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Teatro do Parque – Um memorial afetivo

Teatro do Parque. Foto: Ivana Moura

Teatro do Parque. Foto: Ivana Moura

“Fui de um tempo em que não havia ar-condicionado por lá e isso não impedia a ida dos espectadores para ver, numa ante-sala do inferno, shows inesquecíveis como o de Itamar Assunção; ou de Marlene cantando Brecht; ou de Egberto Gismonti (com gente gritando lá fora, a plateia mais que lotada e ele pedindo para que os portões fossem abertos para que o povo entrasse), numa apresentação que durou até quase meia-noite.

Fui de um tempo em que chovia tanto sobre a plateia quanto sobre o palco. Quando isso acontecia, ficava difícil escutar o que falava a pessoa ao lado. E nem mesmo as intempéries deixavam a casa fechada por tanto tempo. E aconteciam shows, espetáculos e exibição de filmes.

Vi cenas de cinema sem ser exibido filme algum: a queda de uma vara de cenário (ou luz, já não me lembro) ao fundo de uma cena da montagem de Zé Manoel para As Filhas do Sol; a curra não ensaiada do público para a leitura de A Pedra do Reino; o passamento de Beatriz Segall por conta do calor; um bailarino da Quasar Cia de Dança salvar a plateia de uma barata voadora; balés de morcegos no ar e passeios felinos em cenas que não lhe pertenciam.

Subi uma única vez naquele palco como ator em Olinda Olanda Olindamente Linda, que marcou a reabertura do Parque após a última reforma feita. Lembro da alegria e do orgulho ao me deparar com as pinturas descobertas e restauradas, das cadeiras das frisas cobertas de veludo vinho, da cortina novinha, do madeiramento do chão sem farpas ou pregos… A última vez que estive trabalhando lá foi como cenógrafo, numa curta temporada de O Fogo da Vida, de Sônia Bierbard.

Vi bons filmes, a preço simbólico, com plateias lotadas: mostras de Hitchcock e Bergman… Foi para lá que levamos nossa Muriel (com dois anos), para ver o seu primeiro – Les Triplettes de Belleville. Também tínhamos que levar repelente para não sermos sugado por nenhum Nosferatu em forma de mosquito.

Como sobre todos os teatros dessa triste cidade, sempre pairou sobre ele a ameaça do descuido institucional. Triste mesmo. Rogo aos céus que essa realidade seja modificada…”

Marcondes Lima, professor, diretor, ator, cenógrafo, figurinista

“A primeira vez que pisei profissionalmente em um palco de Teatro foi no Teatro do Parque, em 1998, na estreia de Sobrados e Mocambos, da Cia. Teatro de Seraphim, dentro do Festival Recife do Teatro Nacional. De lá pra cá, foram muitas alegrias, histórias, encontros, experiências vividas naquele espaço que hoje amarga o centenário triste de uma das mais belas arquiteturas teatrais que já vi. O abandono e o descaso da gestão pública calaram há cinco anos o Teatro do Parque, acostumado a receber a população recifense em festa para apreciar teatro, dança, exposições, cinema, música, festivais e projetos de todo o tipo.

Não há como lamentar qualquer tentativa de política cultural que não priorize a história, o lugar. O primeiro sentido da palavra “cultura” está em “cultivo”. Não se cultiva sem terra. Não se faz cultura sem território. E o território do artista é o palco. Em resposta à isso, diversos espaços nascidos das inciativas particulares de artistas e grupos estão tomando força na cidade, como um grito, um respiro dos artistas e da cultura recifense que tanto têm a dizer de sua estética para a cidade.

O Espaço Fiandeiros, que é o território do nosso Grupo, tinha pouco tempo de nascido quanto o nosso vizinho, o Teatro do Parque, fechou os seus portões. Ainda não tivemos o prazer de dialogar artisticamente com o nosso vizinho centenário. Em 2012, pesquisei para minha monografia o Plano Municipal de Cultura da Cidade do Recife em um paralelo com a gestão dos espaços cênicos que estavam crescentes na cidade. Pude perceber diversos pontos de interseção na ideia de política do plano e nas ações dos grupos que poderiam estar hoje atuando em rede, juntamente com os equipamentos culturais do nosso município, a exemplo do que já está acontecendo com o diálogo entre esse espaços e ações de festivais, projetos, intercâmbios entre os grupos, os artistas e a inciativa privada. Mas, infelizmente, as ideias até hoje não foram transformadas em ações. Enquanto trabalhamos todos os dias no nosso Espaço, olhamos vizinhos ilustres: a praça Maciel Pinheiro, a casa de Clarice Lispector, o Teatro do Parque… que poderiam estar formando junto conosco, com a sede do Grupo João Teimoso e agora com a sede do Magiluth (recém chegados na vizinhança), um efervescente corredor cultural na cidade. Ao contrário disso, sofrem juntos o amargo gosto da falta de vontade política.

Daniela Travassos, atriz e diretora de produção da Companhia Fiandeiros

“Ao contrário de muitos dos meus amigos, a minha relação com o Teatro do Parque é mais musical que teatral. Todas as vezes que passo na Rua do Hospício, sinto um aperto no peito, porque tem coisas na vida que não podemos mudar, mas nesse caso, podemos mudar sim. Se o poder público tivesse o mínimo de respeito à cultura, aos artistas, aos produtores e ao povo, tudo poderia ser diferente. Ver um dos nossos patrimônios culturais mais importantes fechados e no estado em que ele se encontra, é de partir o coração. Eu, particularmente, evito passar na frente, por que dói mesmo, no fundo.

Tive o prazer de trabalhar naquele Teatro no início de minha jornada como produtor, no projeto Seis e Meia, com a banda Malakaii e Max de Castro. Também presenciei shows memoráveis como o de Paulinho da Viola, Chico César, Edson Cordeiro e Xangai. Cada vez temos menos espaços e os espaços que temos estão mal tratados. O Teatro de Santa Isabel, Teatro Apolo, Teatro Hermilo, Teatro Barreto Júnior seguem sua trajetória sofrendo com problemas de iluminação, manutenção, ar-condicionado, sonorização. Precisamos não só do Teatro do Parque de volta, precisamos de políticas públicas que protejam os nossos espaços culturais.

Maurício Spinelli, produtor e assessor de comunicação

“O nome Parque não é por acaso.
Não… Ia ao teatro ver espetáculos, shows, filmes e, antes de entrar, ficava no Parque batendo papo com os amigos sobre teatro e afins. O Teatro do Parque era um espaço para troca, aprendizados, emoções. Foi em seu jardim que assisti pela primeira vez a atriz Augusta Ferraz – e quis ainda mais ser atriz. Lá apresentei um dos espetáculos mais inesquecíveis para mim, Poemas Esparadrápicos, e lá, muitas vezes, tive certeza que nasci para o meu ofício. Esperando ansiosa que os anjos que ali habitavam, os duendes e as fadas, espalhem amor na cabeça dos governantes, para que eles reconheçam a grandiosidade da história na vida de todos nós.”

Enne Marx, atriz, palhaça e produtora da Cia Animée e dos Doutores da Alegria

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Festa para Gonzaga, festa no teatro

Gonzagão – A lenda foi ovacionado no Santa Isabel. Fotos: Ivana Moura e Pollyanna Diniz

Quando soube que o 15º Festival do Teatro Nacional iria abrir com mais uma homenagem a Luiz Gonzaga pensei: Mais uma. A curadoria apostou no fluxo, nada contra a maré. Centenário, musical, Luiz Gonzaga, a primeira participação de João Falcão num festival que já existe há tanto tempo. Depois fiquei assuntando. O festival resolveu abrir com uma atração que contagiasse o público. E os coordenadores pegaram a maré e surfaram bem.

João Falcão sabe juntar como poucos um punhado de clichês que ele transforma numa cena deslumbrante. Sua linguagem é direta e poética. Umas perguntas bestas e respostas tolas com ele funcionam super bem. Isso não é defeito. É estilo. Tem isso na peça A máquina, A dona da história, nas peças lá atrás que ele fez com seu grupo recifense, como Pequenino grão de areia e Muito pelo contrário.

Dramaturgia evita conflitos

Na peça Gonzagão – A lenda o dramaturgo e encenador juntou um bando de ator bom, que canta, dança, interpreta, tem sinergia. E que confiam tanto um no outro que isso possibilita que eles se joguem no espetáculo sem medo. E isso é mais uma marca de Falcão. Além do elenco talentoso, cheio de energia, com corpo e voz disciplinados para a empreitada, com domínio cênico, o encenador contou com músicos danado de bons.

É certo que nessa dramaturgia João Falcão evita os conflitos. Como por exemplo na relação de Gonzagão e Gonzaguinha. Ele tem um olhar mais generoso e acho que prefere contar e cantar a alegria, a esperança, a possibilidade de mostrar que todos tem uma estrela. As peças do diretor que assisti sempre me deram esse conforto, creio que resultado de sua visão positiva da vida.

Além de uma trupe que incendeia o palco, de uma dramaturgia que agrada ao grande público, das músicas bem tocadas e cantadas, de atores cativantes, de um figurino que vem da tradição mas que puxa para o romantismo, de cenário, adereços, e luz que criam um clima para alimentar a alegria.

As pessoas ao meu lado, do outro lado, atrás, nas frisas e camarotes aplaudiram em cena aberta a cada música cantada, tocada, desafiada. (Eu só gosto de aplaudir ao final, é meu jeito). Exagero ou não isso deve ter sido muito bom para o elenco e para o diretor pernambucano que no final estava bem emocionado. Ser acarinhado assim em sua terra. Isso não tem preço (E isso é um clichê!!! Mas tá valendo).

Na saída do teatro, outra fila já estava formada para a segunda sessão. Dos que já tinham visto, muita gente comemorando. Poucos, muito poucos, enciumados, invejosos, torcendo contra. Acontece nos melhores lugares. Deve ter gente que não gostou. Normal. Gonzagão – A lenda é um espetáculo para divertir e toca mais quem gosta das músicas de Luiz Gonzaga e menos das de Madonna. Ou quem uma memória afetiva dessas músicas. Eu gostei muito. ACho que cumpriu a função de abrir um festival que quer agradar o Recife num final de gestão.

Foram duas sessões lotadas. Grupo voltou ontem mesmo para o Rio, onde seguem em temporada

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Nelson Rodrigues e as propostas para este milênio na Fliporto

Geneton Moraes Neto conversa com Heloísa Seixas e Ruy Castro. Foto: Beto Figueiroa

A homenagem a Nelson Rodrigues rendeu mesas muito interessantes na 8ª edição da Festa Literária Internacional de Pernambuco – Fliporto, que terminou no último domingo em Olinda. Perdi duas das mais esperadas – com o filho do dramaturgo, Nelson Rodrigues Filho, na sexta-feira; e com as filhas Sônia e Maria Lúcia, no domingo pela manhã. (Quem viu essas??? Compartilha as impressões nos comentários!)

No sábado, a tenda do Congresso Literário ficou bem cheia pra mesa com Ruy Castro e Heloísa Seixas, mediada pelo jornalista Geneton Moraes Neto. E aí, numa feira literária, as palavras fazem toda diferença. Muita gente (inclusive a pessoa que vos escreve) saiu meio frustrada. Não é que a mesa não tenha sido interessante; mas as perguntas da plateia geralmente apimentam o debate. Só que na programação dizia: “Ruy Castro e Heloísa Seixas ‘conversam’ com Geneton Moraes Neto”. A plateia até fez perguntas…mas elas não rolaram. (E Geneton nem entra na série #mediadoressemnoção. Alguns deixavam a plateia boaquiaberta com algumas pérolas! Uma arte essa a da mediação!)

Ruy Castro falou sobre a feitura da biografia de Nelson. Uma obra que tanto nos aproxima do pernambucano. Que faz com que a gente (mais uma vez, euzinha mesmo) quase não se perdoe por não ter nascido um pouquinho antes…pra ter tido a chance de conhecer, entrevistar, conversar, encontrar no bar esse gênio que era Nelson – mesmo diante da banalização dessa palavra.

Ruy começou contando que aprendeu a ler com Nelson Rodrigues. “Foi aos quatro anos, com minha mãe lendo para mim A vida como ela é, publicada no Última hora. Quando ela viu, eu estava juntando as letras”, contou. Disse ainda o quanto Nelson andava esquecido antes da publicação do livro. Foram a admiração e a curiosidade que impulsionaram o biógrafo. Ruy chegava às livrarias e os atendentes nem sabiam quem era Nelson. Nos sebos, os senhorzinhos diziam logo que não tinham os livros; quando o escritor insistiu, foi pra uma lista enorme de espera, num caderno de páginas amareladas.

Heloísa lembrou que certo dia Ruy a levou para uma conversa com as irmãs de Nelson. A bem da verdade, queria que ela ficasse lá entretendo as irmãs enquanto ele mergulhava nos documentos, fotos, papeis que elas tinham e não emprestavam de jeito nenhum. “Eu me vi transportada para uma peça do Nelson. Aqueles móveis de madeira escura, as cortinas de veludo”. As irmãs lembrariam as tias da peça Doroteia. E falariam dos irmãos e especificamente de Nelson com os olhinhos brilhando; até com certa sensualidade. (No dia seguinte encontrei com duas senhorinhas que tinham visto essa mesa e a das filhas de Nelson. O comentário era: ‘que absurdo! Ele falou de sensualidade das irmãs. Mas Nelson ficou doente várias vezes! E eram as irmãs que cuidavam dele!’).

Tantos as irmãs quanto Dona Elza, a primeira esposa, teriam ficado chateadas com alguns trechos da biografia, conta o próprio Ruy. Dona Elza teria voltado atrás, mas as irmãs morreram ainda arretadas com Ruy.

Geneton contou sobre a entrevista que fez com Nelson. O dramaturgo marcou na mesma hora de um jogo da seleção brasileira. E lá pelas tantas perguntou com quem o Brasil tinha jogado!

Luiz Reis, José Castello e Antonio Cadengue. Foto: Pollyanna Diniz

Nelson em cena – Outra mesa muito interessante, embora com pouco público, foi realizada no início da tarde do domingo: com o jornalista e escritor José Castello, o diretor e professor Antonio Cadengue e mediação do professor e dramaturgo Luis Reis. Castello fez logo a confissão. É Fluminense por causa de Nelson. “Eu sou um torcedor literário”, brincou. E trouxe uma ótima sacada. A partir do livro Seis propostas para o próximo milênio, de Ítalo Calvino, Castello elencou as ‘Seis propostas para este milênio’, tomando as crônicas de Nelson como guia. Seriam elas: imaginação, modéstia, obsessão, amizade, serenidade e transcendência.

Já Cadengue fez uma homenagem a Sábato Magaldi, que foi o seu orientador no mestrado e no doutorado, talvez o maior especialista em Nelson. Falou desde a classificação das peças teatrais até os avanços que Nelson propôs em cena, a relação com os diretores, as montagens de Antunes Filho; e peças dirigidas pelo próprio Cadengue, como Viúva, porém honesta, com o grupo Vivencial; e Senhora dos Afogados, com a companhia Teatro de Seraphim.

Ruy Castro – biógrafo e vilão?! Foto: Beto Figueirôa

Polêmica – Voltando à mesa que perdi, com as filhas de Nelson Rodrigues, o que ouvi de algumas pessoas é que elas negaram a versão de Ruy Castro na biografia O anjo pornográfico. Sônia, Maria Lúcia e Paulo César são filhos de Yolanda, que era secretária de um radialista da então rádio Mayrink Veiga, e se envolveu com Nelson na década de 1950.

Um trecho do livro diz: “Em 1967, Nelson foi procurado no Jornal dos Sports por uma menina que se dizia sua filha: Maria Lúcia, filha de Yolanda, a ‘ardente canarina’ com quem ele tivera um longo ‘caso’ nos anos 50. Maria Lúcia tinha agora 14 anos. (Quando Nelson a vira pela última vez, ela tinha quatro anos). A menina falou-lhe de seus dois irmãos. Sônia, de doze anos, e Paulo César, de dez. Durante todo aquele tempo tinham se mantido afastados porque sua mãe os proibira de vê-lo. Mas agora estavam em dificuldades: a mãe se ‘ausentara’, precisavam que lhe desse uma pensão.

Nelson não gostou do que ouviu. Admitia que o garoto fosse seu, mas nunca tivera certeza quanto às meninas. Maria Lúcia alegou que tinham certidões de nascimento, que Nelson os reconhera como filhos. Nelson negou que tivesse feito tal coisa”.

Mais lá na frente ainda diz: “Nelson disse várias vezes a Augustinho (irmão de Nelson): ‘Não me incomodaria de ajudar se elas não fossem tão desagradáveis e hostis. Desse jeito, é uma chantagem’.

Segundo o pessoal da Dupla Comunicação, as mesas gravadas depois serão disponibilizadas na internet. Vou ficar ligada para assim que essa estiver no ar, colocar o link por aqui!

As filhas de Nelson Rodrigues e Yolanda. Foto: Leandro Lima

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Musical de João Falcão sobre Luiz Gonzaga abre Festival Recife

Gonzagão – A lenda. Fotos: Silvana Marques/divulgação

O Festival Recife do Teatro Nacional será aberto no dia 21 de novembro com o musical Gonzagão – A lenda, que tem dramaturgia e direção de João Falcão. Serão duas sessões no mesmo dia, no Teatro de Santa Isabel. Vai ser uma passagem bastante rápida da montagem pelo Recife, já que o grupo estreou no dia 19 de outubro no Teatro Sesc Ginástico, no Rio, e ainda está em cartaz por lá.

A peça tem uma hora e meia e um total de 50 músicas na dramaturgia. O elenco é bem jovem e foi montado, em grande parte, seguindo a mesma ideia do projeto Clandestinos, com audições e oficinas.

Dois nomes do elenco são pernambucanos: Eduardo Rios, do Quadro de Cena, e Paulo de Melo, que é de Petrolina. Além deles, estão em cena Marcelo Mimoso, Alfredo Del Penho, Adren Alves, Renato Luciano, Ricca de Barros, Laila Garin e Fábio Enriquez. Uma história interessante é a de Marcelo Mimoso, que funciona como um narrador da história: ele cantava na noite e era motorista de táxi. Nunca tinha ido ao teatro. João Falcão viu o rapaz numa casa de shows na Lapa e ficou encantado.

Espetáculo faz duas sessões no dia 21, no Teatro de Santa Isabel

Ainda durante os ensaios, no mês de setembro, conversamos com o pernambucano Eduardo Rios, que tinha chegado de Londres há bem pouco tempo. Lá ele fez o primeiro ano do curso de Performance e Criação em Teatro na LISPA – London Internacional School of Performing Arts. Perguntei qual seria o personagem dele. “Não sei ainda! Já sabemos fazer vários personagens, mas João vive trocando! E ainda tem muito para aparecer”, respondeu. Duda comentou ainda a construção do texto. Era fim de setembro. “O texto ainda não terminou. É um processo interessante, de muita experimentação. O texto está sendo escrito durante os ensaios, na hora”. Com a peça, o ator decidiu adiar a volta para Londres. “É um projeto que vale muito a pena. Quero deixar que as coisas rendam, talvez circular por festivais. O próprio diretor da Lispa me orientou a ficar”.

João Falcão diz que o espetáculo não é uma biografia de Luiz Gonzaga. “É um ponto de vista mais lúdico e poético do que documental”. É uma montagem baseada não só na história de Gonzagão, a partir da efeméride do centenário, mas na obra dele, seguindo o ponto de vista de uma trupe, que fala de um distante século 20, quando um menino virou rei. Rei do Sertão, que talvez tenha virado mar.

Nessa história, por exemplo, Nazarena, o primeiro grande amor de Gonzagão foi rebatizada de Rosinha; e Odaléa, mãe de Gonzaguinha, de Morena. E ainda há um suposto encontro entre Gonzaga e Lampião. Os atores se revezam em vários personagens.

A direção musical é de Alexandre Elias (o mesmo de Tim Maia – Vale tudo). Claro que tem triângulo, zabumba, sanfona. Mas também bateria e cello, por exemplo. No time de músicos no palco estão Beto Lemos (viola e rabeca – Beto fez a trilha sonora de Divinas, da Duas Companhias), Hudson Lima (cello), Rick De La Torre (percussão) e Rafael Meninão (filho de pais nascidos em Exu) e Marcelo Guerini (Acordeon).

A ficha técnica tem ainda nomes como Duda Maia, que é pernambucana, e fez a direção de movimento e preparação corporal; Andréa Alves (direção de produção e idealização); Sérgio Marimba (cenografia e adereços), Kika Lopes (figurinos), Renato Machado (iluminação), Carol Futuro (preparação vocal e assistente de direção musical) e João Vancine (assistente de direção).

João Falcão e elenco

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A coletiva de imprensa do Festival Recife do Teatro Nacional só será na próxima terça-feira (13), ao meio-dia, na churrascaria Boi e Brasa, no Pina. Geralmente a coletiva era realizada no Teatro Hermilo Borba Filho…

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Este ano, o festival – que comemora 15 edições -, vai de 21 de novembro a 2 de dezembro.

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Depois de muita coisa no meio do caminho, a curadoria do festival ficou com Lúcia Machado. Simone Figueiredo, secretária de Cultura do Recife, e André Brasileiro, presidente da Fundação de Cultura, assumiram a dianteira – são os coordenadores do festival.

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Já estamos sabendo de mais novidades! Em breve, novos posts!!! E aí? Gostaram da escolha de Gonzagão?! Segue o teaser do espetáculo:

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Pense em Nelson!

O implacável Nelson Rodrigues. Foto Carlos/Cedoc/ Funarte

Desde o início de 2012 e com mais furor durante este mês de agosto, iniciativas de várias frentes, mídia e editoras de livros celebram o centenário do dramaturgo, jornalista e escritor Nelson Rodrigues, com exposições multimídia, remontagens de suas peças e matérias, relançamento de obras e especiais nos jornais, revistas, rádio e televisão.  O autor de frases intrigantes, inclusive de que “Toda unanimidade é burra. Quem pensa com a unanimidade não precisa pensar” é alçado a posto de intelectual imprescindível para o entendimento do povo brasileiro, seja a partir de suas peças, crônicas, contos e outros textos.

Nelson Rodrigues nasceu no Recife há 100 anos, no dia 23 de agosto.

Ele morreu há 32 anos e nos deixou histórias ousadas, que são ressiginificadas neste século 21.  Sua vida foi marcada por tragédias pessoais, desde a morte do seu irmão Roberto, assassinado em sua frente, na redação de jornal do seu pai. Até sofrer com o empobrecimento da família, passando fome e adquirindo doenças (como a tuberculose). E a incompreensão de muitos, a pecha de reacionário, a tortura de seu filho Nelson Rodrigues Filho.

A morte de seu irmão Roberto causou-lhe um profundo horror ao assassinato. “Este horror é tanto que entre ser vítima ou assassino, prefiro ser vítima. A assassina foi absolvida e as pessoas aplaudiram como se estivessem em um programa de auditório. A partir deste instante, formei a convicção de que a opinião pública é uma débil mental”.

Quando à história de ser reaça, Nelson bradou que devotava à direita o mesmo horror que tinha pela esquerda. “O meu filho Nelson Rodrigues Filho foi torturado. Tive relações pessoais com o presidente Médici. Perguntei ao presidente se permitiria a meu filho, que vivia na clandestinidade, deixar o país. Mas o Nelsinho disse que só aceitaria o benefício se atingisse os seus companheiros”.

Tachado de pornográfico, Nelson também não aceitou o rótulo. “Não sou pornográfico. Pelo contrário, me chame de moralista. O único lugar onde o homem sofre e paga pelos pecados é em minhas peças. Numa época em que a maioria se comporta sexualmente como vira-latas, eu transformo um simples beijo numa abjeção eterna. Se há um brasileiro maníaco pela pureza, esse brasileiro sou eu”, comentou certa vez.

O gênio de Nelson ocupou as páginas da imprensa carioca durante várias décadas. Seu ritmo de produção era intenso. Além da seção diária de A vida como ela é…, ele escreveu as peças, crônicas de futebol e colunas esportivas para Última Hora, Jornal dos Sports e Manchete Esportiva… confissões, crônicas de costumes, contos e até seções de consultório sentimental, sob pseudônimos. Costumava dizer que trabalhava mais que um remador de Ben-Hur (filme clássico com Charlton Heston). Sonia Rodrigues, filha de Nelson, destaca que “A redação era o seu laboratório; as manchetes, um estímulo para a sua imaginação. A obrigação de escrever todos os dias o cansava, mas também dava terreno para que ele não parasse”.

Mas uma das facetas mais brilhantes desse provocador, polemista, inconformista, audacioso, contundente e inconveniente Nelson era que ele pensava por si mesmo. Um franco-atirador. Sonia acredita que na imprensa atual não há espaço para uma individualidade tão forte. “As pessoas estão certinhas, não tenho conhecimento de ninguém, no atual panorama brasileiro, que tenha coragem de esticar a corda como ele. Porque, para esticar a corda, é preciso assumir o risco da completa solidão”.

Um gênio chamado Nelson Rodrigues. Foto Carlos/Cedoc/ Funarte

100 Frases de Nelson para refletir. Concordar. Discordar. Testar a atualidade de cada uma delas…

Ou invente você mesmo o que fazer com essas palavras que chocaram, exaltaram, denegriram, provocaram…

“Deus está nas coincidências”.

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“Se há um brasileiro maníaco pela pureza,esse brasileiro sou eu”

“Só o inimigo não trai nunca”.

“Se todos conhecessem a intimidade sexual uns dos outros, ninguém cumprimentaria ninguém”

“Nem todas mulheres gostam de apanhar, só as normais”.

“Não se apresse em perdoar. A misericórdia também corrompe”.

“Três anos em uma editoria de polícia de um jornal pode formar um Balzac”.

“O pudor é a mais afrodisíaca das virtudes”.

“Só o cinismo redime um casamento. É preciso muito cinismo para que um casal chegue às bodas de prata”.

“A prostituta só enlouquece excepcionalmente. A mulher honesta, sim, é que, devorada pelos próprios escrúpulos, está sempre no limite, na implacável fronteira”.

“O dinheiro compra até o amor verdadeiro”.


“Muitas vezes é a falta de caráter que decide uma partida. Não se faz literatura, política e futebol com bons sentimentos…”

“O jovem tem todos os defeitos do adulto e mais um: o da inexperiência”.

“O brasileiro, quando não é canalha na véspera, é canalha no dia seguinte”.

“As grandes convivências estão a um milímetro do tédio”.

“O brasileiro não está preparado para ser o maior do mundo em coisa nenhuma. Ser o maior do mundo em qualquer coisa, mesmo em cuspe à distância, implica uma grave, pesada e sufocante responsabilidade”.


“Toda autocrítica tem a imodéstia de um necrológio redigido pelo próprio defunto”.


“A liberdade é mais importante do que o pão”.


“O artista tem que ser gênio para alguns e imbecil para outros. Se puder ser imbecil para todos, melhor ainda”.

“Só o rosto é indecente. Do pescoço para baixo, podia-se andar nu”.

“A plateia só é respeitosa quando não está a entender nada”.

“Qualquer indivíduo é mais importante do que a Via Láctea”.

“A grande vaia é mil vezes mais forte, mais poderosa, mais nobre do que a grande apoteose. Os admiradores corrompem”.

“O amor entre marido e mulher é uma grossa bandalheira. É abjeto que um homem deseje a mãe de seus próprios filhos”.

“Todo ginecologista devia ser casto. O ginecologista devia andar com batina, sandálias e coroinha na cabeça. Como um São Francisco de Assis, com luva de borracha e um passarinho em cada ombro”.


“Os homens mentiriam menos se as mulheres fizessem menos perguntas”.


“Na mulher interessante a beleza é secundária, irrelevante e até mesmo desnecessária. A beleza morre nos primeiros quinze dias, num insuportável tédio visual. Era preciso que alguém fosse de mulher em mulher anunciando: ser bonita não interessa, seja interessante!”

“Todo amor é eterno. Se não é eterno, não era amor”.


“Qualquer menino parece, hoje, um experimentado e perverso anão de 47 anos”.

“Sem paixão não dá nem pra chupar um picolé”

“Amar é dar razão a quem não tem”.

“Se os fatos são contra mim, pior para os fatos”.


“Deus escreve certo por pernas tortas”.

“Amar é ser fiel a quem nos trai”.


“Convém não facilitar com os bons, convém não provocar os puros. Há no ser humano, e ainda nos melhores, uma série de ferocidades adormecidas. O importante é não acordá-las”.

“A beleza interessa nos primeiros quinze dias; e morre, em seguida, num insuportável tédio visual”.

“A companhia de um paulista é a pior forma de solidão”.

“Sexta-feira é o dia em que a virtude prevarica”.


“Qualquer amor há de sofrer uma perseguição assassina. Somos impotentes do sentimento e não perdoamos o amor alheio. Por isso, não deixe ninguém saber que você ama”.

“Qualquer um de nós já amou errado, já odiou errado”.


“O homem começa a morrer na sua primeira experiência sexual”

“Com sorte você atravessa o mundo, sem sorte você não atravessa a rua”.


“Nada mais cretino e mais cretinizante do que a paixão política. É a única paixão sem grandeza, a única que é capaz de imbecilizar o homem”.

“Só acredito nas pessoas que ainda se ruborizam”.

“Só os profetas enxergam o óbvio”.

“Toda unanimidade é burra. Quem pensa com a unanimidade não precisa pensar”.


“Tudo passa, menos a adúltera. Nos botecos e nos velórios, na esquina e nas farmácias, há sempre alguém falando nas senhoras que traem. O amor bem-sucedido não interessa a ninguém”.

“Não reparem que eu misture os tratamentos de “tu” e “você”. Não acredito em brasileiro sem erro de concordância”.


“A televisão matou a janela”.

“Sou reacionário. Minha reação é contra tudo que não presta”.

“A cama é um móvel metafísico”.

“As vaias são os aplausos dos desanimados”.

“O ser humano é cego para os próprios defeitos. Jamais um vilão do cinema mudo proclamou-se vilão. Nem o idiota se diz idiota”.

“O brasileiro chamado de doutor treme em cima dos sapatos. Seja ele rei ou arquiteto, pau-de-arara, comerciário ou ministro, fica de lábio trêmulo e olho rútilo”.

“O amoroso é sincero até quando mente”.

“Toda mulher bonita é namorada lésbica de si mesma”.

“O homem só é feliz pelo supérfluo. No comunismo, só se tem o essencial. Que coisa abominável e ridícula!”


“Os defeitos existem dentro de nós, ativos e militantes, mas inconfessos…”

“O ‘homem de bem’ é um cadáver mal informado. Não sabe que morreu”.

“Até os canalhas envelhecem”.

“Se Euclides da Cunha fosse vivo teria preferido o Flamengo a Canudos para contar a história do povo brasileiro”.

“A adúltera é a mais pura porque está salva do desejo que apodrecia nela”.

“Começava a ter medo dos outros. Aprendia que a nossa solidão nasce da convivência humana”.


“Não há nada mais relapso do que a memória. Atrevo-me mesmo a dizer que a memória é uma vigarista, uma emérita falsificadora de fatos e de figuras”.

“O boteco é ressoante como uma concha marinha. Todas as vozes brasileiras passam por ele”.

“Existem situações em que até os idiotas perdem a modéstia”.

“Se o Fluminense jogasse no céu, eu morreria para vê-lo jogar”.


“A dúvida é autora das insônias mais cruéis. Ao passo que, inversamente, uma boa e sólida certeza vale como um barbitúrico irresistível”.

“Pode-se identificar um Tricolor entre milhares, entre milhões. Ele se distingue dos demais por uma irradiação específica e deslumbradora.”

“Tarado é toda pessoa normal pega em flagrante”.

“Criou-se uma situação realmente trágica: — ou o sujeito se submete ao idiota ou o idiota o extermina”.

“Via de regra, cada um de nós morre uma única e escassa vez. Só o ator e reincidente. O ator ou a atriz pode morrer todas as noites e duas vezes aos sábados e domingos”.

“Nada nos humilha mais do que a coragem alheia”.

“Eu me nego a acreditar que um político, mesmo o mais doce político, tenha senso moral”.

” …O homem deseja sem amar, a mulher deseja sem amor”.

“Todo tímido é candidato a um crime sexual”.

“Quem nunca desejou morrer com o ser amado nunca amou, nem sabe o que é amar”.

“O que atrapalha o brasileiro é o próprio brasileiro. Que Brasil formidável seria o Brasil se o brasileiro gostasse do brasileiro”.

“O amigo é um momento de eternidade”.


“Não me venham falar em Di Stéfano, em Puskas, em Sivori, em Suárez. Eis a singela e casta verdade: não chegam aos pés de Pelé. Quando muito, podem engraxar-lhe os sapatos, escovar-lhe o manto”.

“O Natal já foi festa, já foi um profundo gesto de amor. Hoje, o Natal é um orçamento”.

“Nossa ficção é cega para o cio nacional. Por exemplo: não há, na obra do Guimarães Rosa, uma só curra”.


“Um Garrincha transcende todos os padrões de julgamento. Estou certo de que o próprio Juízo Final há de sentir-se incompetente para opinar sobre o nosso Mané”.


“Toda coerência é, no mínimo, suspeita”.

“A maioria das pessoas imagina que o importante, no diálogo, é a palavra. Engano, e repito: – o importante é a pausa. É na pausa que duas pessoas se entendem e entram em comunhão”.

“Se Cristo, em vez de morrer na cruz, tivesse morrido de coqueluche aos quatro anos, não teria sido Cristo!”

“Só não estamos de quatro, urrando no bosque, porque o sentimento de culpa nos salva”.

“A morte de um velho amigo é uma catástrofe na memória. Todas nossas relações com o passado ficam alteradas”.


“Em 1911 ninguém bebia um copo d´água sem paixão”.

“A fome é mansa e casta. Quem não come não ama, nem odeia”.

“Em nosso século, o “grande homem” pode ser ao mesmo tempo, uma besta!”

“Não ama seu marido? Pois ame alguém, e já. Não perca tempo, minha senhora!”


“Ah, os nossos libertários! Bem os conheço, bem os conheço. Querem a própria liberdade! A dos outros, não. Que se dane a liberdade alheia. Berram contra todos os regimes de força, mas cada qual tem no bolso a sua ditadura”.


“Os heróis morrem em combate. Não dá tempo ao destino de flagrá-los na cama ou na cadeira de balanço!”

“Se eu tivesse que dar um conselho, diria aos mais jovens: – não façam literatice. O brasileiro é fascinado pelo chocalho da palavra”.

“Quero crer que certas épocas são doentes mentais. Por exemplo: – a nossa”.

“No Brasil, quem não é canalha na véspera é canalha no dia seguinte”.


“Minhas peças são obras morais. Deveriam ser encenadas na escola primária e nos seminários”.

“Não admito censura nem de Jesus Cristo”.

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