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Bote a mão na consciência desde criança
Crítica de “O Estado do Mundo…”
7ª edição MIRADA

O ator Edi Gaspar manipula pequenos objetos com projeção na tela. Foto: Divulgação

O Estado do Mundo (Quando Acordas), uma produção do grupo português Formiga Atômica, flerta com  a tradição do teatro engajado, utilizando a arte como meio de conscientização social. Focada principalmente no público infantojuvenil, a encenação aborda a urgente crise climática, mostrando-se ousada, oportuna e necessária no contexto atual. A obra dialoga em algum grau com o movimento projetado por Greta Thunberg, reconhecendo o poder dos jovens na luta contra as mudanças climáticas.

O espetáculo propõe uma análise sobre a situação do mundo em seus diversos aspectos: natural, político, geográfico, social, histórico, econômico e humano. O ator Edi Gaspar desenvolve um monólogo progressivamente envolvente, situado em uma esfera gigante que representa um meteorito ou um planeta, concebida pelo cenógrafo Eric da Costa. Ao lado, uma tela de projeção circular permite ao público visualizar em detalhes – através de uma câmera operada por Edi – todas as miniaturas que ilustram grandes catástrofes ambientais: o desmatamento da Amazônia, o mar de plástico na Malásia, a poluição atmosférica na China, entre outras. 

O texto de Inês Barahona e Miguel Fragata mescla o cotidiano com o fantástico. A jornada de Edi, o protagonista de 8 anos, serve como dispositivo narrativo para abordar conceitos complexos de forma acessível.

O Estado do Mundo (Quando Acordas) explora a responsabilidade ambiental e o impacto global dede ações cotidianas. O espetáculo joga com a relação entre pequena e grande escala, entre o individual e o coletivo, lembrando do papel de objetos comuns em potenciais catástrofes naturais. A encenação investiga questões cruciais, como a extensão da influência de itens do dia a dia em desastres ambientais de larga escala e como nossas ações locais repercutem em regiões distantes do planeta. 

O T-Rex surge como símbolo de resistência, convocando as crianças para uma guerrilha simbólica. O meteorito, com aberturas articuladas, revela diferentes geografias protagonizadas por outras crianças ao redor do mundo.

A peça colocar em cena relações de causa-efeito entre gestos aparentemente insignificantes e suas amplas consequências. Foto: Divulgação

Embora a peça apresente uma abordagem criativa e eficaz para simplificar questões socioambientais complexas, é importante reconhecer que esta simplificação pode resultar em uma visão excessivamente otimista da realidade. A ideia de responsabilidade compartilhada entre indivíduos, empresas e Estados merece um escrutínio mais aprofundado, considerando as intricâncias do sistema capitalista global e os interesses econômicos enraizados. Essa perspectiva subestima o poder de grupos de interesse, lobbies corporativos e dinâmicas geopolíticas que frequentemente se sobrepõem aos desejos da população em geral.

Mesmo que Brasil e Portugal compartilhem a mesma língua oficial, as variações linguísticas entre o português brasileiro e o português europeu podem ser substanciais. Essas diferenças não se limitam ao vocabulário, mas incluem pronúncia, entonação, ritmo e até construções gramaticais. Isso pode resultar em barreiras de compreensão, especialmente em contextos onde a clareza e a imediaticidade da comunicação são cruciais, como no teatro.

Isso aconteceu apresentação do espetáculo do Grupo Formiga Atômica. A quantidade de texto, a velocidade da fala do ator e seus acentos lusitanos criaram dificuldades de entendimento para as plateias brasileiras. Qual seria a solução para uma situação dessas? Utilizar legendas projetadas em português brasileiro durante a apresentação? Não tenho respostas, mas perguntas. O que aconteceu foi uma dispersão do público infantil nos momentos mais textuais.

Montagem do grupo português Formiga Atômica. Foto: Divulgação

As ações e, principalmente, as execuções dos jogos com as miniaturas filmadas mostrando as catástrofes magnetizaram a plateia. A incorporação de projeções de vídeo e filmagem ao vivo, procedimento utilizado em algumas encenações contemporâneas, enriquece visualmente a montagem e ressalta a velocidade digital em que vivemos. Esse recurso reflete um mundo onde eventos globais são transmitidos em tempo real, funcionando de maneira eficaz no contexto desta montagem.

O Estado do Mundo (Quando Acordas) demonstra como o teatro infantil pode abordar temas complexos de forma acessível e envolvente. Apesar dos desafios linguísticos e de alguma simplificação, a peça consegue plantar sementes importantes para a conscientização ambiental, estimulando o pensamento crítico e o engajamento do público infantojuvenil.

 

FICHA TÉCNICA
Encenação: Miguel Fragata
Texto: Inês Barahona e Miguel Fragata
Interpretação: Edi Gaspar
Cenografia: Eric da Costa
Figurinos: José António Tenente
Música original: Fernando Mota
Desenho de luz: José Álvaro Correia
Vídeo: João Gambino
Adereços: Eric da Costa, José Pedro Sousa, Mariana Fonseca e Rita Vieira (design gráfico)
Maker: Guilherme Martins
Construção de cenografia: Gate7
Direção técnica: Renato Marinho
Consultoria: Henrique Frazão
Produção executiva: Luna Rebelo e Ana Lobato
Produção: Formiga Atómica
Produção no Brasil: Sendero Cultural | Adryela Rodrigues
Assistente de produção no Brasil: Robson Emílio
Assessoria jurídica no Brasil: Carnide, Rodrigues e Souza Sociedade de Advogados
Coprodução: LU.CA – Teatro Luís de Camões, Comédias do Minho, Materiais Diversos e Théâtre de la Ville  

A Formiga Atómica é uma estrutura apoiada pelo Ministério da Cultura | Direção-Geral das Artes  

www.formiga-atomica.com | @formiga.atomica.ac

 

A jornalista Ivana Moura viaja a convite do Sesc São Paulo

 

O Satisfeita, Yolanda? faz parte do projeto arquipélago de fomento à crítica,  apoiado pela produtora Corpo Rastreado, junto às seguintes casas : CENA ABERTA, Guia OFF, Farofa Crítica, Horizonte da Cena, Ruína Acesa e Tudo menos uma crítica

 

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