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Corpo em trânsito

Kleber Lourenço em Portugal. Fotos: Jorge Pereira

Ele não aguentou ficar longe do carnaval pernambucano. Encontrei-o trazendo a mala no elevador de um prédio no Centro da cidade, poucos dias antes da folia, dizendo que tinha conseguido agilizar a volta para casa depois de alguns meses em Portugal. Foi lá que Kleber Lourenço concretizou o seu terceiro espetáculo solo de dança contemporânea: Estar aqui ou ali?. Agora, mais uma vez, o bailarino, ator, diretor, performer vai experimentar o deslocamento. Estreia o espetáculo hoje, às 16h, em Petrolina, dentro de uma circulação promovida pelo Sesc, chamada Encena PE.

Muito coerente, aliás, já que o solo trata exatamente do trânsito, das identificações culturais construídas num percurso e os estranhamentos que decorrem desse processo. “Passei três meses sozinho em Portugal, mergulhado no trabalho. Buscando uma relação de reconhecimento nos lugares. E fiquei em Lagos, uma cidade turística, que tem semelhanças com o Recife. Tem uma ligação também com a história da colonização, com a rota de escravos”, conta.

A viagem foi realizada através do Programa de Candidaturas Internacionais do LAC – Laboratório de Actividades Criativas da cidade de Lagos. “Ano passado, oito artistas internacionais foram contemplados por esse projeto, de música, artes plásticas, com quem eu trocava muito”, relembra. Para compor o seu espetáculo, Kleber também viajou por todo o Nordeste à procura de identificar semelhanças e diferenças, estereótipos, a sensação de ser estrangeiro e de como é a adaptação a essa situação.

Já de volta ao Recife, na sala de ensaios do Teatro de Santa Isabel, Lourenço contou com a ajuda do coreógrafo Jorge Alencar, diretor artístico do grupo baiano Dimenti (ele assina a cocriação e colaboração dramatúrgica); e do músico Zé Guilherme, mais conhecido como Missionário José, que cuida das músicas dos espetáculos do intérprete desde Negro de estimação, segundo solo do bailarino. “Desta vez estamos tentando combinar coisas que teoricamente não se misturam, além de discutir a não-negação das músicas do ambiente, já que o espetáculo será apresentado na rua”, explica Missionário José.

Estar aqui ou ali? estreia hoje, em Petrolina

Em Petrolina, para a estreia e a realização da oficina Práticas corporais em trânsito (que já teve as incrições encerradas), o bailarino contará com a ajuda de Jorge Alencar, que tinha sido convidado por Kleber desde 2008 para compor o projeto. “Como colocar as teorias em prática, transformando em cena, isso me interessa bastante”, explica Alencar.

Estar aqui ou ali? ainda vai passar por Araripina, Bodocó, Buíque, Belo Jardim, Surubim, Caruaru e São Lourenço da Mata. No Recife, a apresentação será dentro da Cena bacante, projeto do Palco Giratório, no Espaço Muda, dia 27, às 23h, com a participação de Catarina Dee Jah e Júnior Black. Só aqui na capital pernambucana é que o espetáculo será apresentando num espaço fechado; nos outros lugares, o artista pretende interagir com a cidade e com os seus estímulos, se apresentando em feiras, praças, locais de grande circulação de pessoas.

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Vale da dança

A ideia era fazer um evento para celebrar o Dia Internacional da Dança, comemorado no dia 29 de abril. Mas a necessidade se mostrou maior: os espetáculos da cidade precisavam de visibilidade, havia o desejo por complementação na formação, por debates, por oficinas. Essa é a historinha da criação do Vale Dançar, festival realizado em Petrolina, Sertão pernambucano, que já vai para a sua quarta edição.

Além de movimentar a cena, o Vale Dançar tenta mostrar às autoridades que existe gente produzindo dança por lá, enquanto o poder público simplesmente não se manifesta. Uma cidade tão forte economicamente, um polo médico, educacional…e todas essas coisas que a prefeitura adora alardear… e não tem um teatro sequer! Ou melhor, tem. Porque existe o Sesc, instituição que trabalha há anos na região e realiza o Vale Dançar. Mas o Teatro do Sesc está fechado por conta de uma reforma que acabou de começar e deve durar pelo menos um ano e meio. Resultado? Os espetáculos que pedem um maior aparato de luz, som, terão que cruzar a ponte. Serão apresentados na Bahia, em Juazeiro, no Centro Cultural João Gilberto. E deve ser assim também no festival Aldeia do Velho Chico, que acontece em agosto, por mais de 15 dias.

“80% da programação do Vale Dançar é de espetáculos locais. Temos pelo menos quatro grupos de dança produzindo na cidade”, explica o supervisor de Cultura do Sesc em Petrolina, Jailson Lima, que é também diretor da Qualquer Um dos 2 Cia de Dança, que já tem três espetáculos no repertório: Vire ao contrário (2007), De dentro (2009) e Deixar ir (2010). Um dos diferenciais da companhia é que ela é formada só por homens.

Aluga-se um coração, da Qualquer Um dos 2 Cia de Dança

Além de Aluga-se um coração, novo espetáculo da Qualquer Um dos 2, inspirada no livro Amor Líquido, de Bauman e Deixar ir; da produção petrolinense, o festival apresenta ainda Esbórnia, da Cia de Dança do Sesc (grupo com 16 anos); Atração, da Cia de Dança Canuto; e as mostras de solos, duos e de dança contemporânea.

De Surubim, vai o espetáculo Valsa para cadáveres e desejos, da Solus Cia de Dança. É o primeiro trabalho coreografado e dirigido por André Chaves. São três bailarinos em cena. “É um estudo sobre as contrações involuntárias. Parkinson, cãibra, soluços. A gente parte daí como ponto de pesquisa do movimento”, conta Chaves. O espetáculo, complementa, é resultado de uma provocação feita por Raimundo Branco, da Compassos, que fez uma residência artística em Surubim ano passado.

Valsa para cadáveres e desejos. Foto: Luana Andrade

A convidada do Recife é a Cia Etc., com o espetáculo Silêncio, uma intervenção intitulada Involuntário, e ainda a participação de Marcelo Sena em alguns debates e na palestra Processos criativos em dança.

O Vale Dançar começa hoje, às 20h, e segue até o dia 1º de maio. Os espetáculos são gratuitos; já as oficinas custam R$ 15 para o público em geral e R$ 10 para comerciários e dependentes. Confira aqui a programação completa.

Silêncio, da Cia Etc. Foto: Breno César

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