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Bonequeiro e estudioso da cultura popular

Chico Simões é mamulengueiro, educador comunitário, ator, mágico, palhaço e ventríloquo. Desde 1983 viaja pelo mundo convivendo e aprendendo com mestres de várias tradições culturais. Depois de circular por três anos pelo Nordeste brasileiro convivendo com o amigo Carlinhos do Babau, do Carroça de Mamulengos, seu grupo, o Mamulengo Presepada, começou a atuar em Brasília em 1985. Ganhou do Mestre Solon, do Mamulengo Invenção Brasileira, os primeiros bonecos e a bênção para seguir caminho. “Aprendi como os mestres sobretudo sobre a vida e sobre o conhecimento, porque em nenhuma relação de aprendizado se falou em dinheiro. Ninguém paga para aprender e ninguém cobra para ensinar entre a gente. A gente aprende por convivência. Então é uma educação completamente diferente. Uma outra maneira de ver a vida”, conta Simões, que esteve no Sesi Bonecos do Mundo sábado passado, em São Paulo.
“Outra coisa, para cada um basta o suficiente para viver. Ninguém tem mais, não acumula, se tem um pouco mais já é pra dividir, pra repartir, pra compartilhar, e assim vai vivendo, mesmo com toda a dificuldade. E vi que não era só uma técnica, não era só um jeito de brincar. Era um jeito de viver e ver a vida e de compartilhar as coisas que a gente aprende”, ressalta. Chico ganhou diversos prêmios, entre eles: Bolsa Virtuose do Ministério da Cultura para pesquisar na Europa as origens das tradições do teatro popular brasileiro. Em 2009 Foi “Visit scholar” na Universidade de Berkeley – Califórnia – USA.

Bonequeiro Chico Simões, do Mamulengo Presepada, do Distrito Federal, atua pela valorização dos mestres populares. DUDU SCHNAIDER /DIVULGAÇÃO

Entrevista: Chico Simões

“Se os estados/governos/sociedade do Nordeste dessem a metade do valor que os estados do Sul dão aos seus fazedores de culturas a situação já melhoraria bastante”

“Tramita no Congresso uma Lei dos Mestres que poderá conceder bolsas vitalícias aos mestres de culturas populares”


Qual o lugar da cultura tradicional, em especial da arte dos bonequeiros populares em meio à cultura de massa e a complexidade do mundo globalizado?

Então vamos globalizar também as culturas tradicionais e especialmente os mamulengos. A globalização não pode ser sinônimo de massificação… A cultura de massa está vivendo seus últimos dias. A própria tecnologia esta democratizando os meios de produção, divulgação e comercialização de produtos sustentáveis e o mamulengo é um exemplo dessas permaculturas que estão falando por aí… Todo mundo sabe que toda monocultura é prejudicial à vida no planeta. O grande lance é mesmo a diversidade e nela cabe não só o mamulengo como também o rock and roll. Já sobrevivemos a tempos piores….

Além de aprendiz de feiticeiro, você também é um estudioso dos bonecos. Em suas andanças pelo Brasil, o que você pode colocar como realidade nas regiões e nos estados?
Sem demagogia nenhuma, o SESI BONECOS é uma exceção nacional e um bom exemplo a ser seguido por outros produtores e pelo estado, de como respeitar os brinquedos e os brincantes de culturas populares oferecendo-lhes respeito e dignidade, sem folclorizá-los nem inferiorizá-los… O resultado é que todos, principalmente o público, ganham com esse tratamento.
O Brasil é um continente de diversidade e combinações culturais incríveis e maravilhosas, mas as desigualdades ainda prevalecem… Posso dizer que se os estados/governos/sociedade do Nordeste dessem a metade do valor que os estados do Sul dão aos seus fazedores de culturas a situação já melhoraria bastante. Mesmo no Nordeste a situação do brinquedo e dos brincantes é bem diferenciada. Em Pernambuco, de onde vem o nome mamulengo, se destaca o brinquedo feito na Zona da Mata e os mestres ainda brincam pelos sítios e salões recolhendo entre o público os recursos necessários pra poder seguir brincando e o estado de vez em quanto contrata uma brincadeira para algum evento. Mas nos outros estados, como Paraíba onde o brinquedo se chama Babau; Rio grande do Norte, onde o brinquedo se chama João Redondo ou Calunga; e no Ceará e Piauí onde se chama “Cassimiro Coco”, a situação dos mestres é de completo abandono pelo estado, que ao invés de incentivar, desestimula os brincantes. Se algo não for feito vamos observar não o fim, mas uma grande descontinuidade na transmissão da arte e dos segredos do mamulengo, da velha para a nova geração de brincantes. É como se estivéssemos matando, por descuido e abandono, nossa “galinha dos ovos de ouro”.

Existem políticas públicas para os bonequeiros no Brasil? Você tem notícias de algo nesse sentido em outros lugares do planeta?
No Brasil estamos na reta final para o registro do teatro popular de bonecos como patrimônio imaterial e o próximo passo será a adoção de políticas de salvaguarda… mas isso tudo esta só no papel e com tantas mudanças a cada gestão política não temos nenhuma garantia de que um dia teremos uma política consistente que beneficie diretamente os mestres e seus aprendizes. Tramita no congresso uma Lei dos Mestres que poderá conceder bolsas vitalícias aos mestres de culturas populares em geral, que podem vir a atender os mestres mamulengueiros, mas pelo andar da carruagem até que um mestre seja contemplado com esse direito talvez a figura do mestre como entendemos hoje nem exista mais…
Na Itália tem uma escola livre de guaratelle (boneco tradicional), Na inglaterra o Punch and judy é o oitavo símbolo nacional mais querido pelo povo e o brinquedo tem até lugar especial para apresentações super concorridas entre o público. Na França a escola da UNIMA (união Internacional de Marionetistas tem curso especial para os alunos interessados no Guinol… No Japão o Kabuki é uma arte milenar e os artistas são reconhecidíssimos pelo estado e pelo povo japonês, na China os elencos de teatro de bonecos popular, geralmente as óperas são estatais e o no Oriente Médio e índia os brincantes são tidos pela sociedade como uma espécie de sacerdote que andam de casa em casa levando alegria e espiritualidade para todos. Em outros países não sei…

Que políticas públicas precisariam ser implantadas para garantir a sobrevivência do brinquedo, a existência digna dos seus artistas e a ampliação dessa arte?

Campanhas publicitárias de valorização dos mestres e de suas brincadeiras. Reconhecimento legal do direito dos mestres com mais de 65 anos de idade receberem pensão vitalícia – Lei dos mestres. Campanhas junto às escolas públicas para que os brinquedos sejam objetos de estudos e os mestres do brinquedo sujeitos de ensino. Estabelecimento da obrigatoriedade das prefeituras destinarem recursos aos grupos de culturas populares do município.
Edital específico para apoio ao teatro popular de bonecos onde estejam previstos montagens, encontros ou festivais para realização de oficinas, rodas de prosa e toda maneira de troca de experiência e convívio entre os mestres e os aprendizes.

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Bonecos repletos de beleza

Arnaldo Antunes levou música ao Sesi Bonecos. Fotos: Ivana Moura

Um espaço de encantamento foi armado no fim de semana no Parque do Ibirapuera, em São Paulo. O público teve oportunidade de apreciar a sofisticação técnica do russo Viktor Antonov, um virtuosi na manipulação das marionetes de fios; o teatro italiano Girovago & Rondella, que cria personagens excepcionais com as mãos; os Poemas visuais do espanhol Jordi Bertran, os divertidos personagens criados com partes do corpo dos grupos peruanos Hugo y Ines e La Santa Rodilla. Mas além dessas atrações internacionais, o Sesi Bonecos do Mundo reuniu bonequeiros populares como Chico Simões, do Distrito Federal, Mestre Tonho de Pombos, Mestre Zé de Vina de Glória do Goitá (considerado o mais vigoroso atualmente), Mestres Waldeck de Garanhuns e Josivan. Eles fizeram demonstração de como se constrói e manipula os mamulengos e divertiram com seus brinquedos nas barracas.

Mestres Amaro e Zé de Vina, de Glória do Goitá

O grupo paulista XPTO trabalha com uma estética mais contemporânea, mas desta vez o diretor Osvaldo Gabrieli foi buscar inspiração no popular. A trupe exibiu o espetáculo O teatrinho de Dom Cristóvão, um texto picante de Federico Garcia Lorca, em que expõem com humor figuras trapaceirass e traidoras, como o velho rabugento Dom Cristobal e Dona Rosinha. A encenação Caetana, da Duas Companhias, arrancou elogios da plateia que encarou a chuva no sábado, ao contar a história de Benta, que tenta driblar a morte.

XPTO buscou inspiração no popular

As chuvas e as temperaturas baixas alteraram a disposição dos paulistanos de sair de casa. O festival Sesi Bonecos do Mundo, que montou uma quadra cenográfica dentro no Ibirapuera, foi visitado por número bem menor do que era esperado.

“Oito mil pessoas assistiram ao Sesi Bonecos do Mundo em São Paulo. Se este número parece grande para as costumeiras plateias de teatro de marionetes, para o Festival que ampliou as possibilidades de acesso à arte titereteira é pequeno. É que, mesmo tendo escolhido o período de maior seca na região, uma frente fria surpreendeu a estação. Agora, o Festival segue para o Rio. E a previsão é de sol para o fim de semana”, diz a publicitária pernambucana Lina Rosa Vieira, idealizadora e produtora do evento.

Lívia Falcão e Fabiana Pirro apresentaram Caetana

As duplas sessões durante três dias no Teatro do Sesi, na Avenida Paulista, foram lotadas. No primeiro dia os grupos peruanos Hugo y Ines e La Santa Rodilla mostraram que há muitas possibilidades de exploração artísticas do corpo, transformando mãos, pés, joelhos, barrigas e outras partes em personagens da vida cotidiana. A trupe italiana Girovago & Rondella exibiu dois personagens absolutamente sedutores, apresentando números de circo. O russo Viktor Antonov deixou o público feliz com seu desfile de bonecos de fio: uma bailarina hindu, o halterofilista, macacos acrobatas, um camelo, os detalhes são preciosos para comunicar com a público.

Nas apresentações no teatro, o projeto adotou ações de libra e audiodiscrição. “Dentre tudo, o que mais me emocionou foi a inclusão dos cegos e surdos no projeto”, conta Lina. Ela chorou quando viu um garotinho cego feliz ao tocar nos bonecos do Viktor, enquanto sua mãe explicava quem era aquela criatura.

Uma baixa do Sesi Bonecos foi Gulliver, da Cia Viaje Inmóvel, do Chile. A trupe chegou, mas o grande cenário não.

A abertura com o desfile do grupo mineiro Giramundo levou seus monstros, princesa, dragão, sapo, entre outros personagens, para brincar com crianças e adultos e reforçou a ideia que cada um possui seus monstrinhos. O Giramundo apresentou suas Torres Andantes de Bonecos. O conjunto de 9 torres, 30 bonecos de vara e 2 bonecos de mochila, apresenta várias formas de construção de bonecos gigantes.

A exposição dos 40 anos do Giramundo também é deslumbrante. Personagens dos 33 espetáculos fazem parte da mostra, reunidos por peças e com dados históricos da montagem.

Exposição reúne bonecos dos 33 espetáculos do Giramundo

Giramundo está comemorando 40 anos

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