O vozeirão da cantora transformista Elza Show reverbera contra as posições retrógradas de machistas disfarçados de deputados/pastores que exercem ação nefasta contra um rebanho sem discernimento. Em 2007, Elza sustentava, após a estreia do espetáculo Ópera, do Coletivo Angu de Teatro, que “O mundo é gay! ”. É verdade. O mundo é gay; é feminino e feminista, é negro e índio; é plural apesar do avanço dos podres poderes. É um pouco disso que registra a publicação Ópera e outros contos (114 páginas, R$ 30), do dramaturgo pernambucano radicado em São Paulo, Newton Moreno. A sessão de autógrafos ocorre nesta segunda-feira (16), às 18h, na Livraria Cultura do Paço Alfândega, com leitura dramatizada do Coletivo Angu para alguns textos.
Composta por 25 contos, a obra pinta cenários e personagens recifenses que não correspondem aos padrões do centro normativo. Essas figuras estão enroladas em aventuras afetivas e tragédias cotidianas. O escritor escala amores desmedidos, rasgados, exagerados, entre eles os que deram origem ao espetáculo Ópera, do Coletivo Angu e O Livro, que inspirou o espetáculo homônimo, com o ator Eduardo Moscovis.
A homossexualidade aparece nos contos Ópera, Surpresa, O primeiro casal, Virgem, João e Rosalinda, A despedida, O troféu e Tu nunca saberás o que é o amor.
Essa ‘margem da sociedade’ também é apresentada pelos contornos racial e econômico. Moreno dá visibilidade aos ‘exilados’, figuras que entram nas estatísticas como minoritárias; uma aquarela humana tomada pela diversidade. O autor instaura a poesia em personagens “esquisitos”, que quebram a hegemonia, que se reafirmam na sua estranheza, que mostram a força das bordas.
Entre as histórias estão a relação entre um cantor de ópera e um michê (que cede título ao livro); os dessabores da moça que perdeu a dentadura no primeiro dia do Carnaval no conto A Gaitada. Ou Surpresa, sobre o drama de uma tradicional família patriarcal pernambucana diante da descoberta da homossexualidade do cachorrinho doméstico.
Tem também Nega Sônia, que pegou uma doença que lhe embranquece e quer recuperar sua negritude, sua identidade; o escravo João que se liberta ao se assumir Rosalinda. Além de contos que utilizam recursos da literatura fantástica, do encantamento, como Ressurreição, A espera e Sem sangue.
O escritor Marcelino Freire assina o prefácio. O projeto tem incentivo do Funcultura, com produção de Daniela Varjal.
Newton Moreno coleciona prêmios, como o Shell e o da Associação Paulista dos Críticos de Arte (APCA). Com Guel Arraes e Claudio Paiva, ele escreveu a série Amorteamo (Rede Globo), que investe na trama de um Recife mal-assombrado e com histórias de amor entre vivos e mortos.