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Espetáculo Párias vale pela metade

Arion Medeiros no monólogo Sobre os males do fumo

O espetáculo Párias – Somos vários dessa espécie faz a última sessão desta temporada nesta sexta-feira, no Espaço Muda (Rua do Lima, 280, Santo Amaro).

A montagem é composta por dois textos curtos: Sobre os Males do Fumo de Anton Tchekov (1860-1904) e O Pária de August Strindberg (1849-1912).

O ator Arion Medeiros interpreta Sobre os Males do Fumo, monólogo repleto de tensões internas do protagonista, em que um homem é dominado pela mulher, sufocado pela sociedade. Trata-se de um intelectual decadente que vai dar uma palestra sobre o assunto do título, mas enquanto ela não chega, ele critica os valores que norteiam uma gente consumista e com visão estreita.

Espetáculo se despede hoje do Muda

Há muitos anos atrás, Medeiros foi dirigido com esse mesmo texto pelo saudoso Rubem Rocha Filho. A direção atual é assinada por Jorge Féo. Mas a mão de Rocha Filho está presente na montagem, ele que era um exigente diretor de ator.

Arion Medeiros consegue extrair do personagem as nuances, seja nas entonações, nos gestos desengonçados, nas intenções. Sua figura ajuda na composição desse personagem que parece o retrato do declínio humano perante a força capitalista do mundo. Sua atuação é comovente. Há brilho nos olhos e todo um gestual contido que humaniza a figura que desperta até compaixão.

Jorge Féo e Thiago França interpretam Strindberg.

O Pária tem direção assinada por Arion Medeiros e no elenco estão Jorge Féo e Thiago França. É uma das poucas peças curtas de Strindberg.

Dois homens se encontram no mesmo espaço e durante uma tempestade discutem sobre ética, moral, ganância, impunidade, justiça, dissimulação, mentira, chantagem. Até onde o ser humano é capaz de ir para salvar sua pele? Até onde ele pode descer para se dar bem? Por quanto ele é capaz de vender, roubar ou tirar a vida de outro ser humano? Essas questões são colocadas em debate com fina ironia e uma sofisticada teia que se enrola e desenrola no texto.

Eu disse, no texto de Strindberg. O problema dessa segunda parte do espetáculo é que a rica elaboração do autor … não se traduz no corpo, nos gestos, na voz, na intenção, no peso, na comunicação com a plateia.

É verdade que existe um desnível entra a atuação dos dois. Thiago França tem mais domínio da situação que escapa a Jorge Féo. Ele não convence em absolutamente nada. O andar é forçado, os gestos são inadequados, a voz não dá credibilidade. E, além disso, o texto de Strindberg exige um jogo de cumplicidade entre os atores fortíssimo, o que não acontece.

Então, no quesito atuação Párias – Somos vários dessa espécie vale só pela metade, pela primeira parte do espetáculo. A segunda é deprimente. Foi assim pelo menos para mim.

A trilha sonora original de Zé Manoel merece ser aplaudida. Ela cria os climas interessantes para o espetáculo. Ele compôs um valsinha para Sobre os Males do Fumo e fez uma pesquisa musical para a trilha que tem músicas dele próprio, de Carlos Gomes (Brasil), Astor Piazolla (Argentina) e Eduardo Mateo (Uruguai).

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