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Janeiro começa com irreverência do Dzi Croquettes

Encontro do Dzi Croquetes e Vivencial, na Galeria Café Castro Alves. Foto: Helder Ferrer

Encontro do Dzi Croquetes e Vivencial, na Galeria Café Castro Alves. Foto: Helder Ferrer

Duas potências cênicas num encontro memorável. O grupo Dzi Croquettes cambiou alegrias no encontro com os integrantes da trupe Vivencial, ontem, na Galeria Café Castro Alves (Rua do Lima, 280, Santo Amaro) Com o espaço lotadíssimo, ambas as tropas irreverentes, marcos do teatro brasileiros travaram um conversa sobre arte e vida.

Hoje o grupo abre o Janeiro de Grandes Espetáculos com a montagem –, Dzi Croquettes em Bandália – Um Musical Eletrônico. É um musical brasileiro que traz de volta uma tropicalidade, na pele de vedetes antropofágicas carnavalizando o mundo, com suas críticas certeiras. O diretor e ator Ciro Barcellos se inspirou para a encenação em Torquato, Capinan, Macalé, Gil e Caetano. Mas a peça remete para o Brasil de sempre, com toda a bandalheira.

A volta do celebrado bando de artistas ao palco ganhou um empurrão definitivo com o sucesso do documentário Dzi Croquettes (2009), de Raphael Alvarez e Tatiana Issa. Com apenas três integrantes do grupo original Claudio Tovar (figurino), Bayard Tonelli participação especial e Barcellos (a maioria dos integrantes do Dzi já morreu). O elenco jovem foi selecionado entre 450 candidatos.

O Dzi Croquettes desafiou a ditadura militar há 40 anos, encarou a censura e desbundou nos palcos. Treze homens barbudos travestidos causaram furor. Foram exilados, fez turnê pela Europa, ganhou um fã-clube de estrelas, como Liza Minnelli, e em 1975 o grupo se desfez. Com o documentário, o grupo passou a ser conhecido, admirado e festejado pelas novas gerações.

Coletivo carioca faz três apresentações no Recife. Foto: Divulgação

Coletivo carioca faz três apresentações no Recife. Foto: Divulgação

SERVIÇO

Dzi Croquettes em Bandália – 40 Anos de História / Dzi Croquettes (Rio de Janeiro/RJ)
Quando: Hoje, amanhã e sexta-feira, às 21h
Onde: Teatro de Santa Isabel
Quanto: R$ 40 e R$ 20
Indicação: a partir de 16 anos

Ficha técnica –
Concepção, texto e direção geral: Ciro Barcellos.
Assistência de direção e roteiro: Radha Barcellos.
Direção musical: Demétrio Gil.
Coreografias: Ciro Barcellos e Lennie Dale.
Direção técnica: Ronaldo Tasso.
Iluminação: Aurélio de Simoni.
Trilha sonora: Demétrio Gil e Flaviola.
Figurinos e adereços: Cláudio Tovar.
Cenário: Pedro Valério.
Supervisão artística: Thina Ferreira.
Direção de produção: Robson Agra.
Produção executiva: Anna Ladeira.
Elenco: Ciro Barcellos, Demétrio Gil, Udilê Procópio, Leandro Melo, Thadeu Torres, Franco Kuster, Pedro Valério, Ricardo Burgos, Sonny Duque e Robson Torinni, com participação especial de Bayard Tonelli.

Escrevi textos sobre o Dzi Croquettes que foram publicados no Diario de Pernambuco. Reproduzo aqui:

Documentário sobre o grupo ganhou muitos prêmios em festivais e incentivou a volta do grupo. Foto: Divulgação

Documentário sobre o grupo ganhou muitos prêmios em festivais e incentivou a volta do grupo. Foto: Divulgação

Desbunde desafia regime militar
Cine BH // Grupo de teatro que virou símbolo da contracultura brasileira, Dzi Croquettes provocou revolução nos costumes nos anos 1970 e inspira documentário
2009/10/20/viver15

Passeata de coturno rimava com arrepios de pavor. Cada vez menos cidadão, o brasileiro gradativamente perdia seus direitos individuais. A repressão política sumia com pessoas nos seus porões. A força bruta sustentava o regime militar. Nesse cenário, no início da década de 1970, surgiu um grupo que revolucionou os costumes do lugar, influenciou artistas no Brasil e na Europa e conquistou o coração da cantora Liza Minelli e a sempre surpreendente Paris.

Desbunde com inteligência, ironia com coragem, alegria contagiante são algumas das qualidades do grupo de teatro Dzi Croquettes, que fez da arte sua arma naqueles anos de chumbo, primeiro no Rio de Janeiro, depois em São Paulo. O bando, que se tornou símbolo da contracultura brasileira, usava humor, graça, talento, em númeroscantados, dublados e dançados, entremeados por monólogos inspirados na experiência dos integrantes para falar da realidade, da repressão sexual passando pela censura e pela ditadura.

A trupe causou furor, com seus figurinos ousados, maquiagem pesada e um árduo trabalho de interpretação. Wagner Ribeiro, a Mammy, era uma espécie de “cabeça” do grupo (criador dos textos), e Lennie Dale, dançarino norte-americano, era o Pappy, “o corpo” da equipe (coreografias). Participam ainda do bando os bailarinos Cláudio Gaya, Cláudio Tovar, Ciro Barcellos, Reginaldo de Poli, Bayard Tonelli, Rogério de Poli, Paulo Bacellar, Benedictus Lacerda, Carlinhos Machado e Eloy Simões.
Esses rapazes ensolarados despertavam paixões em homens e mulheres. Juntos, eles eram manifestações de criatividade, sensualidade, androginia. Seus shows resplandeciam de purpurina, brilhos e escracho com grande impacto visual. Eles fizeram escola.

A atriz e cineasta Tatiana Issa, filha do cenógrafo Américo Issa, que fazia parte da equipe técnicada trupe, captou esse espírito meio louco, de quem rompeu com os paradigmas, no documentário Dzi Croquettes. Quando Tatiana tinha dois anos, em Paris, conviveu com o grupo, que chamava de palhacinhos. Ela assina a direção em parceria com Raphael Alvarez. Dzi Croquettes foi exibido no domingo na Mostra Cine BH, onde arrancou calorosos aplausos. Dzi Croquettes ganhou dois prêmios no Festival do Rio, o do Júri popular e o de melhor documentário, dividido com Reidy, aconstrução da utopia, de Ana Maria Magalhães.
O documentário está dividido em segmentos em que os personagens são apresentados um a um, sem necessariamente seguir uma ordem cronológica. E é entrecortado por depoimentos atuais de quem conviveu ou foi influenciado pela trupe. Na lista de entrevistados constam Marília Pêra, Gilberto Gil, Nelson Motta, Ney Matogrosso, José Possi Neto, Claudia Raia, Miguel Falabella, Pedro Cardoso, Elke Maravilha e Liza Minelli.

O tom do filme é apaixonado, ao ponto de suplantar até mesmo alguns obstáculos técnicos, com a precariedade do som. Além dos depoimentos (inclusive dos cinco integrantes do grupo que estão vivos) entrecortados por temas, que enriquece a construção da memória, os diretores utilizaram imagens de arquivo (o mais rico foi um super-8 de um ensaio, único registro audiovisual dos dançarinos, que encontraram na Alemanha).

O filme começa com um painel sobre o Brasil na época do AI-5 e depois expõe o grupo, utilizando fotografias e intervenções tecnológicas. A abordagem apaixonada deixa de fora idiossincrasias e questões mais contraditórias do funcionamento interno do grupo, como o episódio do rompimentode Lennie Dale com o restante do bando. E não aprofunda os problemas de relacionamento provocados pelo temperamento intempestivo de alguns. É uma ausência no documentário que buscou enaltercer a trajetória desse grupo solar, que mudou a direção dos ventos na arte brasileira.

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Arte indomável do Dzi Croquettes
Com deboche e criatividade, trupe teatral provocou revolução nos palcos dos anos 1970 e tem sua história recuperada em documentário que tem pré-estreia hoje, no Cinema da Fundação
Ivana Moura
2010/09/07/viver1_

Um bando de 13 homens peludos, barbudos, transbordantes de irreverência, vestidos com roupas e acessórios femininos, usando uma maquiagem pesada, desafiou a rigorosa ditadura militar nos anos 1970. Com ironia e inteligência, o grupo se tornou símbolo da contracultura. Um escracho só! Com performances de dança e esquetes de comédia, criaram um produto único, sem classificação naqueles tempos sombrios, e arrebatavam fãs por onde passavam.

Parte da trajetória dessa trupe extraordinária, chamada Dzi Croquettes, é recuperada pela dupla de cineastas Tatiana Issa e Raphael Alvarez, no filme que leva o nome do grupo, Dzi Croquettes. O documentário tem pré-estreia hoje, no Cinema da Fundação, com a presença do ator Claudio Tovar, ex-integrante do grupo. Os diretores Raphael Alvarez e Tatiana Issa estão em Nova York, onde moram. A sessão começa às 19h50, e, logo após, haverá um debate com o Tovar. Assisti ao Dzi Croquettes no Festival de Cinema de Belo Horizonte do ano passado. E mesmo sem ter conhecido a turma, fiquei com saudades de todo aquele escracho, de toda aquela energia.

A obra mistura docdrama e uma pesquisa exaustiva em arquivos, procedimentos articulados com entrevistas inéditas e uma edição ágil, que dá conta do clima festivo, irreverente e gracioso do grupo. Algumas imagens de arquivo foram encontradas num canal de televisão alemão, que filmou um espetáculo na íntegra, em meados dos anos 1980. O filme também traz depoimentos dos integrantes originais do Dzi Croquettes: Claudio Tovar, Ciro Barcelos, Bayard Tonelli, Rogério de Poly e Benedito Lacerda. Eles recordam a atuação do grupo e defendem a importância da turma para a cultura brasileira daquele período e a repercussão disso até hoje. Há também falas de gente que se relacionou com a trupe, como Marília Pêra, Betty Faria, Jorge Fernando, Miguel Falabella, Maria Zilda, Claudia Raia e Gilberto Gil, entre outros. Espécie de madrinha do grupo, a cantora e atriz norte-americana Liza Minelli dá um dos depoimentos mais emocionantes. Ela foi responsável pelo sucesso dos Dzi em Paris.

O filme abre com um painel do Brasil na época do AI-5 e depois apresenta o grupo, utilizando fotografias e intervenções tecnológicas. Os diretores não aprofundam nas idiossincrasias e contradições, no funcionamento interno do grupo, como o episódio do rompimento de Lennie Dale com o restante do bando. Nem investigam os problemas de relacionamento provocados pelo temperamento intempestivo de alguns. Insinua, é verdade, mas prefere seguir o caminho de enaltecer o percurso desse grupo solar, que marcou profundamente a arte brasileira e estava meio esquecido.

Mas o desbunde era fruto de muito trabalho, de pesquisa, de treinamento, de ensaio. Wagner Ribeiro, a Mammy, era considerado o “cabeça” do grupo (criador dos textos), e Lennie Dale, dançarino norte-americano, era o Pappy, “o corpo” da equipe (coreografias). Participam ainda do bando os bailarinos Cláudio Gaya, Cláudio Tovar, Ciro Barcelos, Reginaldo de Poli, Bayard Tonelli, Rogério de Poli, Paulo Bacellar, Benedictus Lacerda, Carlinhos Machado e Eloy Simões. Esses rapazes faziam homens e mulheres se apaixonarem. Juntos, eram manifestações de criatividade, sensualidade, androginia.

A liberdade era o principal alimento desse bando, que, de tanto cutucar a ditadura, ficou proibido de se apresentar no Brasil. Eles foram passar uma temporada em Paris. O grupo virou mito da cena teatral dos anos 1970. Sua transgressão artística e sexual influenciou outros coletivos, como a banda Secos & Molhados, liderada por Ney Matogrosso. Eles fizeram escola.

Dzi Croquettes na década de 1970

Dzi Croquettes na década de 1970

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Escracho e purpurina contra a caretice

Grupo Vivencial surgiu nas barbas da Igreja Católica. Foto: Ana Farache/Divulgação

Quatro décadas depois do surgimento dos grupos teatrais Dzi Croquettes e Vivencial, suas histórias peculiares ganham homenagens, livros e filmes

Eles queriam fazer diferente. E conseguiram. As afinidades entre dois grupos que apontaram novos caminhos para o fazer teatral começam com o direito que deram a si mesmos de questionar o estabelecido, no momento em que a repressão vinda com o AI-5 (1968) ainda reverberava.

Purpurina, cílios postiços, salto alto e escracho. O Dzi Croquettes surgiu no Rio de Janeiro, em 1972, por iniciativa de pessoas que já estavam próximas da arte, como Wagner Ribeiro, que queria reunir os amigos da escola de teatro para fazer um espetáculo.

Cláudio Gaya e Cláudio Tovar, atores do Dzi Croquettes

O Vivencial foi criado dois anos depois, em Olinda, nas barbas da Igreja Católica. O líder e mentor Guilherme Coelho era um paraibano que queria ser monge no Tibet, mas foi parar no Mosteiro de São Bento. Encontrou outros “desindexados”, como costuma dizer, e, para celebrar os 10 anos da Associação de Moças e Rapazes do Amparo (Arma), montou um espetáculo. A tensão libertária que havia em cada um dos grupos manifestou-se no palco. “Em Vivencial I, nossa primeira montagem, a proposta era ‘seja você mesmo, busque seu eixo, saia de casa, construa, mude o mundo’”, conta.

Mesmo tendo surgido depois, com proposta estética e conceitual semelhante, o Vivencial não tomou o grupo carioca como modelo. “Era a voz da contracultura. O teatro de revista, por exemplo, era muito forte aqui, com Barreto Júnior. Era pornochanchada, eles faziam coisas muito engraçadas e esse escracho a gente achava interessante. Mas não copiava. Tinha o teatro de revista, Nelson Rodrigues, Maria Bethânia, Secos & Molhados, o próprio Dzi Croquettes, a androginia. O mundo estava respirando isso”, avalia Guilherme Coelho. “Acho que fomos muito mais influenciados pelo Dzi Croquettes na época do Diversiones, que era um café-concerto que abrimos. Os números de plateia, por exemplo, eram uma influência descarada do Dzi, embora não copiássemos, era inspiração”, reconhece o ator Henrique Celibi.

Quase 40 anos depois da explosão em cena do grupo carioca e do pernambucano, suas experiências são lembradas em livros, filmes, menções. Em novembro de 2011, o Vivencial foi o homenageado do Festival Recife do Teatro Nacional, promovido pela Prefeitura do Recife, quando houve também o lançamento da obra Transgressão em 3 atos – nos abismos do Vivencial, assinada pelos jornalistas Alexandre Figueirôa, Cláudio Bezerra e Stella Maris Saldanha. Nos próximos meses, deverá ser relembrado no cinema, já que é “referência afetiva” para o filme Tatuagem, primeiro longa dirigido por Hilton Lacerda, que tem como protagonista Irandhir Santos.

O Dzi, por sua vez, teve sua história recontada em detalhes e muitos depoimentos no documentário que leva o nome do grupo, assinado por Tatiana Issa e Raphael Alvarez. Dzi Croquettes estreou no Brasil no Festival do Rio, em outubro de 2009, e saiu de lá como o melhor documentário, segundo o júri popular e também o oficial. Levou, ainda, o prêmio do público na Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, no Cine Fest Goiânia, no Torino GLBT Film Festival, e no Los Angeles Brazilian Film Festival.

Para sempre

“A gente não deixa de ser Dzi Croquettes. A gente não é ex-Dzi Croquettes, a gente é pra sempre. A maneira de pensar, agir, fazer, continua comigo”, diz o ator Cláudio Tovar. “Não existe ex-Viveca”, confirma Suzana Costa, uma das musas do Vivencial, ao lado da bailarina clássica que, quando percebeu, estava nos palcos “com os peitos de fora”, Ivonete Melo.

Vivencial não queria saber de rótulos - nem na vida, nem no palco. Foto: Gilberto Marcelino/Divulgação

Enquanto o Dzi Croquettes era formado só por homens – 13, no total (embora as mulheres, fossem namoradas, tietes, estivessem sempre rondando) –, o Vivencial tinha garotas na sua formação. Agregou, aliás, não só as mulheres. Quando, em 1978, no meio do mangue, no bairro de Salgadinho, construíram o Vivencial Diversiones, havia show de variedades e muitos travestis também se apresentavam. “Além de dar visibilidade positiva ao universo homossexual e se impor contra o autoritarismo político e moral da época, o Vivencial realizou um trabalho de inclusão social, oferecendo aos travestis uma oportunidade de seguir carreira artística. Ao instalar um café-concerto numa comunidade pobre de Olinda, o grupo não só incorporou aquela realidade à dramaturgia vivencial como também incluiu jovens do local nos seus espetáculos”, aponta Cláudio Bezerra.

Havia no Vivencial certo empirismo que se refletia na cena. “O teatro não era aquela coisa acadêmica. Quando você perguntava pelo método e ninguém respondia, é porque não tinha método nenhum. Mas, como salvação pela palavra, foi a melhor coisa que aconteceu”, avalia Suzana Costa. Já os Dzi tiveram a sorte de contar com o americano Lennie Dale, “pai do grupo”, embora eles também estivessem longe de qualquer fórmula acadêmica. “Quando fui assistir ao ensaio, notei que os meninos tinham, assim, uma garra, uma força de vontade tão grande. O que faltava neles era uma técnica de dança”, contou Dale, numa antiga entrevista. “Então, Lennie pegou os brasileiros ‘mocoronga’ e mandou pau em cima, oito horas de trabalho”, confirmou Wagner Ribeiro, também em antigo depoimento – tanto Lennie quanto Wagner já são falecidos.

O Dzi e o Vivencial tinham em comum, no entanto, o improviso, o humor, o sentido crítico no que levavam ao palco. Além, claro, da revolução comportamental vivida nos palcos e fora deles. Eram contra o maniqueísmo. “A cultura dizia que homem era assim, mulher era assim e quem fosse diferente não tinha vez. E a gente disse não: ‘Ser humano é para brilhar e não para morrer de fome’. As pessoas que eram diferentes eram obrigadas a entrar em papéis sociais restritos”, pontua Guilherme Coelho. “O espetáculo deles não era um espetáculo gay. Havia uma sexualidade boa, masculina, feminina, homossexual. Havia uma possibilidade absoluta do exercício da sexualidade”, depõe Pedro Cardoso, no documentário Dzi Croquettes.

Afetividades

Dzi Croquettes, as internacionais

Essa liberdade, os dois grupos levaram para a vida que, nem de longe, foi pacífica, sem conflitos. Até porque tanto os integrantes do Dzi Croquettes como do Vivencial moraram juntos. As relações eram intensas, as emoções viviam à flor da pele. Algumas Vivecas moraram juntas, antes mesmo da criação do café-concerto.
Até por conta do Dzi Croquettes ter surgido no Rio de Janeiro, o alcance que os dois grupos tiveram foi diferente. Os Dzi foram à Europa, tinham em Liza Minelli uma madrinha, fizeram temporada com teatro lotado em Paris. Com Repúblicas independentes, darling, que estreou em 1978, o Vivencial fez apresentações em São Paulo, no Teatro de Arena Eugênio Kusnet, e no Rio de Janeiro, no Teatro Cacilda Becker. Era uma colagem de textos de jornais, crônicas, contos e poesias de Carlos Drummond de Andrade, Carlos Eduardo Novaes, Luís Fernando Veríssimo e ainda depoimentos dos próprios atores.

“O nome do espetáculo era uma coisa extremamente engajada e depois vinha uma ‘pinta’. A gente relativizava tudo. Em São Paulo, lembro o Plínio Marcos, o Antunes Filho na plateia. E, depois, eles queriam saber como aquilo acontecia, porque para a gente era muito natural fazer teatro daquele jeito, usando todos os subsídios para fazer cenário, figurino. Transformando lixo em arte”, conta Fábio Coelho, bailarino do Vivencial.

Tanto o Dzi Croquettes quanto o Vivencial foram sucesso de público, nem sempre de crítica, embora os talentos fossem inegáveis. Talvez por isso mesmo, por reunir tantas possibilidades artísticas, os dois grupos acabaram se desagregando. O Dzi começou a ruir por conta de uma briga que tomou proporções muito maiores do que a sua causa: um cenário que Cláudio Tovar fez para uma apresentação e Lennie Dale não gostou. O Vivencial também se desfez por conta de conflitos. “Não podia faltar céu para tanta estrela brilhar. Todos eram muito brilhantes, com muito ego. Cada um era uma entidade, todos tinham projetos, e nós demos corda para esses projetos. Sempre poli o ego de todo mundo: ‘Você é linda, vai arrasar’, enchia de purpurina. O Vivencial nasceu para brilhar’, afirma Guilherme Coelho. Há um ditado, entre o cômico e o malicioso, que afirma, bem ao estilo de deboche dos dois grupos: “Bicha não morre, vira purpurina”. O Dzi Croquettes e o Vivencial, nesse caso, só nesse, não fugiram à regra.

(Matéria publicada na edição de Janeiro da Revista Continente)

Henrique Celibi, Fábio Costa e Guilherme Coelho. Foto: Henrique Celibi/acervo pessoal

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