Quando perguntam se ele é humorista, Tiago Gondim responde que é ator. Que adora fazer comédia, é verdade. Mas quem diria que um dos sonhos desse cara, integrante do grupo Os embromation, era participar da Paixão de Cristo de Nova Jerusalém? Pois é. E conseguiu: está lá fazendo o apóstolo João não só por talento ou merecimento, mas porque realmente correu atrás do papel.
“Sempre fui religioso, fui coroinha. E algumas coisas loucas acontecem, né? Em 2010 vim aqui com meu irmão e disse a ele que um dia estaria no espetáculo. Carlos Reis (um dos diretores, ao lado de Lúcio Lombardi) até foi ver A morte do artista popular (espetáculo com texto de Luís Reis e direção de Antonio Edson Cadengue), peça que eu fiz em 2010, e lá conheceu Roberto Brandão, que fez o papel ano passado”, conta.
Ainda não era daquela vez – mas como o mundo gira, Gondim fez uns trabalhos no Shopping RioMar e conheceu um maquiador que conseguiu um teste. “Fiz o teste numa quarta e na sexta recebi a resposta. Depois disso vi muita coisa, filmes, sentei com os meus pais, que sabem muito da Bíblia, e li o evangelho de João”.
Tiago está no espetáculo de Nova Jerusalém no momento em que acompanhamos uma volta dos atores pernambucanos aos papeis principais – Jesus é interpretado por José Barbosa desde o ano passado; e Maria, encenada por Luciana Lyra. “Não dá para dizer que é um movimento definitivo, porque os interesses comerciais existem e o elenco muda muito, mas é uma sinalização importante e o público respondeu muito bem”, explica o ator e assistente de direção José Ramos.
“Digo que faço um percurso de conversão no espetáculo. Começo com o demônio que faz a tentação de Cristo, e aí vem o templário, que está na prisão de Cristo, o cirineu que ajuda Jesus a carregar a cruz e ainda o servo de Arimateia, que tira Jesus da cruz e leva para o túmulo”, conta José Ramos, há 14 anos assistente de direção, responsável principalmente pelo time de figuração. “O ator no teatro é fundamental e o papel da figuração é servir ao teatro, mas em grupo. O importante ali não é ser indivíduo, mas multidão”, complementa.
Se todos os anos há algumas mudanças, em 2013 a mais gritante é o figurino: estão sombrios, escuros. E pesados também, conta o ator Ricardo Mourão, que interpreta Caifás. “A gente ainda está se adaptando, limitou um pouco a movimentação. Você carrega a roupa junto com você. Mas é uma questão de adaptação mesmo. Digo que 2013 é a versão mais atualizada do Caifás”, brinca.
Jesus e Maria
José Barbosa gosta de dizer que o espetáculo da Paixão de Cristo de Nova Jerusalém é um veículo de evangelização. O pernambucano de Limoeiro tem a responsabilidade de interpretar Jesus pelo segundo ano. “Boa parte do ano é dedicada mesmo à Paixão de Cristo. E isso limita um pouco até outros trabalhos, trabalhos publicitários, por exemplo. A primeira pergunta é se eu posso cortar o cabelo, tirar a barba! Mas ainda faço muita coisa de publicidade sim, inclusive fora de Pernambuco, outros trabalhos como ator e também sou ilustrador, designer gráfico”, conta Zé.
O ator construiu um personagem doce, mas extremamente forte, que com a sua delicadeza e discurso realmente emociona o público. E, neste segundo ano, ele conseguiu aprimorar ainda mais o seu trabalho de corpo, a expressão. Talvez isso tenha sido facilitado pelo feliz encontro com a atriz Luciana Lyra, pernambucana radicada em São Paulo há muitos anos, integrante do elenco dos Os Fofos Encenam, dramaturga, diretora, mestra e doutora em Artes Cênicas, pós-doutoranda em Antropologia pela Universidade de São Paulo (USP).
“Foi um encontro muito feliz com José Barbosa em cena. Ele é muito talentoso. E há muito tempo estudo o feminino. Então é a coroação de um trabalho, poder voltar a Nova Jerusalém fazendo Maria”, explica Luciana, que fez a concepção de uma Maria embuída do trágico. Entre 2001 e 2004 Luciana esteve no espetáculo fazendo outros papeis, como o de cortesã.
No elenco deste ano estão ainda Marcos Pasquim, como Herodes, Carlos Casagrande como Pilatos, e Carol Castro interpretando Madalena. Carol, aliás, surpreende com a sua atuação. Está muito bem em cena. Conseguiu medir os gestos, as expressões, não está caricata, mas também não é engolida pela superprodução.
Paixão sem Diva
Ano passado, Diva Pacheco, atriz que por tantos anos interpretou Maria, idealizadora de Nova Jerusalém ao lado do marido Plínio Pacheco, estava com a saúde debilitada. Ainda assim, estava nos bastidores e sua presença era celebrada pelos atores. Ano passado Diva faleceu e o seu corpo foi, inclusive, enterrado no jardim da Pousada da Paixão. Este ano, além de Diva, algumas outras presença fazem falta, como Xuruca Pacheco, filha de Plínio e Diva, que era responsável pelo figurino da encenação.
Outro filho do casal – Robson Pacheco – tomou para si a responsabilidade de levar Nova Jerusalém a trilhar os próximos passos. “Temos que pensar, por exemplo, em aumentar a temporada. Mas ainda não foi possível”. Foi Robson quem organizou o relançamento do livro Réu, réu, se desta eu escapei, já sei que vou pro céu, de Diva Pacheco, escrito em 1973. “Tiramos algumas coisas que ela falava muito da família e deixamos mais a parte em que ela fala sobre a construção daqui mesmo, as histórias”, explica. O livro será relançado hoje, depois da apresentação do espetáculo.
Paixão de Cristo de Nova Jerusalém
Quando: hoje e amanhã, às 18h
Quanto: R$ 90 (sexta) e R$ 70 (sábado)
Informações: (81) 3732-1129 / 1180