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Estreia de Mulheres em preto e branco no Recife

Duas mulheres em preto branco estreia hoje no Recife. Fotos: Ivana Moura

Duas Mulheres em preto e branco, a transposição para o palco do conto de Ronaldo Correia de Brito, que consta no livro Retratos Imorais, estreou este mês em Porto Alegre, dentro do Porto Alegre em Cena – Festival Internacional de Artes Cênicas. (Confira aqui a matéria que escrevemos durante o festival). Muito mais do que por uma das atrizes ser gaúcha, ter estreado na capital do Rio Grande do Sul evidencia uma parceria com o próprio festival e com Luciano Alabarse, diretor do POA em Cena (que alardeou aos quatro ventos que adorou o espetáculo). A montagem também mostra que é possível estabelecer uma rede entre criadores. A bela direção é do carioca Moacir Chaves, que se estende à iluminação de Aurélio de Simoni. A cenografia de Fernando Mello da Costa investe numa larga cama desequilibrada, como símbolo de amor e traição.

Diferente das montagens do Coletivo Angu de Teatro, em que os contos se unem pela convergência temática, a encenação de Duas mulheres em preto e branco tem uma narrativa de uma única história, mesmo que isso também se dê com idas e vindas ao passado e ao pensamento das personagens. O texto de Ronaldo Correia de Brito não seria assim cronológico e de fácil digestão. As mulheres refletem sobre o sentido do existir.

A peça Duas mulheres em preto e branco tem uma cena potente. Pela narrativa de Ronaldo, pela direção de Moacir Chaves, que marca bem, explora o máximo o potencial das atrizes e cria um encadeamento entre narração e dramatização, tem um olhar generoso quanto às fraquezas humanas. A sonoplastia de Tomás Brandão e Miguel Mendes pontua os climas e dá sustentação para as subversões de tensões e intenções propostas pelo diretor.

Atrizes travam duelo verbal e psicológico no espetáculo

Quanto às atrizes, elas têm presença cênica. E se entregaram a papeis difíceis. O repertório gestual pode crescer. Por ser a figura “humilhada e ofendida”, a personagem de Paula de Renor é quem parte para o ataque. Com palavras, gestos e intenções. Talvez necessitasse de mais modulações nas falas, de jogar mais com as tonalidades diferentes, de brincar mais com as possibilidades sonoras produzidas pelo corpo. Se fosse possível comparar a atuação de Paula de Renor em Duas Mulheres em preto e branco, com sua performance em Carícias, poderia dizer que houve um crescimento como atriz. Mas ela tem condições de fazer seu personagem crescer ainda mais no palco.

Já a personagem de Sandra fala menos e não muda tanto de sentimentos quanto a “amiga/rival”; tira proveito de seus instrumentos vocais e corporais para compor uma figura mais cínica, mais pragmática. As duas juntas sabem tirar proveito das muitas oportunidades de humor do texto.

O espetáculo estreia hoje, às 21h, no Teatro Apolo. E vale ir ao teatro.

Serviço
Duas Mulheres em Preto e Branco
Quando: De sábado (29) a 21 de outubro. Sexta a domingo, às 20h.
Onde: Teatro Apolo – Rua do Apolo, 121 – Bairro do Recife, Centro do Recife
Quanto: R$ 20 (inteira) e R$ 10 (meia)
Informações: (81) 3355.3320

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Entrevista “coletiva” – Daquilo que move o mundo

Daquilo que move o mundo. Fotos: Ivana Moura

Como estou fora do Recife, ainda não vi Daquilo que move o mundo. Mas há muitos meses, nas conversas no Central, nos encontros nos teatros, sabia da montagem e do que ela estava “causando” nos envolvidos. Com direção de Tiche Vianna, uma das fundadoras do Barracão Teatro, a peça traz no elenco três jovens criadores: Kleber Lourenço, Jorge de Paula e Tay Lopez. Para saber um pouquinho mais da peça e, principalmente, do pensamento deles, resolvi fazer uma entrevista “coletiva”. Os atores mesmos se entrevistaram e fizeram perguntas para a diretora. Saíram considerações importantes sobre o fazer teatral, sobre o que os move, sobre crises e amizade. Obrigada, meninos!

ENTREVISTA // KLEBER LOURENÇO, JORGE DE PAULA, TAY LOPEZ

Jorge: Por que valeu a pena mover-se tanto para realizar o Daquilo que move o mundo?
Kleber: Valeu a pena porque sabia que nesse processo aprenderia demais! Valeu a pena por que queria voltar a trabalhar de forma coletivizada, por acreditar no trabalho dos criadores envolvidos e por querer experimentar outras linguagens artísticas. Muito pela vontade de crescer, me desafiar e pelo amor ao teatro.

Kleber: Como era o Jorge de 1998, entrando na Universidade Federal, e como você se vê hoje, em relação ao teatro?
Jorge: Bem, quando iniciei meu Curso de Artes Cênicas tinha 17 anos e nenhuma bagagem em Teatro. Ser ator nunca havia sido cogitado por mim em minhas peregrinações adolescentes na escolha do meu “futuro profissional”. Foi só no 3º ano do Ensino Médio, depois de ter vivenciado no colégio ações que envolviam teatro e dança, que o interesse começou. Deixei de ser cirurgião plástico para ser ator. Entrei na Universidade e fui lançado ao abismo. Sem rede de segurança. O “novo” me assustou muito. Virei pedra. Passei algum tempo trancafiado em mim. Convivia de forma mais espontânea com poucas pessoas. A maioria de fora da Universidade. Entretanto, foi a convivência com pessoas maravilhosas da minha turma de Artes Cênicas – companheiros de vida e de cena até hoje – que aos poucos venci todos os receios, as vaidades, e fui, de fato, sentindo-me mais confortável com a minha escolha profissional. Hoje, depois de muitos anos dedicados a dobradinha arte-educador/ator, reconheço-me como ator e estou vivenciando dedicação exclusiva a isso. Todos os meus receios encontraram lugar. E aqueles que não encontraram pouso certo, caminham menos ansiosos. Afinal, fazer teatro no Brasil é um ato de resistência. Quando muitas coisas gritam para você “não faça”, eu insisto. Com satisfação.

Espetáculo está em cartaz no Espaço Fiandeiros

Jorge: Por estar já há algum tempo morando em São Paulo, como você percebe o teatro pernambucano?
Tay: De fato, faz aproximadamente 14 anos que resido em São Paulo, porém, minha percepção com relação ao teatro que se faz em Pernambuco (posso falar melhor de Recife), é um tanto quanto interna, pois apesar de morar longe, sempre acompanho as notícias pelos veículos de comunicação que tenho acesso e também por estar na cidade no momento em que acontece o Janeiro de Grandes Espetáculos, um apanhado da produção anual. Percebo que, hoje em dia, o teatro de Grupo tem sido uma constante na cidade. Haja vista as várias sedes que foram abertas nos últimos anos e o pensamento coletivo como um todo. Sobretudo os atores que saíram da universidade e se reuniram com outros, comungando de um pensamento artístico, compartilhado e conceitual para a cena Teatral. Percebo uma transição das “produções” para os “coletivos”, onde não mais há artistas contratados, subalternos em prol de um espetáculo e sim uma junção de pessoas que desejam falar de algo que os atinja, que os comova. Claro que auxiliados pelos editais que apareceram na cidade nos últimos 10 anos. Em São Paulo, acompanhei de perto a formatação da Lei do fomento, desde as reuniões do “arte contra a barbárie” até a implementação da Lei. Sabemos que São Paulo tem uma população 8 vezes maior do que a de Recife e isso reverbera na quantidade de espetáculos em cartaz na cidade, assim como nas verbas compartilhadas, através das leis de incentivo, dos SESCs, e de outras formas capitais que viabilizam a produção local. Com a implementação do Fomento vários pequenos espaços alternativos surgiram na cidade, pois uma das condições da Lei é a continuidade de pesquisa. O que levou vários grupos a constituírem uma sede. Isso está diretamente ligado à linguagem utilizada, saindo dos palcos italianos tradicionais, tendo o espectador mais próximo da encenação e flertando com as artes plásticas, performáticas, com a dança, as multilinguagens… Tendo um teatro que podemos chamar de contemporâneo. Para isso fez-se necessário um política cultural, deixando o Teatro de ser um produto e sim um resultado artístico real, sem maneirismos de enquadramento num gosto massificado e comercial. Sendo assim, fazendo uma analogia com o que vi surgir em São Paulo, percebo um movimento parecido em Recife, tendo as suas devidas proporções. Percebo um maior engajamento político dos artistas locais e das vontades de ter em Recife uma cena forte e que dialogue com o que está se fazendo no Mundo, não como uma cópia, mas sim como um reflexo do entorno que vivemos: homens contemporâneos e inquietos. Percebo ainda uma carência de atividades de formação e gostaria que existisse um maior diálogo com os outros estados do Nordeste, pois temos muitas questões culturais pertinentes à nossa região e isso poderia ser um caminho para acharmos algo definitivamente próprio. Percebo que estamos caminhando para um lugar onde o Teatro, não seja mais visto como algo secundário na vida dos artistas, e sim, seja no sentido mais pleno, a profissão que dá a inquietação necessária para criar e o conforto para viver. Ainda é uma Utopia, claro. Mas percebo que este pensamento tem estado mais presente. E só ele para fazer com que nos juntemos em prol de mudanças no legislativo que rege as artes cênicas no estado.

Direção e dramaturgia são de Tiche Vianna

Tay: Posso dizer que nos conhecemos praticamente crianças, cheios de vontades e de expectativas com relação ao mundo artístico. O que ficou do menino de Caruaru e o que, naquela época, era semente e hoje é fruto? Qual adubo ainda te faz florescer?
Kleber: Daquela época Tay, ainda existe (espero que por muito tempo) o menino curioso e com a necessidade de se expressar pela arte. Viver dela e nela. Hoje percebo frutos colhidos, mas a vontade de aprender do menino ainda é a mesma. É o adubo. Saber que a estrada é longa e sempre tenho mais desafios a me fazer.

Tay: Atuar nos põe em contato diretamente com invisibilidades e epifanias que nos norteiam na construção de um personagem ou no momento da apresentação do próprio espetáculo. Qual a sua ligação com o Sagrado? Ele existe?
Jorge: O sagrado se revela em mim quando invisto em algo e me conecto a ele com empenho e respeito. Seja meu ritual matinal de só falar pela manhã depois de beber um copo de água até o hábito de orar todas as vezes que sou impulsionado para isso. Dessa forma, o sagrado está presente em minha vida de muitas formas e a linguagem teatral é uma delas. Para mim, toda nova experiência em teatro é um vazio. Cada construção de personagem, cada récita é um momento imprevisível e irreproduzível. Por isso, para garantir a realização das minhas criações em teatro preciso me conectar ao sagrado. É ele que me conduz às necessidades específicas de cada obra e permite que eu consiga corporificar personagens. A minha arte é justamente meu corpo movido pelo sagrado.

Kleber: O que o deslocamento para fora do Recife te trouxe? O que você tem e o que falta?
Tay: O deslocamento para fora das fronteiras do Recife me fez ter uma perspectiva de olhar diferente. Sobre mim mesmo, sobre minha terra e sobre o Teatro que desejava. Saí de Recife ainda muito jovem com apenas 19 anos e saí em busca de formação. Em 1999, a cidade oferecia enquanto terceiro grau, a licenciatura em Artes Cênicas, através da UFPE. Um tanto quanto desestimulado por alguns resolvi não prestar vestibular e partir atrás de uma formação mais voltada para o trabalho do ator. Escolhi São Paulo e fui! Comecei muito novo no Recife, com apenas 11 anos, fazendo um teatro mais comercial onde nem eu saberia distinguir, na época, qual seria a diferença entre o Teatro-arte-depoimento e o teatro reprodutor de fórmulas televisivas. Deslocar-me da cidade me pôs obrigatoriamente em contato com a multiplicidade teatral de São Paulo. Colocou-me obrigatoriamente em contato com o que me faz ator. Não entrei na USP para fazer Bacharelado em Artes Cênicas, mas tive a oportunidade de participar de processos de montagens da EAD, de participar de seleções de elenco, onde terminei sendo convidado pra ingressar no XPTO, grupo que até hoje faço parte, fiz inúmeras oficinas gratuitas nos SESCs, nas Oficinas Culturais do Estado, no SESI… Enfim… Estar em São Paulo, colocou-me num estado real, contínuo e obrigatório de formação artística. Acredito que somos a representação de tudo o que vivemos. Das peças a que assistimos, dos livros que lemos, dos filmes que vemos, dos amigos que temos, dos lugares que visitamos. Não posso negar que estar em São Paulo é estar mais próximo, culturalmente, do que está se produzindo no Mundo. Sabemos que a cidade é rota dos principais espetáculos, das principais exposições e cidade-sede de intercâmbio dos artistas mais variados. Ter acesso a essas obras é um pouco se educar e beber numa fonte que realmente te alimenta. Sinto falta de uma formação tradicional, de um diploma, sinto falta da família e do mar que também me faz ator. Vivo em crise e estou, sem demagogia, mais atento ao que não tenho do que ao que tenho. Tenho vontades, muitas… Todo final de ano penso em desistir de tudo, em prestar um concurso público e virar um engravatado burocrático. Penso que ainda existe tanta coisa pra aprender. Falta-me tempo e dinheiro para consumir mais arte, para viajar mais, para parar só para estudar… Mas sei que tenho um histórico que não me arrependo. E que me honra. Tenho uma felicidade extrema em exercer a minha função no espaço teatral. Tenho cada vez mais respeito pela arte. Tenho sorte em ter encontrado artistas instigantes no meu caminho. Tenho gratidão em poder melhorar enquanto ser humano, através do Teatro. Começo a acreditar que tenho mais convicções e certezas, conseguindo sair da fase do SIM para tudo e começando a dizer NÃO para aquilo que não me movimenta enquanto artista. Sinto falta de algo que nem sei o que é. Mas é isso o que me move. Talvez seja a tal completude mítica que nos faz caminhar!

ENTREVISTA // TICHE VIANNA

Jorge: O que Recife moveu em você?
Tiche: Recife moveu em mim sentimentos antagônicos. Esta cidade com sua história estampada nas ruínas dos antigos palácios, casarões, ruas estreitas e gente de tudo que é jeito mostrando a mistura de tantas culturas, me deixava alegre diante da possibilidade de ousar e triste diante das suas próprias contradições. A cidade me revelava a imposição da modernidade como se os edifícios quisessem se distanciar de alguma coisa que não se quer ver. Aí eu percebia o abandono das coisas essenciais, como o do bem estar das pessoas simples. Diante de um mar incrível, onde não podemos nos banhar por causa dos tubarões ou diante de rios imensos onde não entramos por causa da poluição, compreendi o que significa a aparência de ter coisas das quais não podemos usufruir e o quanto este choque de realidades tão coladas umas às outras é capaz de criar vilões e submetidos. Mas há muito afeto em Recife, muitas carícias também. O antagonismo se deu em mim porque ao mesmo tempo em que fazia algo que amo fazer: criar teatro, inventar mundos que são reflexos iluminados de realidades presentes, lutava contra essa tristeza de ver tão explicitamente um abandono imenso e um salve-se quem puder ou quem for capaz de se salvar. Me salvei porque estava criando e estava com gente que também sabe se salvar na arte. Mas pisamos terrenos minados várias vezes. Acho que o espetáculo retrata esses sentimentos. Não é possível ultrapassar o limite até que se reconheça estar preso entre as margens!!! Recife moveu em mim a percepção de muitas margens e a urgência de ultrapassá-las!

Atores entrevistaram diretora

Tay: Levando-se em consideração nossas inquietações artísticas e nosso eterno caminho de busca, tendo sempre a consciência de uma obra em construção, onde mora a segurança num trabalho teatral? Qual pilar te sustenta e te dá estabilidade para conduzir um processo?
Tiche: Tay, a segurança não mora, ela nem existe. É uma invenção da necessidade humana para termos coragem de ousar. Não é preciso segurança para fazer teatro, é preciso confiança. Não confiamos porque estamos seguros, confiamos porque acreditamos no que podemos. O que me sustenta são as relações com meus parceiros de criação durante o processo. Meu pilar é a confiança que eles mostram ter sobre suas possibilidades de inventar o desconhecido. Nunca me sustento em um processo de criação, ao contrário, desmonto e porque me desmonto construo, pra não ficar para sempre aos pedaços. Quem desmonta não tem estabilidade nehuma. Se fosse estável eu quebraria. Vivo porque me desestabilizo diante de cada novo acontecimento gerado pelo movimento infinito da existência.

Kleber: O que ficou da experiência conosco?
Tiche: Ficou admiração, ficou amizade, ficou parceria, ficou confiança, ficou prazer, ficou a pergunta: porque foi tão árduo chegar ao fim?

Serviço:Daquilo que move o mundo
Quando: Quinta e sexta-feira, às 20h; e sábados e domingos, às 18h. Até 07 de outubro
Onde: Espaço Fiandeiros – Rua da Matriz, 46, 1º andar, Boa Vista.
Quanto: R$ 10 e R$ 5 (meia-entrada)
Informações: (81) 4141.2431
Lotação sujeita ao espaço da sala: 30 lugares

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Movendo o mundo

Daquilo que move o mundo estreia no Espaço Fiandeiros. Foto: Priscila Buhr

Kleber Lourenço, Tay Lopez e Jorge de Paula habitam uma ilha no espetáculo Daquilo que move o mundo, que estreia hoje, às 20h, no Espaço Fiandeiros. A direção e a dramaturgia são assinadas por Tiche Viana, uma das fundadoras do Barracão Teatro. Tiche é uma das responsáveis pela preparação de atores das minisséries assinadas pelo diretor Luis Fernando Carvalho, como A Pedro do Reino e Capitu.

Desde janeiro, a diretora assumiu o processo – que, na realidade, começou bem antes. Foram cinco anos pensando essa montagem, que agora tem o apoio da Eletrobrás, do Ministério da Cultura e do Programa de Fomento às Artes Cênicas da Prefeitura do Recife.

Depois de fazer curta temporada no Recife – de hoje a 07 de outubro, quintas e sextas, às 20h, e sábados e domingos, às 18h, o grupo deve fazer temporada em São Paulo.

Ficha técnica:
Direção e encenação: Tiche Vianna (dramaturgia colaborativa)
Elenco: Jorge de Paula, Kleber Lourenço e Tay Lopez
Direção de arte: Luciano Pontes
Iluminação: Saulo Uchôa
Trilha sonora: Missionário José
Programação visual: Gabriel Azevedo
Produção executiva: Kleber Lourenço e Pedro de Castro
Realização: Visível Núcleo de Criação e P Castro Produções

Serviço:
Daquilo que move o mundo
Quando: Quinta e sexta-feira, às 20h; e sábados e domingos, às 18h. Até 07 de outubro
Onde: Espaço Fiandeiros – Rua da Matriz, 46, 1º andar, Boa Vista.
Quanto: R$ 10 e R$ 5 (meia-entrada)
Informações: (81) 4141.2431
Lotação sujeita ao espaço da sala: 30 lugares

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Duas mulheres no POA em Cena

Duas mulheres em preto e branco estreou em Porto Alegre. Foto: Ivana Moura

Um beijo de um minuto e vinte segundos pode tirar muita gente do sério no espetáculo Duas mulheres em preto e branco. O incômodo pode chegar de alguma forma ao ver aquelas bocas que se comem, que se comem, que se comem. O que poderia ser excitante vira uma escavadeira a buscar as camadas mais profundas. A essa altura o público já sabe que Letícia e Sandra eram grandes amigas, que estudaram juntas, passaram incólume pelo regime militar, que faziam parte da esquerda festiva e que no fundo não acreditavam muito na política.

A peça estreou ontem, no 19º Porto Alegre em Cena – Festival Internacional de Artes Cênicas e tem mais duas apresentações, hoje e amanhã, na capital gaúcha. No Recife, a montagem deve ficar em cartaz de 29 de setembro a 21 de outubro.

A atriz Sandra Possani interpreta Sandra, que é casada com Paulo. E Paula de Renor faz Letícia, que é casada com Miguel. Formavam um quarteto. Que se desfez com a separação de Sandra e Paulo e desabou de vez quando Letícia descobre que sua grande amiga Sandra é amante de Miguel. Mas no palco só estão as duas mulheres, com suas memórias. E as acusações e ameaças. São personagens despedaçadas.

Paula de Renor e Sandra Possani são dirigidas por Moacir Chaves

Como médicas, elas já ouviram muitos relatos de dor, mas desta vez elas vomitam frustações e medos. Fazem referências aos filmes de Visconti, Fellini e Pasolini. E tentam chegar a algum lugar. E se Letícia assassinasse Sandra, seria uma solução? A intimidação aparece em muitos momentos. E as matanças simbólicas ocupam o palco no embate entre essas duas atrizes.

A montagem é uma transposição para o palco do conto homônimo de Ronaldo Correia de Brito, que faz parte do livro Retratos imorais. Não houve adaptação para o “cárcere” da dramática.

Texto da peça é de Ronaldo Correia de Brito

O diretor Moacir Chaves trabalha com teatro narrativo há algum tempo. Na montagem Duas mulheres em preto e branco ele reforça a quebra na estrutura ao organizar cenas e intercalar falas da dramatização com o discurso narrativo. Com isso, o tempo presente move-se em relação ao passado, num movimento de idas e vindas. Ao passado mais longínquo da década de 1970 até o questionamento do futuro, do que Letícia irá fazer se matar Sandra. As personagens presentificam as ações, narram e comentam e isso cria muitas unidades de descobertas e recomeços. E com isso se constrói uma pluralização de vozes e pontos de vista. Do espectador é exigida uma participação mais plena, pela imaginação dos fatos narrados.

Das atrizes foi exigido muito. Um mergulho em outras águas com muitas preciosidades. Isso é um trabalho que demanda do ator entrega e domínio técnico para que funcione como um jogo em que cada se multiplica. No início do espetáculo de estreia, as atrizes me pareceram um pouco nervosas. Absolutamente natural. Com o andamento da peça, elas foram se soltando e criando a cumplicidade com a plateia. Ficaram mais senhoras dos espaços, das intenções, das ações, com muitas nuances desse texto de Ronaldo Correia de Brito. A luz emana das duas intérpretes.

A parceria entre Moacir Chaves e o iluminador Aurélio de Simoni rende mais uma vez uma cena visualmente bonita e cativante. A cenografia de Fernando Mello da Costa tem principal artefato uma larga cama desequilibrada, como um fetiche do próprio quarto, da própria casa.
Duas mulheres em preto e branco é uma peça verborrágica, com suas duas histéricas a tentar encontrar uma saída digna depois de serem atingidas pelas fraquezas humanas.

Montagem estreia no Recife no dia 29 de setembro

A estreia de Duas mulheres em preto e branco ocorreu na mesma noite da primeira das três aguardadas apresentações do Berliner Ensemble, companhia fundada em 1949 por Bertolt Brecht e Helen Weigel, com Mãe Coragem e seus filhos. O charmoso Teatro de Câmara Túlio Piva não estava lotado. Mas tinha muita gente. Os amigos da gaúcha Sandra Possani, o diretor e toda equipe técnica e uma espectadora bem especial, Cristiane Rodrigues, neta de Nelson Rodrigues.

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Ainda restam vestígios de humanidade?

Roberto Brandão e Carlos Lira em cena de Vestigios. Foto: Américo Nunes

Ele tinha ensaiado com o elenco até às 3h da madrugada. Por isso quando cheguei à casa de Antonio Edson Cadengue, no fim da manhã de ontem, o diretor ainda estava com cara de sono. E pediu desculpas… cansado é sempre mais difícil fazer sínteses. Principalmente para perguntas que trazem muitas pessoas, referências, histórias à cabeça – como: “quando você conheceu Aimar Labaki?”. Foi ao Festival Recife do Teatro Nacional, na época em que chamou Labaki para compor uma espécie de curadores consultores, à São Pauo e a uma amiga muito querida que tinham em comum, aos tempos de orientando de Sábato Magaldi. É, realmente. Esse encenador carrega muitas histórias dentro de si. Porque querer a síntese? E é lindo ver a dedicação dele a mais um projeto – o entusiamo, o brilho do olhar. É nesse clima – e ele diz que os ensaios correram maravilhosamente bem – que Cadengue estreia hoje à noite o espetáculo Vestígios.

Apesar da amabilidade de todo o discurso e processo, não foi nada fácil. Até porque o texto faz com que nos deparemos com as atrocidades que o humano é capaz de cometer. Que eu e você somos capazes de cometer. Porque violência, afinal, não é só o que aconteceu na época da escravidão, da Ditadura Militar, do Estado Novo…a violência está dentro de nós mesmos. Lugar comum, eu sei.

No elenco da montagem, que tem texto de Aimar Labak, estão Carlos Lira, Marcelino Dias (que fazem dois investigadores-torturadores) e Roberto Brandão, um professor de história. Pela manhã, o professor acorda com a cabeça de uma mulher na cama; não lembra o que aconteceu; deixa aquela cabeça no IML, mas termina preso e precisa revelar mais do que supostamente sabe.

Cadengue e Carlos Lira, idealizador do projeto, já tinham trabalhado juntos em 1988, quando Cadengue o dirigiu em O burguês fidalgo, de Molière. Nunca mais se encontraram nos palcos depois disso. Já era o momento do reencontro e de aparar arestas mesmo. Já com Roberto Brandão, Cadengue trabalhou em A morte do artista popular. Roberto foi aluno de Cadengue no Sesc Piedade e é com lágrimas no olhos que o diretor nos conta uma linda experiência – em que Roberto finalmente perdeu quaisquer pudores que poderia ter no palco, numa encenação de um conto de Dalton Trevisan.

Na ficha técnica de Vestígios estão Rudimar Constâncio (assistente de direção), Doris Rollemberg (cenografia), Anibal Santiago (figurinos), Eli-Eri Moura (trilha sonora original), Luciana Raposo Saulo Uchôa(iluminação e operação) – desculpas, Saulo! Foi a ficha técnica que recebemos da assessoria de imprensa da peça! -, Paulo Henrique Ferreira (direção de movimentos e preparação corporal), Flávia Layme (prepação vocal), Claudio Lira (programação visual), Kleber Macedo, Rafael Firmino e Fábio Fonseca (assistência de cenotécnica), Marinho Falcão (operação de som), Elias Vilar (assistência de produção/contrarregragem).

Vestígios
Quando: sábados e domingos, às 20h, até o fim de setembro
Onde: Teatro Barreto Júnior (Rua Estudante Jeremias Bastos, s/n, Pina)
Quanto: R$ 10 e R$ 5 (meia-entrada)

Diretor Antonio Edson Cadengue trabalha com texto de Aimar Labak pela primeira vez

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