Catapultar significa arremessar por meio de catapulta. Mas o que é essa coisa que quase faz enrolar a língua? Catapulta é uma “máquina de guerra que se destinava a lançar, sobre o inimigo, pedras, dardos ou outros projéteis de grande tamanho”, ensina o Dicionário Houaiss. Numa rápida pesquisa pelo Google encontramos que as “catapultas são mecanismos de cerco que utilizam uma espécie de braço para lançar um objeto (pedras e outros) a uma grande distância, evitando assim possíveis obstáculos como muralhas e fossos”.
Esses equipamentos apareceram em épocas gregas tardias (400 a.C. – 300 a.C.), adotadas por Dionísio de Siracusa e Onomarchus da Fócida. Alexandre, o Grande utilizou no campo de batalha durante as guerras. E foram desenvolvidas nos domínios romanos e medievais, até o aparecimento da pólvora e do canhão. Então, elas se tornaram obsoletas.
Encontramos essa primitiva máquina de guerra em filmes antigos ou desenhos animados, quando grandes pedras são arremessadas contra as fileiras inimigas. Mas a a palavra atualmente é mais uada em seu sentido figurativo, quando as competências são questionadas. Consta no Dicionário Informal: “Quando alguém é alçado a um posto muito além de sua capacidade, em detrimento de outros, merecedores do cargo, diz-se que esta pessoa foi “catapultada”.
A ação de catapultar e a máquina que catapulta são centrais no espetáculo infantil Bruxas da Escócia. É um achado de criatividade e solução cênica para a história de Macbeth, uma das tragédias mais sanguinolentas de William Shakespeare (1554-1616). A ambição é um verme que contamina corpo e mente do general do exército escocês, que de defensor leal do rei e de sua pátria se transforma em cobiçador da coroa, traidor e assassino.
Ao voltar de uma batalha, o general Macbeth encontra três bruxas que lançam uma profecia: ele se tornará rei. Aquilo mexeu com a cabeça do “plebeu” militar, despertou suas aspirações mais secretas. E lógico contou com os desejos sem limites de Lady Macbeth, essa uma verdadeira estrategista na série de crimes.
Macbeth já foi montada de diversas formas. Com todas as nuances de densidade. A Cia. Vagalum Tum Tum encara o desafio de levar peça para o universo infanto-juvenil. Utilizando para isso as técnicas do palhaço, da Comedia Dell´arte e dos Bobos. E eles vencem essa difícil batalha.
As mortes e maldades na encenação entram na lógica do palhaço, onde os defeitos são ampliados em gestos largos, em repetições, em gags. O jogo de corpo explora as deformações morais e inabilidade de alguns personagens. O elenco – formado por Tereza Gontijo, Christiane Galvan, Anderson Spada, Val Pires, Layla Ruiz, Erickson Almeida – domina plenamente o métier.
As batalhas são apresentadas com bofetadas e escorregões, sempre na perspectiva engraçada. A montagem é ágil e as cenas coreografadas trazem a riqueza técnica do palhaço. Muitos truques encantadores. Os artifícios na maquilagem, figurinos e máscara corporal diminuem a gravidade da trama original.
A ousadia do grupo transpõe a tragédia para um ambiente mais divertido e brincalhão simplifica essa corrente de maldade que povoa Macbeth. O diretor Ângelo Brandini amenizou as cenas mais pesadas. O sangue, por exemplo, é substituído por graxa. Os assassinatos e suicídios do texto original ganham a solução dos arremessos de catapultas em direção à floresta. Solução criativa.
Bruxas da Escócia é a quarta adaptação de Shakespeare da Cia Vagalum Tum Tum para crianças e seus acompanhantes. O grupo já verteu Otelo em Othelito, Rei Lear em O Bobo do Rei e Hamlet em O Príncipe da Dinamarca.
As músicas originais do espetáculo em clima de opereta, compostas pelo diretor musical Fernando Escrich, são executadas ao vivo pelo elenco. A encenação começa com uma coreografia de luta, como um esquente para os diálogos que se seguem.
Macbeth é um homem meio atrapalhado e irresoluto diante da mulher determinada. E os atores exploram bem essa ideia. Essa dupla face do protagonista: corajoso e medroso; sedento por poder, mas hesitante em praticar o mal. De melhor amigo do rei (o título é ótimo) a monarca, o general passa por situações, algumas vexatórias, que são as mais divertidas.
A floresta se moverá em direção ao castelo de Macbeth, formada por seus inimigos mal disfarçados de árvores, para cumprir a profecia das bruxas de que o general só seria derrotado no dia em que a floresta se movesse.
Mas a peça Bruxas da Escócia preserva o tônus do original. Da ambição pelo poder que deixa os homens insensíveis, da cobiça que passa por cima das pessoas, do juiz da própria consciência que aciona tumultos mentais. Não é uma peça para rir muito, embora haja momentos engraçados. O território de Macbeth é sombrio, apesar do colorido dos figurinos e do cenário. E é muito boa essa iniciativa da cia de levar Shakespeare para crianças. Com a tradução facilitadora que me parece necessária.
Eu adoraria ter tido essa oportunidade na infância. Melhor para os filhos e netos.
Ficha Técnica
Texto e Direção: Angelo Brandini.
Elenco:
Tereza Gontijo – Macbeth
Christiane Galvan – Lady Macbeth
Anderson Spada – Bruxa e mensageiro
Val Pires – Bruxa e Rei
Layla Ruiz – Bruxa e filho 1
Erickson Almeida – Filho 2 e Músico
Direção Musical: Fernando Escrich
Assistente de Direção: Val Pires
Figurinos: Christiane Galvan.
Assistente de Figurino: Mariana Lima
Cenário: Bira Nogueira
Iluminação: Wagner Freire
Confecção de Cenário e Adereços cenicos: Bira Nogueira
Produção geral: Cia. Vagalum Tum Tum
Stand-ins: Layla Ruiz, Rodrigo Freitas, Suzana Aragão
Assistente de Produção: Marina Mioni
SERVIÇO
Bruxas da Escócia
Onde: CAIXA Cultural Recife (Avenida Alfredo Lisboa, 505, Bairro do Recife, Recife/PE)
Quando: 27, 28, 29/10 e 03, 04 e 05/11. Quintas e Sextas, às 19h; Sábados, às 17h.
Ingresso: R$ 10,00 e R$ 5,00 (meia)
Classificação indicativa: Livre
Duração: 60 minutos
Informações: (81) 3425-1915