonio Rodrigues

Não está fácil fazer teatro no Brasil. No Pernambuco multicultural, vixe! Mas os artistas das cênicas são resilientes e seguem pelejando. Parece até aquela marchinha de carnaval. Com dinheiro ou sem dinheiro, eheheheh eu brinco. No caso, brilha… É isso que eles querem: brilhar. Esse é o contexto do espetáculo O Mascate, a Pé rapada e os Forasteiros, que inicia sua segunda temporada nesta quarta-feira (3), no Teatro Hermilo Borba Filho, com sessões às quartas e quintas de agosto, sempre às 20h.

Diógenes D. Lima encarou o desafio de processar as inúmeras histórias do Recife e de Olinda para erguer essa montagem que utiliza objetos. Falar das cidades-irmãs pode render homenagens pela trajetória de ambas, mas também críticas à realidade contemporânea. O tom é satírico.

O ator manipula e interpreta seus objetos/personagens a partir de uma caldeirão de influências, inclusive da música do saudoso Reginaldo Rossi, que cantou as belezas das cidades, com romantismo exagerado e muitas alfinetadas de ironia.

Os ingressos estarão a venda na bilheteria do teatro, somente nos dias de apresentação, a partir das 18h.

SERVIÇO
O Mascate, a Pé rapada e os Forasteiros
Onde:Teatro Hermilo Borba Filho (Cais do Apolo, s/n – Bairro do Recife
Quando: 03, 04, 10, 11, 17, 18, 24, 25 e 31 de agosto (quartas e quintas, às 20h)
Ingressos: R$ 30 (inteira) e R$ 15 (meia-entrada)
Duração: 60 min
Classificação: 16 anos

FICHA TÉCNICA
Texto e Atuação: Diógenes D. Lima
Supervisão Artística: Marcondes Lima e Jaime Santos
Coreografias: Jorge Kildery
Adereços: Triell Andrade e Bernardo Júnior
Iluminação: Jathyles Miranda
Execução de Iluminação: Rodrigo Oliveira
Execução de sonoplastia: Júnior Melo
Programação Visual: Arthur Canavarro
Fotografia: Ítalo Lima
Gerente de Produção: Luciana Barbosa
Produção: AGM Produções

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Objetos que ganham vida

A volta ao mundo em 80 dias

Aguarde memórias familiares. De uma infância em que caixas de fósforo viravam soldados, talheres poderiam ser reis, qualquer coisa que tivéssemos à mão era instantaneamente personagem de um roteiro original. Não é preciso saber o que é teatro de objetos. Na realidade, faz bem pouco tempo que o termo foi criado – década de 1970. “Estamos trazendo algo muito novo; é, geralmente, a primeira experiência que as pessoas têm com esse tipo de teatro. Mas nós nos reconhecemos de alguma forma. Todos, quando crianças, já tivemos a experiência de teatralizar objetos”, recorda Lina Rosa Vieira, idealizadora do Festival Internacional de Teatro de Objetos (Fito), que será realizado no Marco Zero de hoje a domingo.

A primeira edição do festival ocorreu em 2009, em Belo Horizonte. Já passou, desde então, por Porto Alegre, Brasília, Florianópolis, Campo Grande e Manaus e foi visto por 115 mil pessoas. Lina, responsável pelo festival Sesi Bonecos (o Sesi é também o promotor do Fito), evento que deu outra dimensão aos mamulengos, levou os bonecos para grandes plateias, passou três anos pesquisando o teatro de objetos, até que o festival saísse do papel. “Não temos respostas ainda sobre o que é esse teatro, mas estamos começando a perguntar”, aposta Lina, que faz a curadoria do festival ao lado de Sandra Vargas, do grupo Sobrevento, de São Paulo.

Histórias de meia sola

No festival, teremos 13 grupos – espetáculos não só do Brasil, mas da Argentina, Holanda, Espanha, Israel, Bélgica, Itália e França. Como geralmente as histórias pedem uma proximidade maior com o público, o Marco Zero estará transformado neste fim de semana. Serão construídas três salas para 200 pessoas, duas para 50 e ainda uma estrutura para shows (entre eles Naná Vasconcelos e Tom Zé), performances, mostras de três minutos e vários tipos de cenografia interativa – desde bailarinas-saca-rolhas gigantes até um aquário feito só com objetos de luz ou uma chapelaria.

Naná Vasconcelos

“Para os espetáculos das salas, apesar do grade número de apresentações, sabemos que as entradas serão mais disputadas, mas é importante dizer que quem vier não vai perder a viagem, porque serão muitas as experiências neste mundo do teatro de objetos”, garante Lina. A programação é gratuita. Mas, para as salas de espetáculos, será preciso pegar ingresso com meia-hora de antecedência. O festival funcionará das 16h30 às 22h, na sexta-feira, e a partir das 16h30, sábado e domingo.

Ter ou não ter

Cenografia Fito

Entrevista // Katy Deville

Foi Katy Deville quem cunhou o termo teatro de objetos. A francesa fazia teatro de marionetes até conhecer Cristhian Carrignon, que vinha do teatro tradicional. Com ele, começou a criar histórias para personagens inusitados: legumes. Uma noite, depois de assistir à peça Pequenos suicídios (que está no Fito 2011), a francesa teve o insight – o que faziam era teatro de objetos. Katy vai apresentar 20 minutos sob o mar, da cia Théâtre de Cuisine, criada em 1979.

Katy Deville

O que é teatro de objetos?
O Teatro de Objetos é o teatro no qual representamos com objetos sem transformar a sua natureza, isto é, sem fazer dele uma marionete, mas criando uma dramaturgia a partir da associação de ideias que esse objeto, que está em cena, desperta no espectador. Essa associação de ideias, vem primeiramente, pela utilização que damos a esse objeto no cotidiano de todos nós, criando uma metáfora com essa função. Por isso no Théâtre de Cuisine, nós falamos que os objetos usados nos espetáculos devem ser objetos manufaturados e reconhecíveis por todos. Claro que, depois, para criar uma dramaturgia mais potente, pedimos aos atores para trabalharem com objetos carregados de alguma memória e assim poder encenar uma história muito particular onde o ator também se torna dramaturgo.

Qual a diferença entre teatro de objetos e teatro de animação?
A diferença é que no teatro de objetos, a manipulação não é o mais importante, muito pelo contrário, é uma manipulação muito casual e nada formal. Os atores estão sempre à vista do público e são, na maioria das vezes, autores das suas próprias histórias. A dramaturgia nasce da metáfora usando o mesmo mecanismo que usamos na poesia. No teatro de objetos não há intenção de humanizar um objeto, diferente do teatro de animação.

Foi você quem cunhou o termo “teatro de objetos”. Em que circunstâncias?
Quando eu conheci Cristhian Carrignon, eu vinha do teatro de marionetes e me sentia muito à vontade. Então, conheci Cristhian Carrignon, que vinha do teatro de atores, mas não se sentia à vontade lá. Começamos a fazer alguma coisa juntos em cima de uma mesa, no início com legumes, mas depois com objetos. Isso foi nos anos 1980. Nesse ano então conhecemos outras companhias como o Velo Theatre, Gare Central, Bricciolle, Theatre Manarf, que faziam um tipo de teatro muito parecido com o que fazíamos e com o qual nos identificávamos e que não era considerado, pelos marionetistas, como teatro de marionetes, nem pelos atores como teatro. Um dia, depois de assistir ao espetáculo Pequenos suicídios (que faz parte da programação deste FITO), saímos todos juntos vibrando com o que tínhamos visto, a genialidade daquele espetáculo onde um Sal de Frutas, se sentindo excluído, por um conjunto de balas (doces), se suicida ao se jogar num copo de água. No meio de risadas, eu disse que o que fazíamos era teatro de objetos, e essa terminologia ficou e foi se difundido com aquelas companhias e outras que surgiram depois.

Pequenos suicídios, Rocamora

Queria saber um pouco da sua história. Quando você começou no teatro? Era tradicional? E a partir de que ponto você começou a trabalhar com objetos?
Eu trabalhava com teatro de marionetes. Durante muitos anos, trabalhei na companhia de Philippe Genty, que é considerado um dos maiores nomes do teatro de animação, mas que trabalha numa linha mais híbrida, com formas, não necessariamente com bonecos. Hoje ele trabalha com atores que tenham uma formação de dança. Quando ainda estávamos na Companhia de Philippe Genty comecei o teatro de objetos com Cristhian Carrignon. Philippe Genty viu os nossos espetáculos do Théâtre de Cuisine e apontou que se tratava de algo diferente dentro do teatro de animação. Depois, mais adiante, nas suas oficinas, ministradas em muitos países, ele apresentava um módulo de teatro de objetos, como uma vertente do teatro de animação.

Li que “todo objeto animado, quando bem manipulado, neutraliza a presença do ator”. Você concorda com essa afirmação? Como o ator lida com isso?
Uma das técnicas que nós utilizamos no teatro de Objetos e de animação para conduzir o olhar do espectador para o boneco ou objeto que manipulamos, é justamente trabalhar uma postura mais neutra do ator-manipulador. Mas no teatro de objetos, às vezes precisamos não ser neutros, às vezes passamos o foco do objeto propositalmente para o manipulador, como se fosse um extensão do objeto, ou como se fosse um recurso cinematógrafico, como se fosse um zoom, como se saíssemos de um plano aberto para um fechado. Às vezes trabalhamos uma postura mais exagerada. O teatro de objetos, muitas vezes tem uma dose de crueldade e o ator joga com isso.

Que tipo de treinamento, de habilidade, o teatro de objetos requer do ator?
No teatro de objetos o ator deve ser um poeta, antes de mais nada. A forma é tão simples, que o que se diz deve ser potente, deve ser forte e provocador. O ator deve ser capaz de perder o medo de se expor e colocar o que há de mais íntimo, na memória que os objetos lhe remetem.

Numa vida tão racional, tão corrida, o que significa conseguir enxergar, em objetos comuns, personagens?
O teatro de objetos é de nosso tempo e de nossa sociedade. Qualquer que seja a história contada, o teatro de objetos fala sobre nós, através dos seus objetos manufaturados reconhecíveis por todos. O teatro de objetos fala das pequenas coisas cotidianas. Cada espectador tem a lembrança pessoal ligada a tal objeto. A qualidade de ver outras coisas através dos objetos é a de tocar nossa intimidade, de interrogar o enigma que nós somos aos olhos dos outros. Num tempo de pressa e tão racional parece que o nosso interior pede isso cada vez mais.

Apesar de inicialmente pensarmos que o teatro de objetos teria uma relação muito forte com o teatro infantil (não que isso não possa acontecer), nos surpreendemos ao encarar as possibilidades de crítica social que o teatro de objetos apresenta.
O teatro de objetos sempre foi para adultos, justamente por essa proposta de um jogo mental que o espectador deve fazer de associação de ideias, metáforas e figuras de linguagens, ferramentas que um adulto domina mais do que uma criança. Hoje temos espetáculos de teatro infantil de teatro de objetos, mas esse jogo de associação se dá pela forma: como o martelo que é um bode, na chamada do FITO. Mas não pela associação de ideias da sua função com outro significado, como por exemplo, no espetáculo Pequenos Suicídios, em que o Sal de Fruta se joga num copo de água e se suicida. Esse jogo mental uma criança muito pequena não é capaz de fazer e nem vai ver o humor e ironia nisso.

Queria que você falasse um pouco sobre as relações entre política e teatro de objetos.
O objeto a partir de sua criação, seja ela artesanal ou industrial, tem uma história, mais ele pode mudar sua imagem primeiro a partir da relação com o ator. Tudo pode ser sublimado ou rejeitado. Nesse sentido, o objeto tem um caráter político, na concepção mais pura desta palavra. Ele é atuante, é crítico, tem personalidade. Nós não temos relações típicas com os objetos. As relações se modificam a partir de cada processo criativo, até quase desaparecer dentro das últimas criações. Mas isso não quer dizer que somos fetichistas. É verdade que nossos temas prediletos giram em torno da infância, da nossa infância, nós que envelhecemos todos os dias…

No teatro de objetos, o texto tem uma importância menor?
O texto no teatro de objetos é muito importante, tem um papel fortíssimo, mas porque são texto muitas vezes autobiográficos. Nascem da relação que o objeto desperta nesse ator que está disposto a expor o que há de mais íntimo nele. O texto não tem um papel secundário. Na verdade, o teatro de objetos faz criar textos muitos profundos e provocadores que não seriam criados de outra forma a não ser com essa linguagem.

Normalmente, os espetáculos de teatro de objetos são para poucas pessoas. Isso é diferente para o ator? Muda a relação com a plateia?
O bonito do teatro de objetos é isso, é um teatro onde a forma como são encenadas as histórias faz parecer que estamos todos no mesmo barco, num momento mágico e delicado, um encontro íntimo entre atores e manipuladores. A diferença para o ator é que essa proximidade e intimidade o obriga a tomar posturas, a revelar o seu ponto de vista em relação ao que se está falando em cena.

Você já escreveu que “o objeto do teatro de objetos tem uma identidade cultural e é experimentado-o em diferentes culturas que ele se torna universal”. Qual a diferença do teatro de objetos feito aqui no Brasil e na Europa? Como você já esteve em edições do Fito, de quais grupos brasileiros você destacaria o trabalho?
O que mais me chamou a atenção no teatro de objetos no Brasil é a quantidade de espetáculos voltados para o público infantil. Na Europa, temos poucos trabalhos direcionados para as crianças.

Você também disse que o teatro de objetos na Europa continua confidencial. Porque isso?
O teatro de objetos é confidencial e íntimo. Mas hoje em dia temos companhias muito jovens que trabalham histórias menos intimistas, mais cinematográficas e que brincam com todos os códigos que esta linguagem permite. Já vi encenado uma espécie de espetáculo policial, com perseguições de carros, escaladas de prédios, etc, que tomam um ar muito engraçado.

20 minutos sob o mar

Queria saber um pouco do espetáculo 20 minutos sob o mar. Quando foi criado? De quem foi a ideia? Onde já foi apresentado? Quais são as especificidades?
O espetáculo foi criado a partir de um sentimento meu de uma raiva de mulher, de fêmea, de feminista, mas isso naquela época, em que o modelo de mulher era ou a bela e fatal como Brigitte Bardot, ou aquelas esposas cheias de filhos que não trabalhavam. Por isso, o nome mar que em francês tem uma semelhança com a palavra mãe. Era a oportunidade que eu encontrei de mostrar os dois lados da mulher, da mãe. Aqui no Brasil já o apresentei em todas as edições do Fito.

Quantas pessoas formam o Théâtre de Cuisine? Vocês só trabalham com objetos?
Nós trabalhamos somente com teatro de objetos. O Théâtre de Cuisine é uma companhia estável que recebe uma subvenção do governo. Temos um quadro estável na área de administração e trabalhamos com 3 artistas fixos e 4 a 5 atores convidados dependendo do espetáculo.

Confira a programação completa do Fito no http://www.fitofestival.com.br/2011/programacao.

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A vida secreta dos objetos

Teatro de objetos para adultos

Você está lendo o jornal enquanto toma café da manhã. Na mesa, xícaras, pratos, talheres. Ou então está na mesa do escritório e lá repousam papeis, lápis, canetas, computador. Tente atiçar a sua criatividade: será que esses objetos podem ter outros usos, que não aqueles habituais? Já pensou que essa xícara pode ser um senhor muito velhinho; o prato um navio; o talher uma árvore falante? No Festival Internacional de Teatro de Objetos (Fito), tudo é possível. Depois de passar por lugares como Belo Horizonte e Manaus, o evento deve aportar no Recife, entre março e abril.

A ideia de criar o festival foi da publicitária Lina Rosa Vieira, diretora e curadora de iniciativas como o Cine Sesi Cultural e o Festival Sesi Bonecos do Brasil e do Mundo. “O espetáculo que me despertou para o teatro de objetos foi o de um grupo que fazia O avarento, de Molière, utilizando torneiras. Aquilo era criativo, inusitado. Depois fui vendo outros e percebendo que essa era uma linguagem específica”.

O Sesi apoiou a ideia, ainda que essa arte ofereça múltiplas possibilidades, inclusive a de criticar a produção de objetos em larga escala. “Mas o Sesi sabe que indústria cultural também é indústria. E a cultura faz parte da responsabilidade social deles”, explica. Lina lembra, por exemplo, de uma ocasião em que o espetáculo Histórias de meia-sola, apresentado com sapatos, do grupo Fernán Cardama, da Argentina, foi exibido numa fábrica de calçados. A montagem traz Aquiles Petruchelli, dono da loja A felicidade dos seus pés. E esse sapateiro mostra que cada sapato tem a sua história. “Lembro dos trabalhadores dizendo que nunca mais iriam olhar para os sapatos da mesma forma”, diz.

Aqui no Recife, o Fito deve ser realizado no Marco Zero, se estendendo provavelmente até um dos Armazéns do porto. Se a proposta e a própria poética do Sesi Bonecos favorecem eventos em praças, ruas, com muitas pessoas, como foi aqui em 2008, o Fito exige uma intimidade maior. É uma experiência de teatro: são quatro salas, com capacidade para 200 pessoas cada, com quatro ou cinco sessões por dia, num total de 20 espetáculos em três dias.

“Para muitas pessoas, é um despertar. Elas não sabem do que se trata e ficam encantadas”, diz a diretora. Talvez até por conta desse ineditismo, uma das ações importantes é a FitoMostra. O grupo XPTO, de São Paulo, faz pequenas performances e depois conversa com os espectadores.

Se 90% da curadoria do festival é feita de espetáculos internacionais, duas companhias de destaque no cenário brasileiro são a XPTO e a Cia. Gente Falante, do Rio Grande do Sul. Ao Recife, a Gente Falante deve trazer Louça Cinderella, que conta a história da Gata Borralheira só com objetos de chá; e Corsários inversos, que usa barracas, fechaduras, binóculos e câmeras. ´É uma questão de radicalizar o olhar sobre as coisas`, comenta Lina Rosa.


Criatividade em ebulição

A imagem de uma bailarina numa caixinha de música. Que rodopia tão bonito, ao som de uma música envolvente, encantando quem tem aquele objeto nas mãos, mas está presa a uma engrenagem determinada. Lina Rosa Vieira usou essa metáfora durante a entrevista que concedeu ao Diario para falar de como enxergava o teatro de marionetes, preso principalmente ao tamanho dos bonecos. Mas essa imagem da bailarina também poderia servir para a própria Lina, quando completou dez anos de carreira. Diretora de criação de uma agência, tinha vários prêmios e sempre buscou aliar a propaganda à informação inteligente. Só que ela podia muito mais: e o que era uma agência de publicidade, agregou também a cultura.

A proximidade com a área já existia. Desde sempre, desde que aprendeu a ler. Mas sabia que, com a publicidade e o empreendedorismo, poderia democratizar e socializar a cultura. Foi o Sesi, instituição que era atendida pela equipe criativa de Lina, que apostou num projeto simples, mas carregado de individualidade e importância: levar o cinema até lugares que não possuíam salas de exibição. ´Não é a experiência de ver um filme em casa, com alguém chamando, o pause. Cinema não é isso`.

E, como ela costuma dizer, o Sertão sempre foi musa inspiradora da sétima arte, mas os sertanejos não tinham acesso àquela arte. ´As salas dos anos 1960, 1970, foram fechadas nos interiores. Juntar pessoas só em comício ou procissão`. E Lina trouxe o cinema, que possibilita um olhar crítico aos outros dois – tanto a política quanto a religião.

O preciosismo da publicitária sempre rendeu bons frutos. Não eram sessões de cinema comuns. ´Se você tem cuidado com 30 segundos de comercial, vai ter cuidado ao criar uma coisa maior. Tem desde o tapete vermelho, a área completamente isolada, a pipoca`. Depois da primeira edição, o Sesi apostou ainda mais na ideia e hoje as sessões já rodou o país.

Depois das telas grandes, o teatro de bonecos. Lina conseguiu algo impensável para a marionete: reunir multidões em praças, espetáculos reproduzidos em telões,1 milhão e 800 mil espectadores Brasil afora. O Sesi Bonecos do Brasil e do Mundo antigiu os mais diversos públicos. ´Em Macapá, por exemplo, eu queria fazer uma apresentação numa comunidade indígena, mas acabei descobrindo que lá não tinha indígena, mas quilombolas, que falam francês, porque estão muito perto da Guiana Francesa`, exemplifica.

Foto: Sergio Schnaider

O Teatro de Objetos deu sequência ao Teatro de Bonecos e o próximo projeto, para 2012, é um ‘nanofestival’. ´Quero trabalhar com sensações, dimensões`, observa. ´Fazer as coisas sem criatividade pode até ser mais fácil, mas não mais prazeroso. Busco os desafios e esta edição do Fito em Recife nos dá um frio na barriga. Queremos que seja ainda mais especial!`. (Matéria minha publicada no Diario de Pernambuco na última sexta-feira, 11 de fevereiro)

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