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Manifesto contra a repressão, de ontem e de hoje

Hilda Torres no espetáculo Soledad. Foto: Flávia Gomes

Hilda Torres no espetáculo Soledad – A terra é fogo sob nossos pés. Foto: Flávia Gomes

A personagem Soledad, criada pela atriz Hilda Torres, assume o amálgama de militância política e paixão amorosa. Firme e doce. Sedutora na prática do bem comum. A ditadura brasileira (1964-1985) confiscou a vida da jovem guerrilheira paraguaia Soledad Barrett Viedma (1945-1973) de forma covarde. Um relevante trabalho de resgate foi feito pela intérprete em parceria com a diretora argentina Malú Bazán e a própria filha da militante, Ñasaindy Barrett, para erguer o espetáculo Soledad – A terra é fogo sob nossos pés. A montagem estrou ano passado e agora faz uma curta temporada às 20h dos sábados e às 19h dos domingos, no Teatro Hermilo Borba Filho, até o dia 10 de abril.

As veias dilaceradas da ativista respingam em toda América Latina, mas foi nos arredores do Recife que ela sofreu o golpe final e fatal. O agente duplo da ditadura José Anselmo dos Santos, o Cabo Anselmo, seu “companheiro amoroso” de quem estava grávida, a delatou ao delegado Sérgio Paranhos Fleury, o terrível carrasco de presos políticos. Sol foi torturada e assassinada numa ação policial que exterminou mais cinco militantes da VPR: Pauline Philipe Reichstul, Eudaldo Gomes da Silva, Evaldo Luis Ferreira, Jarbas Pereira Marques e José Manoel da Silva. O episódio brutal ocorreu na Chácara São Bento, em 8 de janeiro de 1973, em Abreu e Lima, e ficou conhecido como Massacre de São Bento.

Soledad Barret fez parte da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR). A justiça social estava no seu sangue. Era neta do escritor, jornalista, intelectual e líder anarquista Rafael Barrett. Uma ação de neonazistas em Montevidéu selou sua escolha pela guerrilha. Ao se recusar a reproduzir a frase “viva Hitler!”, ela foi submetida à violência de ter a suástica nazista gravada em suas coxas pelos extremistas.

Para seu aprendizado e atuação na guerrilha, e/ou fugindo das perseguições, Soledad morou na Argentina, no Uruguai, em Cuba e no Brasil, sob a ditadura militar. Em Cuba se enamorou de Zé Maria, pai de sua filha Ñasaindy.

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Excelente atuação de Hilda Torres

Essa cena do real faz um resgate dessa mulher guerreira que era injustamente mencionada como a mulher do Cabo Anselmo. A atriz Hilda Torres e a diretora Malú Bazán construíram a dramaturgia a partir de poemas e textos de pessoas envolvidas na história de Soledad e do livro do jornalista Urariano Mota, Soledad em Recife, relato que resgata a passagem da paraguaia por Pernambucano.

O monólogo poético utiliza poemas, músicas, elementos sonoros, cadeira, livro e outros objetos, como uma boneca confeccionada por Maria de Lourdes Albuquerque, 94, uma das mulheres de fibra que encetou o movimento das mães em busca de seus filhos no período da ditadura. Nas laterais do palco estão esparramados papéis usados durante o processo de produção da peça.

A história de Soledad é contada da forma digna, com entrega total da atriz Hilda Torres. O tom da encenação é totalmente feminista, de empoderamento da mulher, e com caráter libertário, contra as repressões. Mas o peso dessa história de luta, que expõe muitas barbaridades cometidas contra essa mulher aguerrida, não cai no panfletário. As posições da encenação são claras em defesa da vida, pelo respeito à pessoa humana e pela liberdade em todos os níveis.

Empoderamento feminino

Empoderamento feminino

Com os seios desnudos, Hilda entra no palco traçando conexões com a feminilidade, maternidade, com o Planeta Terra. Há muitas camadas de metáforas. E segue outras composições. Nas dobras da saia, levava os recados de libertação como herança de família.

Seus movimentos se alteram entre a narração da intimidade amorosa com a família e amigos e a luta armada, que aprende em pé de igualdade com os homens.

O empenho da intérprete em catapultar a imagem de Soledad para um lugar mais alto passou pelo aprendizado de algumas palavras e expressões em guarani, já que a militante falava o idioma; chegou aos passos rápidos e fortes do cavalo-marinho, que traçam com beleza coreográfica as cenas de batalha.

Os fatos narrados ostentam um ‘status de verdade’, pelo compromisso dos criadores com a realidade de Soledad e dos revolucionários que comprometeram seu tempo e até perderam a vida nessas lutas. Esse teatro documentário, político (e não há outro sentido no teatro político que não seja libertador) clama pelos povos oprimidos do continente. Os elementos ficcionais na montagem completam sua sustentação poética.

É uma atuação de fôlego de Hilda Torres. A maior de sua carreira. Uma entrega total. Potente e bela. Por seus poros, por seus olhos, nos seus gestos, na gradação de sua voz, nas explosões emotivas da personagem pulsam o essencial de vida. Coragem para tornar a existência grande. É comovente quando ela clama pelos desaparecidos políticos e a plateia responde “presente”. A potencialidade dessa anexação do real faz o teatro vibrar. E mesmo o espectador mais anestesiado com o excesso de informação sai da passividade para pertencer e se revoltar contra as barbaridades.

O projeto conta com uma equipe técnica afinada, como a iluminação cúmplice de Eron Villar e direção musical de Lucas Notaro. Soledad – A terra é fogo sob nossos pés fala de um período terrível de perseguições, mas aponta também para os tempos que correm da política brasileira.

Mas não é um espetáculo para qualquer espectador. Para quem tem certeza que há hierarquização de humanos enquanto valor de pessoa, que os pobres não têm direitos a melhorar de vida, que não deve haver empoderamento das mulheres, talvez seja melhor não aparecer. Para os que tem incertezas sobre essas questões ainda há alguma chance. E para quem defende a liberdade, os direitos humanos, o respeito às diferenças é uma encenação para se recarregar.

Ficha Técnica

Direção, cenário e figurino: Malú Bazán
Dramaturgia e pesquisa cênica: Hilda Torres e Malú Bazán
Pesquisa histórica: Hilda Torres, Márcio Santos e Malú Bazán
Execução de cenário e figurino: Felipe Lopes e Maria José Lopes
Iluminação: Eron Villar
Operação de luz: Eron Villar e Gabriel Félix (Villa Lux)
Direção musical: Lucas Notaro
Operação de som e produção executiva: Márcio Santos
Consultoria do idioma guarani: Adrián Morínigo Villalba
Atriz, idealizadora e coordenadora do projeto: Hilda Torres

SERVIÇO

Soledad – A Terra é Fogo Sob Nossos Pés (Cria do Palco – Recife/PE)
Quando: Sábados, às 20h; e domingos, às 19h. Até o dia 10 de abril.
Onde: Teatro Hermilo Borba Filho, no Bairro do Recife
Quanto: R$ 30 e R$ 15

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Guerrilha e amor, uma mistura explosiva

Hilda Torres no espetáculo Soledad

Hilda Torres no espetáculo Soledad

janeiro-de-grandes-espetáculos-SSSSMuitos morreram pela liberdade. E cada vez que um personagem desses ganha os holofotes é uma justiça para a história. A  guerrilheira paraguaia Soledad Barrett Viedma (1945-1973) teve sua voz sufocada pela opressão das ditaduras por 42 anos. Até o ano passado, quando a atriz Hilda Torres, a diretora argentina Malú Bazán e a própria filha da militante, Ñasaindy Barrett, se juntaram para montar o espetáculo Soledad – A terra é fogo sob nossos pés.

O drama de “Sol” expõe as veias abertas da América Latina numa época de grande opressão política. Um trajeto de vida e poesia. Soledad foi mais uma vítima das barbaridades da ditadura militar do Brasil (1964-1985).

Ela morou na Argentina, no Uruguai, em Cuba e no Brasil, fugindo das repressões. Ao ser sequestrada por um bando de neonazistas em Montevidéu, ela adotou a guerrilha. Ao se recusar dizer a frase “viva Hitler!”, ela foi marcada nas coxas com a suástica nazista. Em Cuba, onde aprendeu a luta armada, conheceu Zé Maria, pai de sua filha Ñasaindy.

No Brasil se apaixonou por José Anselmo dos Santos, o Cabo Anselmo, companheiro que a entregaria à polícia, às garras do delegado Sérgio Fleury. O Massacre de São Bento matou Soledad grávida e outros cinco militantes na Chácara São Bento, em Abreu e Lima.

É um espetáculo emocionante.

SERVIÇO

Espetáculos de Hoje no Janeiro de Grandes Espetáculos

Soledad – A Terra é Fogo Sob Nossos Pés (Cria do Palco – Recife/PE)
Quando: Dia 18 de janeiro de 2016 (segunda), 20h
Onde: Teatro Hermilo Borba Filho
Quanto: R$ 20 e R$ 10

Luas de Há Muito Sóis (Papelão Produções e Fafe Cidade das Artes – Recife/Brasil/  Fafe/ Portugal)
Quando: Dias 18 e 19 de janeiro de 2016 (segunda e terça), 20h
Onde: Teatro Capiba (SESC Casa Amarela)
Quanto: R$ 20 e R$ 10

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