Ano passado, depois da coletiva do festival Palco Giratório, realizada no Teatro Marco Camarotti, o titulo da matéria que escrevemos aqui no blog dizia: “Palco Giratório mais enxuto no Recife”. A manchete era explicada pelo fato de que, em 2014, 33 companhias participariam do festival. No ano anterior, esse número havia sido bem maior: 42 grupos.
Agora, em 2015, a decisão do Sesc Pernambuco foi mais drástica: acabar com o Festival Palco Giratório Recife, que era realizado há oito anos no mês de maio e concentrava não só os espetáculos nacionais que estão circulando por todo o país, mas também uma programação local e convidados de outros estados. Como festival, era uma possibilidade de alcançar maior público com uma concentração de espetáculos e divulgação, de incentivar a troca entre os artistas e de propor reflexões sobre a cena, com um panorama bastante amplo, tanto da produção local quando nacional.
Com as dificuldades econômicas e sociais em todos os âmbitos políticos, não seria surpresa se o festival sofresse uma redução, mas não foi isso que aconteceu. A decisão de não realizar o festival, segundo José Manoel Sobrinho, gerente de Cultura do Sesc Pernambuco, “no momento é irreversível, ao menos para os próximos anos”.
Ainda segundo José Manoel, a questão não é de ordem econômica: “O Festival Palco Giratório, a despeito de seu significado e importância é uma ação que concentra recursos em um único mês e em uma única cidade. Este princípio não atende ao entendimento que o Sesc Pernambuco vem buscando operar na operacionalização e execução de sua Política de Cultura”. De acordo com o gerente, a instituição “desde 2012 vem intensificando a sua inserção no interior, implantando um modelo de trabalho sustentado no conceito de Corredor Cultural, tendo como objetivo aprofundar e ampliar a oferta de serviços em municípios, sem que obrigatoriamente haja uma Unidade Executiva do Sesc instalada”.
Pernambuco continua recebendo, em escala muito menor e de maneira desconcentrada, a circulação dos espetáculos escolhidos pela curadoria nacional para se apresentarem pelo país inteiro. Apenas 12 dos 20 grupos selecionados virão ao estado até novembro. Nacionalmente, o projeto acontece em 154 cidades. Pernambuco terá dois representantes na programação nacional: o bailarino Dielson Pêssoa, com o solo O silêncio e o caos; e o Balé Popular do Recife, que será homenageado nesta edição.
O silêncio e o caos, do bailarino Dielson Pessôa, vai circular pelo pais. Foto: Renata Pires
Balé Popular do Recife será homenageado nesta edição nacional do Palco Giratório
Galiana Brasil, curadora do Palco Giratório em Pernambuco, está em Brasília para o lançamento nacional do projeto. E, segundo José Manoel, “ela faz parte de uma equipe técnica e a decisão de reordenar a grade programática do Sesc é uma decisão política, da qual ela participou, mas da qual não tem responsabilidade, nem responde”, disse por e-mail, explicando porque seria responsabilidade dele e não de Galiana responder a entrevista.
Ano passado, em longa entrevista ao blog, Galiana Brasil comentou a redução da programação do festival. As palavras de Galiana, no entanto, parecem fazer muito mais sentido agora: “O Palco Giratório é um projeto (um dentre centenas) financiado integralmente pelo SESC, gerido pela instituição até quando ela entender que ele é importante, necessário. Minha opinião quanto a isso importa bem pouco, eu procuro sempre seguir as diretrizes da instituição, e estou subordinada a gerências e direções, em âmbito regional (jargão do SESC para nos referirmos à administração nos estados) e nacional”.
De acordo com José Manoel, “O Sesc tem muita atenção para com o Recife e continuará tendo, mas não será o Festival Palco Giratório a ação motriz desta atenção”.
José Manoel Sobrinho, gerente de Cultura do Sesc Pernambuco
ENTREVISTA // JOSÉ MANOEL SOBRINHO
Qual o motivo da não realização do festival Palco Giratório em maio?
O Sesc em Pernambuco é uma instituição com atuação estadual e desde 2012 vem intensificando a sua inserção no interior, implantando um modelo de trabalho sustentado no conceito de Corredor Cultural, tendo como objetivo aprofundar e ampliar a oferta de serviços em municípios, sem que obrigatoriamente haja uma Unidade Executiva do Sesc instalada. De forma responsável o Sesc foi construindo uma metodologia de trabalho que distribui o seu orçamento equilibradamente em seus diversos projetos. O Festival Palco Giratório, a despeito de seu significado e importância é uma ação que concentra recursos em um único mês e em uma única cidade. Este princípio não atende ao entendimento que o Sesc Pernambuco vem buscando operar na operacionalização e execução de sua Política de Cultura.
O Festival Palco Giratório é uma ação do Projeto Palco Giratório e não o contrário, porque neste existem as Aldeias, os Pensamentos Giratórios, os Cursos e Oficinas, que estão para além do Festival. Há uma diretriz de descentro, de desconcentração e de reorganização dos projetos que constituem o Programa Cultura do Sesc em Pernambuco.
Neste momento tão difícil para a cultura da cidade, lembrando que o Festival Recife do Teatro Nacional não foi realizado, porque a tomada dessa decisão? Aconteceu isso em alguma outra cidade do país? Ou é uma coisa isolada? Foi uma decisão do Sesc-PE ou do Sesc nacional?
Foi uma orientação do Sesc Pernambuco, proposta pela Gerência de Cultura e que a Direção do Sesc endossou, porque há uma sintonia entre o trabalho desenvolvido pelas linguagens. Este mesmo modelo gere as práticas de música, artes visuais, literatura, porque o Sesc não é uma instituição das artes cênicas, portanto constrói o seu módulo de trabalho pensando em atingir o público em sua dimensão simbólica com oferta artística multidisciplinar.
O Sesc Nacional não interfere na gestão dos estados, portanto é uma diretriz local, pensando no Estado de Pernambuco e não apenas no Recife e Região Metropolitana.
Ano passado, já percebemos que houve uma redução do orçamento do festival – com a não realização de ações paralelas, como o Cena Gastrô e Bacante. Qual era o orçamento do festival? Foi uma questão financeira?
Não foi uma questão de ordem financeira, foi o início de uma metodologia voltada para a desconcentração dos investimentos. O orçamento do Programa Cultura em 2014 (R$ 11.109.199,81) foi compatível com o de 2013 (R$ 10.669.150,27), isto para a execução de toda a grade programática do Regional. De fato houve uma redução no orçamento do Festival em relação a 2013, mas foi uma decisão estudada, para garantir o equilíbrio do Programa Cultura no Estado e não apenas em Recife.
O Sesc tem muita atenção para com o Recife e continuará tendo, mas não será o Festival Palco Giratório a ação motriz desta atenção.
Essa decisão de não realizar o festival em maio pode ser reversível?
No momento é irreversível, ao menos para os próximos anos.
As ações de descentralização do festival pelo estado foram realmente ampliadas? Como? Porque as Aldeias e as circulações pelo interior já existiam, não é mesmo?
Não há proposta de “ação de descentralização do Festival pelo estado”, o que há é o foco em uma atuação para além das cidades onde o Sesc atua, mas em todas as linguagens. Entre 2015 e 2018 a meta é consolidar as Mostras de Música e de Artes Cênicas espalhadas pelas diversas regiões, estrutura-las, intensificar as ações formativas, gradativamente, contando sempre com a participação da produção do estado. Também concentrar esforços em projetos para a qualificação de gestores culturais, participar de processos de construção de políticas para a cultura, manter regularmente a presença do Sesc com oferta de serviços culturais para as pessoas.
Particularmente em 2015 serão quatro Aldeias, quando em 2014 realizamos apenas a do Velho Chico, em Petrolina. Por sí só, este projeto, o das Aldeias já demonstra que o Sesc continua com seu investimento em Cultura de forma equilibrada e consequente, mas com critérios que demonstrem seu interesse em todo o território pernambucano.
O Nordeste é a região mais representativa na circulação nacional este ano. Em contrapartida, Pernambuco só tem o espetáculo O silêncio e o caos; e a homenagem ao Balé Popular. Noutros anos, tivemos mais representantes. Como você vê isso?
Não procede esta afirmativa, porque o que há é a confirmação da importância de Pernambuco no panorama do teatro e da dança no Brasil. Em 2015 teremos 2 importantes representantes do Estado, ambos da dança o que demonstra a qualidade e representatividade do trabalho aqui realizado. Mas para elucidar lembro que em 2014 tivemos igualmente 2 representantes do Estado ( Grupos Peleja e Magiluth), em 2013 tivemos 1 grupo, a Duas Companhias, em 2012, novamente 2, o Grupo Grial de Dança e a Trupe Ensaia Aqui e Acolá, em 2011 (Coletivo Lugar Comum e Mão Molenga Teatro de Bonecos), em 2010 a representação foi única com o Grupo Experimental e em 2009 com o Coletivo Lugar Comum, em 2008 e 2007 infelizmente não tivemos nenhum representante, em 2006 nosso recorde de 3 representações com a Remo Produções, Mão Molenga Teatro de Bonecos e Grupo de Artistas Independentes e ainda em 2005 tivemos o Terreiro Produções. Tomei apenas como referência os últimos 10 anos para mostrar que, ao contrário, há a consolidação da representação. Pernambuco ainda contou com espetáculos inseridos nas programações dos anos 2000, 2001, 2003 e 2004.
Aproveito para destacar que o Balé Popular do Recife está recebendo uma grande homenagem do Sesc no Brasil, indo a todas as regiões do país, a mesma homenagem que somente receberam Angel Viana em 2014 e Ilo Krugli e o seu Teatro Ventoforte em 2013. O Circuito Especial destaca a cada ano, desde 2013, um ícone, um expoente, uma referência. E é isso que o Balé Popular do Recife é, uma referência para o Brasil.