Tadashi Endo em Fukushima mon amour. Foto: Reprodução do YouTube
Espetáculo fal da dor provocada pelo desastre nuclear ocorrido no Japão em 2011. Foto: Maciej Rusinek
A produtora Périplo faz um convite irresistível. Celebrar a vida do artista japonês Tadashi Endo, prestes a completar 73 anos. Além de circular pelo Brasil com espetáculos como Maboroshi, IKIRU – Réquiem para Pina Bausch, One-Nine-Four Seven e MA, Endo dirigiu peças do LUME Teatro e do Bando de Teatro de Olodum e ministrou oficinas de Butoh-MA. A proposta para este domingo, dia 30 de agosto às 19h, inclui uma conversa ao vivo entre Tadashi Endo e alguns convidados, pelo site www.periplo.com.br. E, a partir das 19h30, a transmissão por streaming do espetáculo Fukushima Mon Amour.
O bailarino Tadashi Endo sempre maravilha o público com a maestria dos seus trabalhos solos. Em Fukushima Mon Amour o artista traduz com seu corpo, gestos, movimentos a dor de uma tragédia para não esquecer. O desastre nuclear ocorrido no Japão em 2011 – um tsunami que sacudiu parte da costa do Japão e fez explodir a Central Nuclear de Fukushima – e a esperança de reconstrução alimentam o espetáculo. Mas também questiona o que o ser humano está fazendo para a preservação da vida. Endo dança a sensibilidade dos japoneses, o sentido de cooperação, a resistência e a resiliência frente aos desastres naturais. Mas também pergunta “por que o homem nunca aprende com os desastres causados por ele mesmo”.
O título do solo remete ao filme Hiroshima, mon amour (1959), do cineasta francês Alain Resnais – a história de amor de uma atriz francesa com um arquiteto japonês, após o ataque das bombas atômicas em Hiroshima e Nagasaki. Mas a montagem não faz menção direta ao filme.
Endo reside na Alemanha desde a década de 1980. Bailarino de Butô, coreógrafo e diretor do “MAMU – Butoh Center” em Göttingen, Alemanha, ele acumula em sua carreira a sabedoria das tradições do teatro e da dança, ocidental e oriental. Kazuo Ohno (1906-2010) foi seu mestre.
Com uma trilha sonora composta pelo brasileiro Daniel Maia, a dramaturgia de Fukushima Mon Amour busca levar ao palco as sensações do impacto provocado pelo desastre (que deixou centenas de mortos e feridos, além da liberação de material radioativo) utilizando projeções como elemento cênico.
A dança Butoh-MA, trabalha com o mínimo de movimentos para alcançar elevada intensidade da expressão dos sentimentos, cultivando um equilíbrio entre energia, controle e tensão. A obra de Tadashi destaca questões essenciais do amor, da vida e da morte.
Essa programação se articula à ação da FarOFFa solidária que solicita ao público que faça doações para apoiar 14 instituições que trabalham com pessoas em situação de vulnerabilidade por conta dos efeitos da pandemia. Para obter mais informações de como doar acesse faroffasolidaria.
Em 2015, escrevi sobre Fukushima Mon Amour, ocasião em que Tadashi Endo levou o espetáculo ao Recife.
Confira a crítica!
SERVIÇO Conversa com Tadashi Endo + exibição de Fukushima Mon Amour Quado: 30 de agosto, às 19h
A exibição será feita pelo site e pelo YouTube da Périplo.
Tadashi Endo no Recife em Fukushima Mon Amour. Fotos: Renata Pires
Diante do bombardeio de imagens sobre toda sorte de violência criamos camadas protetoras. As dores dos outros são flechas das quais procuramos desviar, mesmo que catástrofes e tragédias eclodam na esquina e do outro lado do mundo. Quando não estamos envolvidos buscamos passar incólumes. Mais insensibilizados, como se o destino da humanidade não nos dissesse respeito. Uma arte potente, no entanto, grita: acorde. Uma arte urgente rasga as capas impermeáveis e religa uma luz de dentro.
O segundo solo que Tadashi Endo trouxe ao Recife – Fukushima Mon Amour – é ainda mais impactante que o outro Ikiru – Um Réquiem para Pina Bausch (que ele apresentou em 2013, também na Caixa Cultural Recife). Mas esse impacto não está associado a grandiloquência e sim às sutilezas. Ele dança motivado pelos horrores de um desastre nuclear ocorrido no Japão em 2011, que vitimou milhares de pessoas.
Um foco está nesse passado recente, da destruição, de imagens de corpos mutilados, cadáveres, danos e perdas. E outro no devir mais promissor, num futuro mais harmonioso, construído a partir da solidariedade, da fraternidade.
Em Fukushima Mon Amour , bailarino tabalha com claros-escuros
Fukushima Mon Amour foi erguido em parceria com o músico Daniel Maia, que compôs a trilha sonora original. O som é fundamental nessa partitura cênica. Para criar o clima, arrancar sentimentos adormecidos do espectador. Há o som de risos de crianças, de algo que parece água, da contemplação do bailarino duplicado. Há o som forte de ruína e desespero.
O bailarino e diretor Tadashi Endo tem 68 anos e dança leve como um pássaro, explorando sua técnica de encenação Butoh MA. Ele cria desenhos de uma beleza comovente com seu corpo magro, que ora ele investe frágil ora realça a vida em fúria. Em Fukushima Mon Amour, Tadashi traça o ser humano em situações-limite.
A vida e a morte tomam conta de seus gestos. Precisos, elegantes, quase espirituais. Ele dança com ternura. Faz reverência aos que se foram. Patina pelo palco nas asas da música. Suas indumentárias esboçam mudanças de sentimentos, do preto e do cinza da dor ao colorido da esperança.
Tadashi Endo enche e desmancha essas imagens, ocupando todo o palco.
Espetáculo levou plateia às lágrimas
A encenação conta com outros recursos potentes que contribuem para elevar a obra. São as projeções, que traçam trevas, sombras, relâmpagos e por outro lado, clarões.
Se por algum tempo – como está escrito nas projeções “Now I am become death” – a morte predomina, ela cede lugar a algo luminoso. A vida que insiste em vingar, as flores de cerejeira em projeção e uma vontade incomensurável de que o mundo seja melhor.
Contra qualquer evidência negativa, Tadashi Endo aposta na esperança
Tadashi Endo apresenta Fukushima Mon Amour. Fotos: Maciej Rusinek
A solidariedade se fez presente no Japão depois do horror da bomba atômica. Mas esse sentimento de cooperação se esgarçou nas últimas décadas no mundo todo. Resgatar o amor ao próximo e à natureza é urgente. O coreógrafo japonês, radicado na Alemanha, Tadashi Endo defende a retomada da profunda humanidade para qualquer miséria. E faz esse apelo na montagem Fukushima Mon Amour.
O acidente nuclear que ocorreu em 2011 é inspiração do espetáculo que faz temporada no Recife de 7 a 10 de janeiro, na Caixa Cultural. A música é assinada pelo compositor Daniel Maia, co-criador da performance.
Nesse solo, o corpo de Tadashi Endo está impregnado pela dor da tragédia e a esperança da reconstrução. O título da encenação faz referência ao filme Hiroshima, Mon Amour (1959), de Alain Resnais, que enfoca uma relação afetiva após os ataques de Hiroshima e Nagasaki.
A dança de Tadashi Endo tem por alicerce o Butoh-Ma – o estar entre. Sua técnica extrai o máximo de efeitos, conflitos e tons com o mínimo de movimentos. Delicados e flutuantes, numa conjugação de emoções.
Uma dança para lembrar a dor dos que sofreram com o acidente nuclear
Em 2013, Tadashi Endo veio ao Recife com Ikiru – Um Réquiem para Pina Bausch. O artista desenvolve uma relação criativa com o Brasil desde 2002. Depois da capital pernambucana, ele segue por Fortaleza, São Paulo, Brasília, Suíça, Costa Rica e Estados Unidos com seu Fukushima Mon Amour.
O espetáculo é uma produção do Theaterwerkstatt Hannover, em colaboração com o Butoh Centrum MAMU Göttingen, patrocinado pela cidade de Hannover e pelo Ministério da Cultura da Baixa Saxônia. No Brasil, a turnê é assinada pela Périplo Produções e conta com o patrocínio da Caixa Cultural.
Serviço Fukushima Mon Amour Quando: de 7 a 10 de janeiro de 2015, às 20h Onde: Caixa Cultural Recife (Av. Alfredo Lisboa, 505 – Bairro do Recife) Quanto: R$ 20 e R$ 10 (meia) Informações: (81) 3425-1900
Desta terça (6) a sábado os ingressos para o espetáculo “Fukushima Mon Amour” serão vendidos, das 12h às 20h, na bilheteria da Caixa Cultural Recife. Para os quatro dias de espetáculos foram disponibilizados 320 ingressos (80/dia). O limite de compra é de dois bilhetes por pessoa, por dia de apresentação.
FICHA TÉCNICA Concepção, coreografia e dança: Tadashi Endo Diretor Musical e compositor: Daniel Maia Iluminação: Matthias Alber e Tadashi Endo Vídeo arte e efeitos visuais: Jürgen Salzmann Dramaturgia: Sabine Trötschel
Turnê Brasil 2015 Iluminação: Maurício Shirakawa Sonorização: Daniel Maia Vídeo: André Menezes Produção Executiva: Mariana Novais Diretor de Produção: Pedro de Freitas Produção no Brasil: Périplo Produções
Ikiru – Um réquiem para Pina Bausch. Fotos: Renata Pires/divulgação
O bailarino japonês Tadashi Endo nos faz experimentar muitas sensações através da sua dança, do duelo entre a delicadeza e a força das imagens que constrói com o corpo no palco. Tadashi é um dos discípulos de Kazuo Ohno, criador do butoh ao lado de Tatsumi Hijikata. Desde 2002 vem regularmente ao Brasil, principalmente a convite do LUME Teatro, de Campinas. Já fez algumas temporadas pelo país, mas só chegou ao Recife semana passada, para apresentar o espetáculo Ikiru – Um réquiem para Pina Bausch. No solo, Tadashi trata de vida e morte; lembra Pina, Michael Jackson (de quem era fã: “ninguém consegue dançar como ele) e Kazuo Ohno. Dança com os mortos e, mais do que isso, consegue trazê-los de volta – ao menos sentimentalmente. Esta é a primeira parte de uma conversa que Tadashi teve com jornalistas na véspera da sua estreia no Recife, na Caixa Cultural.
Entrevista // TADASHI ENDO – Parte I
Bailarino japonês fez quatro sessões com ingressos esgotados na Caixa Cultural
Butoh
Nos anos 1950, o butoh era mais um protesto contra a americanização do teatro e da dança japonesas. E nós fazíamos muito mais happenings. Isso significa que este tipo de manifestação contra alguma coisa não era como dança. Depois, Tatsumi Hijikata, o fundador do butoh, descobriu especialmente o corpo do japonês e a vida do japonês. Se nós dançamos, geralmente toda a educação de dança vem do balé clássico. O exemplo típico é um tipo de beleza, um tipo de luz, suave, mais branca e alta, todas essas direções positivas. O butoh é exatamente o oposto, porque a nossa vida existe muito mais com problemas, é muito mais suja, feia. E é preciso descobrir isso com o nosso corpo; não apenas do lado iluminado, mas também do outro lado, entre os dedos, atrás da orelha, debaixo do queixo, no pescoço. Isso é muito importante para o butoh, especialmente o nosso corpo. A nossa criação de dança começa no nosso corpo e dentro do nosso corpo. Se falamos em espaço, a dança contemporânea usa o espaço através das linhas diagonais, retas, verticais, circulares. Esse espaço para o butoh existe dentro do corpo, entre as costelas, entre os dedos. Esse espaço chamamos de cosmos. Estamos dentro de um grande cosmos, mas isso aqui (aponta para o corpo) é cosmos, é universo. Então a paisagem do corpo pode dançar – e algumas vezes acontecem terremotos e algumas vezes tsunamis, cachoeiras. Tudo isso acontece dentro do corpo. Esse espaço é muito importante e é o ponto principal do butoh.
Teatro ocidental x teatro oriental
Essa distinção é importante, mas temos que pensar em dois pontos diferentes. Um é, por exemplo, se você fala em teatro noh, kabuki, bunraku, que são manifestações tradicionais de teatro e dança do Japão, eles ainda são exóticos para os estrangeiros. Mas o butoh veio do Japão e, especialmente, a dança do butoh é para o corpo japonês. Isso foi no começo. Mas agora mais pessoas fora do Japão dançam butoh – no Brasil, no México, na Argentina, na Europa, na África. As pessoas dançam butoh. Mas no Japão, isso acontece mais ou menos. O butoh não é popular. Se você perguntar aos japoneses sobre o butoh, eles não sabem. O butoh veio do Japão, mas agora as sementes do butoh foram espalhadas em tantos lugares e estão surgindo flores dessas sementes. É claro que não é algo que podemos dizer que é uma dança japonesa apenas. Mas para mim é importante. Eu moro na Alemanha e trabalhei com muitos não-japoneses: europeus, americanos, brasileiros, mas trago o espírito do butoh para eles, não o estilo do butoh. Então desejo o butoh brasileiro. Há dois anos trabalhei em Salvador com um grupo afro-brasileiro. Então era butoh afro-brasileiro. Porque não? Os corpos são diferentes, eles são negros, a energia é diferente. Mas a Bahia não é somente alegria…há outro espírito. Isso é interessante. Mas se as pessoas imitam o butoh japonês, há algo errado. Esse não é o meu desejo.
Tadashi Endo é um dos discípulos de Kazuo Ohno
Trabalho
Eu tive muita sorte de vir para o Brasil e, da primeira vez que fiz o meu solo e dei um workshop, de começar a trabalhar com o LUME Teatro. E eu fiquei muito surpreso porque eu pensei antes de vir ao Brasil, claro que era muito clichê, eu imaginava o Brasil: sol, Copacabana, capoeira, samba, caipirinha, uma terra da felicidade. Mas quando comecei a trabalhar: “oh, eles também tem um lado negro, muito sensível da vida”. Não é só energia. E então descobri que em cada país existe esse tipo de sensibilidade, um pouco, não uma coisa sentimental, mas um lado negro solitário, único. Mas eu não quis fazer butoh japonês com as companhias brasileiras. Quis pegar mais delas, de cada vida diferente, de cada estilo diferente e, depois, vamos todos dançar sobre a base do butoh. Essa é a ideia. Venho para o Brasil desde 2002 quase todos os anos. O Brasil agora é quase a minha segunda casa, mas ainda não consigo falar português. Para mim, o Brasil é um país muito importante. Dependendo do país, se você trabalha no Brasil, México, Europa, você precisa conhecer primeiro o estilo de vida, não o estilo de dança, ou como eles dançam. A dança contemporânea brasileira, ou européia, ou japonesa, é quase a mesma, mas a vida é diferente e, se você entender esse ponto, então você pode colocar o espírito do butoh em diferentes estilos de vida. Por exemplo, o sentimento de tempo. O sentimento de tempo aqui no Brasil é muito diferente. No Japão, por exemplo, o tempo é muito preciso. No Brasil você espera 30 minutos, é algo normal. E o trem chega pontualmente no Japão, na Europa também e aqui no Brasil, se estiver um pouquinho atrasado, você não vê problema. Mas os brasileiros aproveitam a vida muito mais do que um alemão ou japonês, isso é o que eu acho. Porque nós temos que organizar tudo da nossa vida e morrer? Por que não curtir mais? Esse sentimento eu tenho especialmente no Brasil.
Manifestações no Brasil
Mais um ponto que eu quero falar: sobre as manifestações no Brasil. Quando eu estava em Fortaleza, todos os dias eu tinha que me apresentar, mas todos os dias, milhares de pessoas estavam nas ruas e também houve violência. Eu gosto de ver futebol e o Brasil é o principal país do futebol, o futebol brasileiro é tão popular. Mas nesse país vi tantos problemas. Prefiro parar a Copa do Mundo ou a Copa das Confederações e então começar a pensar: o que é realmente importante para nós? Esse ponto inicial podemos achar agora se fizermos mais. Eu tive sentimentos parecidos dois anos atrás quando houve o tsunami e aquela tragédia nuclear em Fukushima, um completo desastre. E o Japão foi o único país que recebeu uma bomba atômica. Porque o governo japonês não parou esse momento todos os reatores nucleares do país? A Alemanha parou. Mas outros países estão criando reatores nucleares novamente. Porque não podemos mudar desde a nossa base? Foi uma grande chance, mas isso não aconteceu. Eu estou muito desapontado, com raiva…Isso não está diretamente conectado com a minha dança do butoh, mas num ponto sim: em todo tempo, você precisa ser radical. Isso para um bailarino de butoh também. Eu crio algo e depois destruo. Nunca estou feliz com a minha peça. Não quero ficar feliz. Quero mais, mais, nunca parar. Do contrário, me torno muito preguiçoso e paro.
Espetáculo homenageia Pina, Michael Jackson e Kazuo Ohno
Pina Bausch
Pina Bausch e Kazuo Ohno eram bons amigos. Minha relação com Pina era realmente mais privada. Nunca aprendi com ela a dança-teatro e também nunca segui exatamente o trabalho dela. Mas eu a encontrei algumas vezes em festas e eram festas bem privadas porque as festas eram organizadas por Pina para Kazuo Ohno e quando Kazuo Ohno foi para a Europa, eu estava o tempo inteiro com ele como um assistente. E então nós bebemos juntos, fumamos, ela era uma fumante inveterada, o tempo todo fumando. E o carisma dela era tão maravilhoso; ela era famosa no mundo inteiro, mas nunca se mostrou: “eu sou uma grande bailarina” ou falou sobre outros bailarinos. Não, sempre muito tímida. Mas quando ela viajava, para Turquia, Japão, Israel, para qualquer lugar, em cada país diferente, ela criava diferentes peças. Porque ela me disse, como eu disse agora sobre Brasil, você tem que saber quem mora naquele país e não começar a trabalhar como bailarino. Coloque a vida deles na dança. E por essa razão normalmente quando ela começava, os trabalhos não tinham título, porque como você pode chamar a sua vida no Brasil? Ou no Japão? Eu não sei. A morte de Pina foi um grande choque para mim. E, quatro dias depois, Michael Jackson morreu. Também foi um grande choque. Eu amo Michael Jackson. Eu vi o show dele em Hanôver, num grande estádio de futebol. Fui com minha mulher e meu filho e nós estávamos no campo, em pé, em frente ao palco. Antes do show começar, houve um blecaute. E então uma grande luz. Michael Jackson estava no topo de uma estrutura e estava ventando. Por duas horas fiquei tão fascinado, os movimentos, a voz, a luz, tudo era perfeito. Então nós perdemos nosso filho. Meu filho tinha nove anos e olhei: “oh, droga! Milhares de pessoas. Nós perdemos nosso filho!” Mas, de novo, Michael Jackson, esqueci completamente meu filho. Quando o show terminou, achei um guarda e perguntei se ele tinha visto meu filho. Meu filho naquela época era muito fã de Michael Jackson, dançava um pouco de break, tinha um boné vermelho e luvas brancas. Nós achamos nosso filho. Onde estava meu filho? Ele estava no palco, ao lado do palco e ele estava tão feliz, sorrindo. “Papai, eu vi Michael Jackson a cinco metros de distância”. “Como você veio para o palco? É impossível”. “Dois seguranças, quando teve o blecaute, as pessoas começaram a vir para frente, era perigoso. Então os seguranças me colocaram no palco”. Os seguranças foram embora e meu filho não sabia o que fazer. Ficou o tempo todo no palco! Eu fiquei com tanta inveja! Gosto do Michael Jackson por causa da sua perfeição e uso algumas vezes suas músicas, seu ritmo, mas não posso dançar como Michael Jackson, ninguém pode. Mas eu quero capturar esse sentimento. E em Ikiru, eu queria dizer muito obrigado a Pina Bauch porque você me deu muita energia, e ambição, e coragem. Ela nunca me ensinou, nunca tive uma aula com ela. Mas se você conhece Pina, você entende mais do que técnicas de dança e por essa razão eu queria dizer, obrigado Pina. Mas depois que criei essa peça, também quero agradecer a Kazuo Ohno e a muitos mortos: obrigado Michael Jackson. Muitas pessoas que já morreram me ajudaram. Quando danço, é sempre uma homenagem a muitas pessoas que já morreram, não só Pina Bausch, mas Kazuo Ohno, e também meu irmão mais novo. E se eu sinto que continuo vivo, tenho que me tornar mais forte. Essas pessoas mortas me ajudaram nesse caminho. Claro que o público é importante, mas normalmente quando danço, no palco, tudo é vazio. Mas porque danço? Por causa do sentimento, da alma. Do contrário, meu movimento de dança é só técnica, movimentos técnicos. No meu palco vazio existem muitos mortos. E isso é o que eu sinto especialmente em Ikiru.
Demonstração de trabalho – No sábado, para uma plateia de bailarinos, atores, diretores, professores e jornalistas, Tadashi Endo fez uma demonstração de trabalho. Gravamos um trechinho: