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Pelo resgate da dignidade esgarçada

Depois de cinco anos sem estrear espetáculo, retorna aos palcos com Ossos, de Marcelino Freire. Joanna Sultanum

Depois de cinco anos sem estrear espetáculo, Angu de Teatro retorna aos palcos com Ossos. Foto: Joanna Sultanum

A peça Ossos, do Coletivo Angu de Teatro, é a estreia mais aguardada do Recife deste ano; ou pelo menos deste primeiro semestre de 2016. Com texto de Marcelino Freire, adaptado pelo autor do romance Nossos Ossos (Record, 2013) para o dramático, a montagem reafirma a parceria entre o escriba e o grupo teatral, que começou em 2003 com a encenação de Angu de Sangue, passou por Rasif – Mar que arrebenta, e chega a Ossos. O espetáculo dirigido por Marcondes Lima inicia temporada neste sábado, dia 11 de junho, no Teatro Apolo e segue até 26 de junho, com sessões nas sextas, às 20h, nos sábados, às 18h e 21h, e nos domingos, às 19h.

Cada um carrega o que o constitui. Lembranças, fantasmas, decepções, alegrias e muitas pessoas – vivas ou mortas – que atravessaram o caminho. O cadáver do amante do dramaturgo Heleno de Gusmão está no centro da narrativa de Ossos. O protagonista precisa entregar os restos mortais do garoto aos familiares em Sertânia, no interior de Pernambuco. Em nome de uma dívida de sobrevivência e da dignidade esgarçada.

Os acontecimentos são expostos de modo não linear, embaralhados no tempo/espaço. Parte se desenvolve no submundo paulistano e outra se move na estrada que leva o escritor até o Sertão pernambucano de sua infância.

Com temática LGBT, peça mostra o lado humano e sentimental de personagens ainda estigmatizados

Com temática LGBT, peça mostra o lado humano e sentimental de personagens ainda estigmatizados

A peça dramatiza a subjetividade de Heleno de Gusmão, com estilhaços de memória, cenas de sonho e materialização de uma vida suprarreal. A atmosfera carregada de sombras, formas bizarras e distorções visuais, remete para o universo fronteiriço de sonho e pesadelo.

Nessa narrativa fragmentada, a peça dá saltos para a frente e para trás, explorando cortes secos, sobreposições e fusões de cenas, nas pegadas de um processo cinematográfico.

O clima sombrio é reforçado pela presença de um coro de urubus, permeado pela presença da morte; e subvertido pelo humor e o colorido da ação de alguns personagens.

No elenco estão os atores André Brasileiro, Marcondes Lima, Arilson Lopes, Ivo Barreto, Daniel Barros e Robério Lucado. A trilha sonora, assinada por Juliano Holanda, conta com mais de 20 canções. O autor Marcelino Freire é aguardado na estreia.

A montagem de Ossos é patrocinada pelo prêmio Myriam Muniz da FUNARTE – Ministério da Cultura – Governo Federal.

SERVIÇO
OSSOS
Estreia: 11 de junho, às 21h
Temporada: de 11 a 26 de junho – Sextas, às 20h; Sábados, às 18h e 21h; Domingos, às 19h
Onde: Teatro Apolo (Rua do Apolo, 121, Bairro do Recife)
Ingressos: R$20,00 inteira / R$10,00 meia-entrada
Informações: 81 3355-3321
Classificação indicativa: 16 anos

FICHA TÉCNICA
Texto: Marcelino Freire
Direção: Marcondes Lima
Direção de arte, cenários e figurinos: Marcondes Lima
Assistência de direção: Ceronha Pontes
Elenco: André Brasileiro, Arilson Lopes, Daniel Barros, Ivo Barreto, Marcondes Lima, Robério Lucado
Trilha sonora original – composição, arranjos e produção: Juliano Holanda
Criação de plano de luz: Jathyles Miranda
Preparação corporal: Arilson Lopes
Preparação de elenco: Ceronha Pontes, Arilson Lopes
Coreografia: Lilli Rocha e Paulo Henrique Ferreira
Coordenação de produção: Tadeu Gondim
Produção executiva: André Brasileiro, Fausto Paiva, Arquimedes Amaro, Gheuza Sena e Nínive Caldas
Designer gráfico: Dani Borel
Fotos divulgação: Joanna Sultanum
Visagismo: Jades Sales
Assessoria de imprensa: Rabixco Assessoria
Técnico de som Muzak – André Oliveira
Confecção de figurinos: Maria Lima
Confecção de cenário e elementos de cena: Flávio Santos, Jorge Batista de Oliveira.
Operador de som e luz: Fausto Paiva / Tadeu Gondim
Camareira: Irani Galdino

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De salto alto contra a intolerância

Tatto Medinni interpreta um travesti no espetáculo Jr. Foto: Divulgação

Tatto Medinni interpreta um travesti no espetáculo Jr. Foto: Divulgação

janeiro-de-grandes-espetáculos-SSSSHá quase dez anos, no coquetel de estreia do espetáculo Ópera, a cantora Elza Show defendia com seu vozeirão: “O mundo é gay!”. O entusiasmo combinava totalmente com o clima de lançamento da peça, uma adaptação de contos inéditos do pernambucano Newton Moreno, com direção de Marcondes Lima e produção do Coletivo Angu de Teatro. O ator Tatto Medinni integrava o elenco de Ópera.  Ele estreia o monólogo Jr nesta quarta-feira, às 19h, no Teatro Hermilo Borba Filho, com segunda sessão amanhã, no mesmo horário e local, dentro da programação do Janeiro de Grandes Espetáculos.

O homoerotismo, a queer culture ocupam o centro da cena. Na peça, a travesti Suzana Star está detida. Dessa prisão real e simbólica, ela conta sua história de vida desde o ventre da mãe. O texto de Marcelino Freire problematiza questões sobre identidade de gênero, diferenças, preconceito, fronteira.

O mundo continua povoado pela diversidade. Mas a intolerância e os fundamentalismos recrudesceram. O ódio e a perseguição pelo diferente atestam que não está fácil viver neste planeta de valores heterocentristas hipócritas. Suzana Star é testemunha disso.

O espetáculo foi erguido por uma campanha de financiamento coletivo, que driblou incompetências e má vontade que se traduz na pouca verba destinada à cultura.

SERVIÇO

Espetáculos de hoje no Janeiro de Grandes Espetáculos

Jr. (Operários de Teatro – OPTE – Recife/PE)
Quando: Dias 20 e 21 de janeiro de 2016 (quarta e quinta), 19h
Onde: Teatro Hermilo Borba Filho
Quanto: R$ 20 e R$ 10

Quarteto Encore (Produção: Rafaela Fonsêca – Recife/PE)* *Integrando o Circuito BNDES de Música – Do Erudito ao Popular
Quando: Dia 20 de janeiro de 2016 (quarta), 20h
Onde: Teatro de Santa Isabel
Quanto: gratuito

Bailaora (Cia. Karina Leiro – Recife/PE)
Quando: Dia 20 de janeiro de 2016 (quarta), 20h30
Onde: Teatro Luiz Mendonça (Parque Dona Lindu)
Quanto: R$ 20 e R$ 10

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No Janeiro // Todas do Angu

Coletivo Angu de Teatro apresenta repertório no Janeiro de Grandes Espetáculos 2014

Os quatro espetáculos do coletivo Angu de Teatro estão na programação do Janeiro de Grandes Espetáculos. De hoje até domingo é possível conferir as encenações Essa febre que não passa, Ópera, Rasif – Mar que arrebenta e Angu de sangue. Oportunidade de conhecer ou rever o repertório de um dos grupos mais atuantes de Pernambuco nos últimos dez anos.

“Essa febre que não passa” é um verso da música Via Láctea, da banda Legião Urbana, que a jornalista e escritora Luce Pereira tomou de empréstimo para dar título ao seu primeiro livro de ficção.

Com cinco contos de Essa febre que não passa, a montagem teatral mergulha na delicadeza do universo feminino na contemporaneidade, com humor, perspicácia, crítica e doses de realidade, a partir da história das atrizes envolvidas na peça. São elas: Ceronha Pontes, Hermila Guedes, Hilda Torres, Quitéria Kelly, Mayra Waquim, Nínive Caldas e Lilli Rocha (stand in). A direção é assinada por André Brasileiro e Marcondes Lima.

Serviço:
Essa Febre Que Não Passa (Recife/PE)
Quando: Hoje,
16 de janeiro, 21h
Onde: Teatro Apolo
Ingresso: R$ 20 e R$ 10
Indicação: a partir de 16 anos

Ceronha Pontes e Hermila Guedes em Essa febre que não passa. Foto: Ivana Moura

Ficha técnica
Texto: Luce Pereira.
Direção: André Brasileiro e Marcondes Lima.
Assistência de direção: Maria do Céu Cezar.
Direção de arte: Marcondes Lima.
Direção musical e trilha sonora original: Henrique Macedo
Coordenação de produção: Tadeu Gondim
Produção executiva: Dani Varjal, Ivo Barreto e Nínive Caldas
Iluminação: Luciana Raposo
Vídeos: Tuca Siqueira e Cabra Quente Filmes
Musicista: Josi Guimarães
Elenco: Ceronha Pontes, Hermila Guedes, Hilda Torres, Quitéria Kelly, Mayra Waquim, Nínive Caldas e Lilli Rocha (stand in)

Essa febre que não passa. Foto: Ivana Moura

Sobre Essa febre que não passa eu escrevi para o caderno Viver, do Diario de Pernambuco, publicado em 9 de maio de 2011:

Das feridas sociais de Angu de sangue e Rasif – mar que arrebenta, passando pela temática gay de Ópera, o grupo chega às dores pessoais à partir do olhar feminino da escritora Luce Pereira e das seis atrizes – Ceronha Pontes, Hermila Guedes, Hilda Torres, Márcia Cruz, Mayra Waquim e Nínive Caldas e da violoncelista Josi Guimarães. A beleza, a urgência, o ritmo, as tiradas engraçadas, o humor das situações mais incríveis dos contos de Luce Pereira já eram conhecidos de alguns de nós, desde 2006, quando o livro foi lançado. O desafio era dar corpo a essas personagens feitas das palavras da escritora. O resultado superou as expectativas. É tocante. E tem um pouco de suavidade e delicadeza, de ironia e corte seco, de graça e elegância, e de uma simplicidade arrebatadora.

Essas criaturas febris apresentam suas situações-limite, carentes ou transbordantes de afeto.

Essa febre que não passa tem uma comunicação fácil e contagiante, que vem do texto. Ela encontra a beleza no prosaico e insiste que é preciso prestar atenção nas pequenas coisas. Esse material textual foi respeitado e valorizado na peça dirigida por André Brasileiro e Marcondes Lima.

A montagem do coletivo Angu insiste em algumas características investigativas do coletivo, com o ator-narrador. Mas traz algumas variações.

A peça fala do fim de relacionamento entre duas mulheres; na adoração de uma figura por nomes bonitos com uma pontinha de crítica social; nas dívidas de afeto com uma velha tia; no acerto de contas entre duas irmãs e no desespero da dor da perda.

O cenário é formado por camadas de cortinas, que remetem a outras camadas. Isso cria um ambiente etéreo, ora revelando, ora escondendo.

A trilha sonora e direção musical são de Henrique Macedo que ajudam a expandir ou comprimir os tempos e dar as atmosferas dos contos.

O elenco é o grande trunfo dessa montagem. Ceronha Pontes e Hermila Guedes protagonizam o casal de Clóvis. Nesse quadro, a promessa de felicidade já desmoronou quando o bichano é convidado. Mayra Waquim faz a artista plástica que errou no nome desde o nascimento e prossegue nas suas escolhas erradas.

Marcia Cruz incorpora não apenas uma velha, mas toda a velhice do mundo. Hilda Torres faz a sobrinha que narra a história de Bernarda e de sua inabilidade com os afagos. Em Um tango com Frida Kahlo Ceronha Pontes volta à cena para se digladiar com Mayra Waquim, esta no papel de Sofia. E o conto que encerra o espetáculo, protagonizado por Hermila Guedes, atesta que uma dor de amor pode ser fatal. É um espetáculo para quem não tem medo das emoções.

Ópera tem texto de Newton Moreno

Sobre Ópera:

Uma das características do Angu de Teatro é levar ao palco textos da literatura contemporânea, por sinal de autores pernambucanos. A escritura de Ópera é de Newton Moreno e debruça-se sobre a temática homoerótica.

São quatro contos que questionam identidades com um humor cáustico, às vezes cruel, e as reações sociais perante posturas homoafetivas. É muito contundente para falar desses tempos que correm, nos quadros O Cão, O Troféu, Culpa e Ópera. A direção é de Marcondes Lima. No palco estão Arilson Lopes, Carlos Ferrera, Fábio Caio, Ivo Barreto, Tatto Medinni, Dirceu Siqueira e Ellen Roche.

SERVIÇO
Ópera, do Coletivo Angu de Teatro e Atos Produções Artísticas (Recife/PE)
Quando: Amanhã, 17 de janeiro (sexta), 21h
Onde: Teatro Apolo
Ingresso: R$ 20 e R$ 10
Indicação: a partir de 18 anos

Foto da estreia de Ópera, em 2007, com Tatto Medinni e Arilson Lopes

Ficha técnica
Texto: Newton Moreno
Encenação e direção de arte: Marcondes Lima
Direção musical e trilha sonora original: Henrique Macedo
Preparação corporal e assistência de direção: Vavá Schön-Paulino
Plano de Luz: Játhyles Miranda
Direção de produção: Tadeu Gondim
Produção executiva: Lilli Rocha e Nínive Caldas
Elenco: Arilson Lopes, Carlos Ferrera, Fábio Caio, Ivo Barreto, Tatto Medinni, Dirceu Siqueira e Ellen Roche

Rasif – Mar que arrebenta, sábado, no Teatro Hermilo Borba Filho

Sobre Rasif – Mar que arrebenta:

Marcelino Freire tem uma prosa lírica, mas não é afago, é porrada. Seus personagens passam por humilhações, mas um dia explodem ou se vingam. Eles estão nas bordas, seja lá onde fique isso. Suas palavras são punhais cortantes, lâminas afiadas que manifestam a revolta de figuras que correm contra um destino ruim.

Em estado de miséria existencial ou econômica, esses farrapos humanos lutam no dia-a-dia contra o que estamos cansados de saber. Além da arrogância do patrão (quando existe um) e as tramóias dos poderosos (qualquer mísero poder). E eles no anonimato.

Marcelino Freire coloca um lupa sobre esses seres cansados da crueldade da vida em Rasif– Mar que arrebenta. As histórias sao episódicas e o tratamento do autor é virulento numa resposta à altura da violência da sociedade.

SERVIÇO
Rasif – Mar Que Arrebenta / Coletivo Angu de Teatro e Atos Produções Artísticas (Recife/PE)
Quando: 18 de janeiro (sábado), 21h
Quanto: R$ 20 e R$ 10
Onde: Teatro Hermilo Borba Filho
Indicação: a partir de 14 anos

Ficha técnica
Texto: Marcelino Freire
Encenação e direção de arte: Marcondes Lima
Direção musical e trilha sonora original: Henrique Macedo
Preparação corporal: Vavá Schön-Paulino
Iluminação: Játhyles Miranda
Vídeos: Oscar Malta e Tuca Siqueira
Direção de produção: André Brasileiro
Produção executiva: Tadeu Gondim, Gheuza Sena, Ivo Barreto, Fábio Caio, Marcondes Lima e Maria Helena Carvalho
Músicos: Marcondes Lima, Tarcísio Resende, Luziano André e Eugênio Gomes
Elenco: André Brasileiro, Arilson Lopes, Fábio Caio, Ivo Barreto, Márcia Cruz, Vavá Schön-Paulino e Tatto Medinni (stand in)

Espetáculo Angu de sangue, que deu origem ao coletivo foto: Tuca Siqueira

Sobre Angu de sangue:

Não tem mocinho em cena na peça Angu de Sangue, primeira montagem do coletivo a partir do livro de Marcelino Freire. Em dez quadros o autor e os atores expõem o lado mais mais desumano de figuras que lutam para sobreviver, muitas vezes matando o sentimento do outro. São seres cruéis, egoístas ou vítimas de doenças sociais. Entre eles, uma mídia que explora a miséria e ganha a vida com a dor alheia.

SERVIÇO
Angu de Sangue / Coletivo Angu de Teatro e Atos Produções Artísticas (Recife/PE)
Quando: 19 de janeiro (domingo), 20h,
Quanto: R$ 20 e R$ 10
Onde: Teatro Apolo
Indicação: a partir de 16 anos

Ficha técnica
Texto: Marcelino Freire
Encenação e direção de arte: Marcondes Lima
Direção musical e trilha sonora original: Henrique Macedo
Preparação corporal: Peter Dietz
Plano de luz: Játhyles Miranda
Criação e edição de vídeos: Oscar Malta e Tuca Siqueira
Direção de produção: André Brasileiro
Produção executiva: Tadeu Gondim. Elenco: Arilson Lopes, Fábio Caio, Ivo Barreto, Gheuza Sena e Hermila Guedes

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Hoje a festa é do Angu

Espetáculo Angu de sangue, que deu origem ao coletivo  foto: Tuca-Siqueira

Espetáculo Angu de sangue, que deu origem ao coletivo foto: Tuca Siqueira

Dez anos de teatro merece uma grande festa. E se esse feito acontece no Nordeste do Brasil, mais um motivo. E os meninos do Coletivo Angu de Teatro são festeiros e realizam hoje, a partir das 22h uma big party imperdível, no Bar Vapor 48 localizado na Praça das 5 Pontas, 145. Promete não ter hora para acabar. E como amanhã é feriado para a maioria dos mortais, vamos nos jogar.

O DJ Pepe Jordão, velho parceiro nas baladas do coletivo, anima o encontro e vai contar com o reforço de Dick Dickinson e Claude Marmotágge, dois DJs performáticos, de gogo boys e gogo girls e muitas surpresas. O ingresso tem preço único de R$ 30.

Desde Angu de Sangue, que tem texto do escritor pernambucano Marcelino Freire, espetáculo que por sinal está em cartaz no Teatro Teatro Eva Herz, do Shopping Riomar (sextas e sábados, às 20h e domingos, às 19h), a trupe criou uma identidade que mistura denúncia social, inquietações filosóficas, pulsar contemporâneo, e muito humor para falar da realidade a partir do Recife. Depois de Angu de Sangue vieram Rasif – Mar que arrebenta, Ópera e Essa febre que não passa.

O coletivo é uma das referências teatrais em Pernambuco. E foi criado em 2003, pelos atores André Brasileiro, Fábio Caio, Gheuza Sena, Hermila Guedes e Ivo Barreto, e o diretor Marcondes Lima, a partir da montagem do Angu de Sangue.

 

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Serviço:

ANGU, A FESTA
Quando: Nesta sexta-feira (11/10), a partir das 22h até o sol raiar
Onde: Bar Vapor 48, localizado na Praça das 5 Pontas, 145
Quanto: R$ 30

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Essa febre contagia

Ceronha Pontes e Hermila Guedes. Fotos: Ivana Moura

À primeira vista, o que liga os quadros de Essa febre que não passa são as tensões de mulheres em acertos de contas com o passado, com o presente e com o futuro. Criaturas em situações-limite, transbordando de afetos.

É a quarta montagem do Coletivo Angu de Teatro, depois de Angu de sangue, texto de Marcelino Freire; Ópera, texto de Newton Moreno e Rasif – Mar que arrebenta, também texto de Freire. Desta vez cena é ocupada só por mulheres.

As atrizes Ceronha Pontes, Hermila Guedes, Hilda Torres, Márcia Cruz, Mayra Waquim e Nínive Caldas se desdobram em criaturas inventadas pela jornalista e escritora Luce Pereira.

O resultado é tocante, ora suave, ora irônico, ora cortante. Sempre belo.

Dos 17 contos que compõem o livro homônimo, o Coletivo escolheu cinco para encenar: Clóvis, Nomes, Talvez já fosse tarde, Um tango com Frida Kahlo e Dora descompassada. Entre eles como uma liga orgânica, as passagens com breves depoimentos criados pelas próprias atrizes, sobre suas vidas pessoais: a relação com a irmã, com a velhice, com o mundo.

Essa febre que não passa tem uma comunicação fácil e contagiante. Tira o prosaico do cotidiano e nos fala de coisas muito caras que podem atingir a qualquer um, como dores de amores e separações. Os recalques voltam furiosos ou apaziguados com o tempo, mas não com o esquecimento. As feridas reabertas fazem tremer o corpo visível e o invisível também.

A montagem do Angu insiste em algumas características investigativas do coletivo, com o ator-narrador. Mas traz algumas variações, tem uma tonalidade mais feminina, às vezes mais frágil noutras de uma fortaleza insondável.

Os contos de Luce Pereira já expõem os nervos das personagens. E cativam na sua aparente simplicidade para falar do fim de relacionamento entre duas mulheres (e que poderiam ser quaisquer dois), com sua curva que vai da empolgação pelo desejo do duradouro no início à desatenção com as pequenas coisas, tempos depois. Clóvis como promessa de felicidade salienta na chegada sinais de desgaste da relação.

Noutro, a personagem se debate contra seu próprio nome, como se fosse um ferro de marcar gado, condenatório. Nomes para ela definem tudo. E essa figura com manias de grandeza adora os bonitos. Com criativas frases de efeito, um humor irônico e uma pontinha de crítica social, a autora vai alinhavando a vida dos vizinhos, do prédio, do bairro.

Mayra Waquim na cena Nomes

Dívidas de afeto com uma tia pouco afeita a carinhos são contabilizadas no conto Talvez já fosse tarde. É o mais duro, mais triste, mais cortante dos textos escolhidos para a montagem. E vai crescendo numa onda em que autocondenação é confessada pelo bem que deixamos de fazer aos nossos queridos. Como a negação de um beijo, abraço ou coisa parecida.

Marcia Cruz e Hilda Torres no quadro Talvez já fosse tarde

Um café com a irmã e a explosão de memórias, do desejo de crescer que não passou quando acabou a adolescência. As reminiscências compartilhadas com a mana que nunca a entendeu perfeitamente. E entre incompreensões de uma e as revelações da outra a vontade de partir. “Queria ter a alma de Frida Khalo, expulsar cores, escancarar porões, viver todas as minhas heresias sem culpa, não fazer maldades com rapazes e misses”. Elas riem por um momento cúmplices com histórias de crueldade. A ironia fina se instala.

Ceronha Pontes e Mayra Waquim em Um tango com Frida Kahlo

No conto que fecha o espetáculo, Dora descompassada, o desespero, a dor, o desânimo, são maiores que a vontade de prosseguir o caminho sozinha. Quando descobriu que eles -enquanto casal – já não se pertenciam, ela faz um balanço da relação e não suporta a perspectiva de futuro. Desistir de tudo no fim de ano traz uma carga dramática para abrir as feridas não cicatrizadas do público.

Enfim, um punhado de contos que percorrem estados de espírito. Pode predominar uma melancolia, mas todos inquietam e fazem pulsar vida em suas múltiplas possibilidades. De que é possível seguir em frente, de superação, de renúncia.

Esse material textual foi respeitado e valorizado na cena dirigida por André Brasileiro e Marcondes Lima. Os outros três espetáculos do grupo, dirigidos por Marcondes, são mais masculinos. Essa febre tem um tônus mais feminino.

Além das atrizes Ceronha Pontes, Hermila Guedes, Hilda Torres, Márcia Cruz, Mayra Waquim e Nínive Caldas, está em cena a violoncelista Josi Guimarães, que integra a cena e faz de seu instrumento, seu amado.

Cortinas compõem o cenário, representando camadas, ora revelando, ora escondendo, ora abrindo em fendas para essas mulheres contarem suas histórias.

Feito ninfas elas aparecem despindo-se ou recompondo-se para anunciar as personagens que estão por vir.

Ceronha Pontes, Hermila Guedes protagonizam o casal de Clóvis, o gato. Duas fortes atrizes explorando a cumplicidade de amor, seus recônditos insondáveis, num arco que vai da alegria, da euforia do encontro ao à tristeza da separação. Feito um bailado esse percurso é desenhado com beleza, num jogo lúdico de amorosidades que vão se diluindo. O treinamento no chamado método Viewpoints, ministrado pela paulista Amanda Lira como certeza deu sustentação para o trabalho físico.

Quadro Clovis questiona como manter acesa a chama da paixão

Nesse quadro, a promessa de felicidade já desmoronou quando o bichano é convidado a entrar. A representação do gato é bem resolvida. Hilda Torres faz o primeiro gato, o do pesadelo. E Nínive Caldas faz Clóvis lindamente, dengoso, esperto, cúmplice, mas acima de tudo felino.

Mayra Waquim faz a artista plástica que errou no nome desde o nascimento e prossegue nas suas escolhas erradas e na inveja por nomes bonitos. Na frente da televisão fazendo ginástica, ou pintando seus quadros que não vendem mais nem na feirinha, ela desfia suas mágoas, pela imensa falta de sorte desde o batismo. E sua ojeriza por coisa de gente pobre, ela mesma instalada no prédio decadente. Ela mostra domínio dessa personagem com sutilezas de detalhes. Como fazem todas as atrizes em algum momento do espetáculo.

Mayra Waquim no papel da artista plástica

Marcia Cruz incorpora não apenas uma velha, mas toda a velhice do mundo, de quem foi perdendo tudo e agora vive agregada na família da irmã. Hilda Torres faz a sobrinha que narra a história de Bernarda e de sua inabilidade com os afagos. Ela só consegue traduzir os gestos amorosos nas lembranças de datas e em qualquer mimo para os sobrinhos e sobrinhos-netos e quem mais vier. Talvez já fosse tarde dá um nó na garganta em sua poesia delicada para expor caminhos de negações, de economias de afeto, de interdições de amor.

Márcia Cruz, como Bernarda, ao fundo, e Hilda Torres

Em Um tango com Frida Kahlo Ceronha Pontes volta à cena para se digladiar com Mayra Waquim, esta no papel de Sofia. “Mas como é que pode, dois pares de olhos nascidos do mesmo pai e da mesma mãe, olhar na mesma direção e ver coisas tão diferentes?”, pergunta a atriz-narradora. Nas reminiscências, quase uma vida inteira, entre crueldades com rapazes e misses e a incompreensão da irmã.

O encontro pulsa de vida, transbordante desde o primeiro cigarro aos 14 anos, do conselho do professor Otaviano Cruz para que partisse quando a asa botasse a última pena. A narradora fala. Sofia ouve sem dizer palavras. O tom muda de acordo com as lembranças. E elas dançam belamente um tango.

Acerto de contas entre irmãs

Uma dor de amor pode ser fatal. Dora descompassada anuncia isso tristemente. Hermila Guedes faz essa mulher desesperada que ainda brinca de aparências de fortaleza e dignidade. O homem que se foi é representado por um par de sapatos. As outras atrizes compõem a cena. Uma banheira branca é instalada no meio do palco e define um quadro belíssimo de Dora na banheira tentando afogar as dores.

Hermila Guedes, em primeiro plano, interpreta Dora descompassada

A direção foi muito feliz ao criar pequenos monólogos de passagem com depoimentos das atrizes sobre algo que tenha a ver com um dos contos. A montagem também forjou uma ligação entre personagens, mudando nomes, e fazendo referências a outras histórias.

A trilha sonora e direção musical são de Henrique Macedo que ajudar a expandir ou comprimir os tempos e dar as atmosferas dos contos.

Como nos espetáculos anteriores, as projeções são grandes aliadas da montagem, estabelecendo fortes ligações com o cinema e a memória. Essa memória é salientada por fotos “reais” das atrizes e de outras pessoas da equipe de momentos importantes de suas vidas. Esse trabalho está associado a luz que salienta as camadas dessas histórias e dessas mulheres.
Os figurinos trazem uma tonalidade pastel que às vezes incomoda nesse apagamento que dá as personagens.

No fundo Essa febre que não passa é um espetáculo sobre o amor, o amor idealizado que não tem correspondência na vida e precisa da morte, desse perigoso, frágil e obscuro sentimento que nos move ou imobiliza.

A encenação é toda feita de cuidados e detalhes que o espectador vai descobrindo aos poucos. E encantando-se cada vez mais.

Parabéns a todos os envolvidos com essa febre. Muito boa a estreia na direção de André Brasileiro, com seu olhar que capta as belezas e num transbordamento ou numa repetição desesperadora como faz Dora ao ouvir ad infinitum My way como Frank Sinatra.

O elenco afinado, talentoso e competente fertiliza a cena com emoção.

Espetáculo fica em cartaz aos sábados e domingos


Serviço:
Essa febre que não passa, do Coletivo Angu de Teatro
Quando: temporada aos sábados, às 21h e domingos, às 20h
Onde: Teatro Hermilo Borba Filho (Rua do Apolo, 121, Bairro do Recife)
Ingressos: R$ 20 e R$ 10 (meia)

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