A trajetória de uma guerreira do samba
Crítica de Leci Brandão – Na Palma da Mão

Leci Brandão – Na Palma da Mão. Foto: Valmyr Ferreira

O espetáculo Leci Brandão – Na Palma da Mão é um musical biográfico que presta homenagem à vida e à obra de Leci Brandão, uma das mais influentes cantoras e compositoras do samba brasileiro. Nascida no Rio de Janeiro, Leci rompeu barreiras ao se tornar a primeira mulher a integrar a prestigiosa ala de compositores da Mangueira, afirmando-se como uma artista engajada que sempre utilizou sua música como instrumento de denúncia e resistência, abordando temas como desigualdades sociais, racismo, violências de gênero e conservadorismo.

A montagem revisita a trajetória de Leci desde suas origens humildes na periferia carioca até sua consagração como uma das vozes mais potentes e respeitadas da música popular brasileira, destacando a relação profunda e transformadora com sua mãe, Dona Lecy, figura fundamental em sua formação como mulher, artista e cidadã.

A importância cultural e política de Leci Brandão – Na Palma da Mão se manifesta em diversas camadas. Inicialmente, o musical se insere em um movimento crescente de produções que valorizam a presença de narrativas e profissionais negros nos palcos brasileiros, contribuindo para a diversificação e a democratização do teatro musical no país. Além disso, ao abordar a história de Leci, o espetáculo ilumina o pioneirismo de uma mulher negra que rompeu barreiras e ocupou espaços de poder em uma sociedade marcada pelo racismo e pelo machismo, tornando-se um símbolo de resistência e empoderamento.

A peça cita en passant a coragem de Leci em afirmar publicamente sua identidade lésbica ainda nos anos 1970, período de intensa repressão e conservadorismo. Embora o recorte dramatúrgico e de direção se concentre na relação de Leci com sua mãe, Dona Lecy, explorando os laços afetivos, os aprendizados e as trocas entre essas duas mulheres e suas lutas no mundo, seria fundamental abrir espaço para abordar esse aspecto essencial da trajetória de Leci Brandão.

Em um momento de avanços por visibilidade e direitos LGBTQIA+, mas também de recuos com a marcha do fascismo, seria crucial que a peça incorporasse mesmo que de forma sutil, a decisão corajosa de Leci de se afirmar como lésbica em pleno regime militar. Essa escolha não apenas presta um tributo mais completo à artista, como também posiciona a obra diante dos desafios atuais. Além disso, o comportamento destemido de Leci Brandão ecoou ao longo das décadas, inspirando gerações de artistas e ativistas LGBTQIA+ a lutar por seus direitos e a expressar suas identidades sem medo, deixando um legado de coragem e determinação que poderia ser celebrado e transmitido na montagem. Até porque o espetáculo ressalta o compromisso inabalável da artista em utilizar sua arte como instrumento de transformação social.

O texto do espetáculo, assinado por Leonardo Bruno, revela uma estrutura dramatúrgica que transita entre passagens narradas e diálogos vívidos entre os personagens. A narrativa segue uma temporalidade predominantemente cronológica. Essa estrutura é enriquecida pelas canções, que pontuam momentos-chave da trama. Essa construção dramatúrgica entrelaça os elementos escolhidos para compor a trajetória de Leci Brandão no palco: a música como expressão de resistência e celebração da vida; a religiosidade como fonte de sabedoria e conexão com o sagrado; e o engajamento político como compromisso ético com a transformação da realidade.

As intervenções bem-humoradas dos instrumentistas funcionam como respiros e comentários, buscando uma cumplicidade com a plateia. 

Sob a direção de Luiz Antonio Pilar, premiado com o Shell de melhor diretor, a encenação valoriza, com delicadeza e humanidade, a relação entre Leci e sua mãe, Dona Lecy, revelando a cumplicidade, o afeto e a força dos laços que unem essas duas mulheres. Pilar privilegia a música como elemento central da narrativa, entendendo o samba como instrumento de resistência, afirmação identitária e comunicação com o público. As composições de Leci são trazidas à cena como convites irresistíveis para que a plateia se integre ao espetáculo, criando uma atmosfera de alegria, celebração e partilha que evoca a energia contagiante das rodas de samba. 

Há uma sequência exaustiva de músicas,  composições que se tornaram clássicos da música popular brasileira. Sucessos como A Filha da Dona Lecy, canção autobiográfica que homenageia a mãe da artista, e Papai Vadiou, samba que retrata com sensibilidade e humor as dificuldades enfrentadas por uma família chefiada por uma mulher negra. Além de Gente Negra, um hino de afirmação da identidade e da resistência afro-brasileira, e Preferência, samba-canção que exalta a liberdade de amar sem rótulos ou preconceitos. E a antológica Zé do Caroço, uma das canções mais emblemáticas de sua carreira, que denuncia a violência policial contra as populações periféricas.

Além das composições de Leci, o espetáculo também rende homenagens a outros gigantes da música brasileira que cruzaram o caminho da artista. É o caso de Cartola, representado por Corra e Olhe o Céu, e da própria Estação Primeira de Mangueira, escola de samba que acolheu Leci como a primeira mulher em sua ala de compositores e que é lembrada pelo samba-enredo História pra Ninar Gente Grande. Mas a trilha não é suficiente para criar nuances na dramaturgia. 

Embora o espetáculo apresente inúmeras qualidades, é importante reconhecer alguns aspectos para ser pensados. Durante a apresentação realizada no Teatro do Parque, no Recife, como parte da abertura do Festival Palco Giratório, o público demonstrou entusiasmo e apreço pela montagem, aplaudindo calorosamente ao final. No entanto, a estrutura narrativa predominantemente cronológica revelou, em boa parte, uma certa monotonia, carecendo de reviravoltas ou de uma maior inventividade formal.

A opção por uma linearidade quase didática, se por um lado facilita a compreensão da trajetória de Leci Brandão, por outro acaba limitando as possibilidades de experimentação estética. Apenas citar ou não entrar nos conflitos de passagens importantes enfraquece o potencial explosivo dessa trajetória. Como exemplo, a entrada e a permanência da artista no time de compositores da Mangueira e os bastidores mais conflituosos são evitados ou apenas citados, quando poderiam ser os giros de acionamentos de potência dentro do espetáculo.

Outro ponto que merece atenção é a questão da inteligibilidade das falas em determinados momentos do espetáculo. Apesar dos atores demonstrarem grande talento vocal e interpretarem as canções com maestria, em diversas passagens dialogadas suas palavras se tornavam incompreensíveis, seja por problemas acústicos do teatro, falhas nos equipamentos de som ou mesmo pela projeção vocal insuficiente dos intérpretes.

Essa perda parcial das falas compromete a fruição plena da narrativa e dificulta o envolvimento emocional do público com a história. 

Verônica Bonfim, Sérgio Kauffmann e Tay O’Hanna. Foto: Valmyr Ferreira

O elenco, composto por Tay O’Hanna, Verônica Bonfim e Sérgio Kauffmann dão conta de todos os personagens. Tay interpreta Leci com muita personalidade, captura a força, a garra e a paixão dessa artista em cada gesto, olhar e inflexão vocal. Sua performance revela as lutas, as alegrias e as dores que moldaram esse percurso. Verônica Bonfim, por sua vez, confere à figura de Dona Lecy uma combinação tocante de doçura e determinação. Sua atuação está carregada da sabedoria e o amor dessa mãe que foi o alicerce e a inspiração constante na vida de Leci.

Sérgio Kauffmann demonstra versatilidade ao encarnar diversos personagens masculinos que cruzaram o caminho de Leci, desde o líder comunitário Zé do Caroço, compositor Cartola, o pai da cantora ou na pele de Exu.

O foco central do espetáculo é celebrar a vida e o legado de Leci Brandão, convidando os espectadores a mergulhar em seu universo pessoal e artístico de forma sensível e empática. Ao adotar essa abordagem, o musical se alinha ao conceito de “ética do cuidado”, proposto pela pesquisadora e ativista Patricia Hill Collins. Essa perspectiva valoriza a empatia, a responsabilidade e a conexão como princípios norteadores na produção e partilha de saberes e narrativas, especialmente quando se trata de histórias de mulheres negras.

Ao contar a trajetória de Leci Brandão, o espetáculo busca estabelecer uma relação de proximidade e afeto com o público, convidando-o a se reconhecer e se emocionar com as lutas, as alegrias e as conquistas dessa artista. Essa abordagem empática permite que a plateia se conecte com a humanidade de Leci, entendendo suas escolhas, seus desafios e seus triunfos a partir de uma perspectiva de cuidado e solidariedade.

Já a representação da religiosidade de matriz africana no espetáculo é um ponto que demanda reflexão. Incluir elementos da religiosidade afro-brasileira no musical é uma escolha corajosa e necessária, contribuindo para a valorização e visibilidade das tradições.

No entanto, mesmo que os envolvidos na montagem tenham um conhecimento profundo das questões religiosas, nem sempre esse entendimento é traduzido de forma plena no palco. 

Apesar das ressalvas apontadas, Leci Brandão – Na Palma da Mão permanece como um espetáculo de grande relevância e necessidade, celebrando a trajetória de uma artista fundamental para a cultura brasileira. Ao colocar no centro dos holofotes a história de uma mulher negra que enfrentou e desafiou os preconceitos e as opressões de seu tempo, o musical contribui significativamente para a construção de uma narrativa mais plural.

 

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Festival Palco Giratório
Um Panorama das Artes Cênicas no Recife

Zaratustra: uma transvaloração dos valores, uma adaptação da obra de Nietzsche. Foto: Divulgação.

Nuvem de Pássaros, do grupo grupo Movidos Dança (RN)

O Festival Palco Giratório, maior projeto de artes cênicas em circulação no país, retorna ao calendário cultural do Recife após uma década de ausência. De 16 de maio a 1º de junho, a capital pernambucana será palco de 46 montagens, vindas de diversos estados e do Distrito Federal, Com média de três apresentações por dia,  a programação abrange teatro, dança e circo, além de oficinas, debates e lançamentos de livros.

Ao analisar as sinopses dos espetáculos e a programação completa dessa sua 26ª edição é possível identificar uma série de vertentes temáticas que permeiam o festival.

As manifestações da cultura popular pernambucana ganham espaço no festival, com trabalhos como o do Mamulengo Novo Milênio, do Mestre Miro dos Bonecos, que apresenta a tradicional arte do teatro de bonecos; o Cavalo Marinho Boi Matuto Família Salustiano, uma manifestação da Zona da Mata Norte do estado; e o Caboclinho Canidé de Goiana, eleito Patrimônio Vivo de Pernambuco em 2023.

Problemas sociais e políticas são enfrentadas em espetáculos como Alguém pra Fugir Comigo, do Resta1 Coletivo de Teatro, que discute a crise ética e social através de uma narrativa não linear; Se Eu Fosse Malcolm?, dos multiartistas Eron Villar e ViBra, que traz uma performance inspirada no ativista Malcolm X, tocando em temas como racismo e desigualdade; e O Irôko, a Pedra e o Sol, do Grupo O Poste Soluções Luminosas, que conta a história de amor entre dois adolescentes quilombolas, tratando de questões como homofobia e HIV.

A ancestralidade e a identidade negra são questões pulsantes em diversos espetáculos, como Abebé, do Grupo NegraÔ (ES), que celebra os 30 anos da trupe e reflete sobre a multiplicidade do corpo preto; Adobe, solo da intérprete Luciana Caetano (GO), que parte de símbolos e elementos da cultura negra; Herança, da Cia Burlantins (MG), que busca o resgate da herança cultural afro-brasileira; e Zenaide Bezerra – Um Espetáculo para Eternizar, da Cia Fazendo Arte (PE), que homenageia a passista de frevo Zenaide Bezerra.

No âmbito do teatro para as infâncias, destacam-se espetáculos como Quatro Luas, do grupo pernambucano O Bando Coletivo de Teatro, que se inspira no universo de Federico Garcia Lorca para criar uma narrativa sobre sonhos e emoções; Mundos, do Grupo Maria Cutia (MG), que propõe uma viagem musical pela infância dos cinco continentes; e O Pequeno Príncipe, da Cênicas Cia de Repertório, que reconta o clássico de Antoine de Saint-Exupéry focando na busca pela criança interior. Esses espetáculos exploram de maneira lúdica e acessível princípios como imaginação, autoconhecimento e diversidade cultural para o público infantil.

Outros destaques da programação incluem Caosmose, do Grupo Experimental, que através da dança explora questões como a existência de corpos dissidentes e a resistência às estruturas opressoras; Circo Sciense – Do Mangue ao Picadeiro, da Trupe Circus da Escola Pernambucana de Circo, que homenageia o artista Chico Science e o Movimento Manguebeat, unindo números circenses a questões sociais; e Yerma Atemporal, da Simone Figueiredo Produções e Roda Produção Cultural, que apresenta uma versão do clássico de Federico García Lorca, discutindo temas como liberdade e desejo. Já Nuvem de Pássaros, do grupo Movidos Dança (RN), explora o comportamento social e a importância da coletividade através de uma obra coreográfica inspirada na migração dos pássaros. O espetáculo reflete sobre a sociedade e seus conflitos, buscando compreender a coletividade humana a partir da relação entre as revoadas e a convivência de diferentes espécies.

Yerma Atemporal, uma versão do clássico de Federico García Lorca, Foto: Divulgação

Caosmose, do Grupo Experimental. Foto: Rogério Alves / Divulgação

Quatro Luas. Foto: Morgana Narjara / Divulgação

Circo Science. Foto: Rogerio Alves / Divulgação

Chama a atenção a presença significativa de artistas e companhias locais, com 30 montagens de Pernambuco, das 46 do festival . Esse número pode ser interpretado como um aceno do Palco Giratório em direção à valorização da produção artística local. Essa proporção significativa de trabalhos da região sugere, à primeira vista, uma intenção de dar visibilidade e espaço para os artistas e companhias do estado.

No entanto, é importante lembrar que a representatividade numérica não é o único fator a ser considerado quando se fala em fomento e apoio à cena cultural. A curadoria e seleção dos espetáculos, por si só, não garantem necessariamente um impacto duradouro no desenvolvimento da arte local.

Além da visibilidade proporcionada pelo festival, para além dos escolhidos para circular pelo país, seria interessante observar se o Palco Giratório também se propõe a oferecer oportunidades concretas de intercâmbio, formação e crescimento para os artistas pernambucanos. Iniciativas como residências criativas, oficinas e parcerias de longo prazo, caso sejam implementadas, podem ser indicativos mais consistentes de um compromisso efetivo com a valorização da produção regional.

Pensar em ações complementares à programação principal do festival têm o potencial de fomentar o desenvolvimento da cena artística local de maneira mais profunda e duradoura.

Debates críticos sobre os espetáculos e uma oficina de dança estão previstos na programação. Além do seminário Teatro para Infâncias, estão agendadas as Rodas de Diálogos: “Estratégias de Curadoria, Intercâmbio e Difusão Cultural no Palco Giratório” e “Práticas de Desenvolvimento da Cena Local”. Essas rodas de conversa podem ser um momento de entender e estabelecer compromissos para pensar em caminhos que fortaleçam ainda mais a relação do festival com a cena artística de Pernambuco, para além da importante vitrine já proporcionada pela programação do evento.

As Rodas de Diálogos têm o potencial de aprofundar questões estratégicas para o desenvolvimento e a sustentabilidade da cena artística local. Ao discutir curadoria, intercâmbio e difusão cultural, os participantes podem trocar experiências e pensar em formas de ampliar a circulação e o alcance das produções pernambucanas para além do estado.

Assim, a presença majoritária de trabalhos locais no Palco Giratório pode ser vista como um um ponto de partida interessante, mas não deve ser tomada como prova definitiva de um apoio sólido e transformador à cena artística pernambucana. É preciso observar, para além dos números e da programação, se o festival de fato estabelece mecanismos e políticas que fomentam e fortalecem a produção local de maneira contínua e sustentável. Somente o tempo e uma análise mais aprofundada das ações e desdobramentos do evento poderão revelar esses resultados.

Amir Haddad, homenageado do festival. Foto: Divulgação

Maurício Tizumba, homenageado do Palco Giratório. Foto: Divulgação

O festival presta homenagem a dois grandes nomes das artes cênicas: Amir Haddad, renomado diretor e ator, que apresenta o espetáculo Zaratustra: uma transvaloração dos valores, uma adaptação da obra de Nietzsche; e Maurício Tizumba, cantor e diretor musical, com a peça Herança, que celebra seus 50 anos de carreira.

Os espetáculos serão apresentados em diversos espaços culturais da cidade, como o Teatro Marco Camarotti, o Teatro Capiba, o Teatro Apolo, o Teatro Hermilo Borba Filho, o Teatro Luiz Mendonça e o Teatro Santa Isabel. Algumas apresentações também acontecerão em praças públicas, como a Praça do Campo Santo.

O encerramento do Palco Giratório será no dia 1º de junho, com a apresentação do espetáculo A fábrica dos ventos, no Teatro Santa Isabel, seguido do lançamento de livros e exposição do Festival e Escola Pernambucana de Circo, no Sesc Santa Rita.

Enfim, o retorno do Palco Giratório ao Recife, após uma década, é motivo de celebração. Espera-se que o evento fortaleça a cena cultural pernambucana, que promova o intercâmbio entre artistas locais e visitantes de todo o país e que seja de fato uma ação que democratize o acesso à arte.

Programação

– 16/05 – 16h30 – Abertura – Grande encontro de Grupos de Cultura Popular – Cortejo saindo da Rua Imperatriz Teresa Cristina para Rua do Hospício até o Teatro do Parque – Gratuito 

– 16/05 – 18h30 – Mamulengo Novo Milênio do Mestre Miro dos Bonecos – Teatro do Parque – Rua do Hospício, 81 – Boa Vista – R$ 15 a R$ 30

– 16/05 – 20h – Leci Brandão – Na Palma da Mão – Teatro do Parque – Rua do Hospício, 81 – Boa Vista – R$ 15 a R$ 30 –

– 17/05 – 9h – Debate crítico: Mamulengo Novo Milênio e Leci Brandão – Na palma da Mão

– 17/05 – 15h – Quatro Luas – Teatro Marco Camarotti – R. Treze de Maio, 455 – Santo Amaro – R$ 15 a R$ 30 

– 17/05 – 16h – Cavalo Marinho Boi Matuto Família Salustiano – Praça do Campo Santo – Santo Amaro – Gratuito 

– 17/05 – 20h – Nordeste, dança e música irresistível – Teatro do Parque – Rua do Hospício, 81 – Boa Vista – R$ 15 a R$ 30 

– 18/05 – 9h – Debate crítico Quatro Luas e Cavalo Marinho Boi Matuto Família Salustiano e Nordeste, dança e música irresistível  – Sesc Santo Amaro

– 18/05 – 16h – Circo de Lois Pies – Teatro Marco Camarotti

– 18/05 – 18h – Maria Firmina dos Reis, uma voz além do tempo – Teatro Capiba

– 18/05 – 20h – Yerma Atemporal – Teatro do Parque – Rua do Hospício, 81 – Boa Vista – – – R$ 15 a R$ 30

– 19/05 – 9h – Debate crítico “Circo de Lois Pies”, “Maria Firmina dos Reis, uma voz além do tempo” e “Yerma Atemporal” – Sesc Santo Amaro

– 19/05 – 16h – Mar Acá – Mitologia Latino–Americana – Teatro Marco Camarotti

– 19/05 – 18h – O Peru do Cão Coxo – Galpão das Artes – Limoeiro – R$ 15 a R$ 30

– 19/05 – 19h – Procedimento#6 – Teatro do Parque –

– 20/05 – 9h – Debate crítico “Mar Acá”, “O Peru do Cão Coxo” e “Procedimento#6” – Livraria do Jardim – – – – –

– 20/05 – 14h – Mundos – Uma viagem musical pela infância dos cinco continentes – Teatro Marco Camarotti – 

– 20/05 – 16h30 – Seminário Teatro para as Infâncias – Faculdade Senac – –

– 20/05 – 20h – Miró: Estudo n°2 – Teatro Marco Camarotti – R. Treze de Maio, 455 – Santo Amaro – R$ 15 a R$ 30 –

– 21/05 – 9h – Debate crítico Mundos e Miró: estudo nº2 – Livraria Jardim

– 21/05 – 14h – Hélio, o balão que não consegue voar – Teatro Marco Camarotti

– 21/05 – 15h30 – Seminário Teatro para as Infâncias – Faculdade Senac

– 21/05 – 20h – Alegria dos Náufragos – Teatro Capiba – Av. Norte, Rod. Gov. Miguel Arraes de Alencar, 1190 – 50 min – R$ 15 a R$ 30 –

– 22/05 – 9h – Debate crítico sobre “Hélio, o balão que não consegue voar” e “Alegria dos Náufragos” – Livraria do Jardim

– 22/05 – 14h – Mundo – em busca do coração da terra – Teatro Marco Camarotti –

– 22/05 – 15h30 – Seminário Teatro para as Infâncias – Faculdade Senac

– 22/05 – 20h – Nuvem de Pássaro – Teatro Luiz Mendonça

– 23/05 – 9h – Debate crítico sobre “Mundo” e “Nuvens de Pássaros” – Livraria do Jardim

– 23/05 – 14h – Seu Sol, Dona Lua – Uma História de Amor – Teatro Marco Camarotti

– 23/05 – 15h30 – Seminário Teatro para as Infâncias – Faculdade Senac – – – – –

– 23/05 – 20h – O Irôko, a pedra e o sol – Teatro do Parque – – – – –

– 24/05 – 9h – Debate crítico “Seu Sol, Dona Lua – Uma História de Amor” e “O Irôko, a pedra e o sol” – Livraria do Jardim – – – – –

– 24/05 – 14h – Vento forte para água e sabão – Teatro Marco Camarotti – R. Treze de Maio, 455 – Santo Amaro – 55 min – R$ 15 a R$ 30 –

– 24/05 – 15h – Roda de Diálogos: Estratégias de Curadoria, intercâmbio, e difusão cultural no Palco Giratório – Teatro Marco Camarotti – – – – –

– 24/05 – 15h30 – Seminário Teatro para as Infâncias – Faculdade Senac – – – – –

– 24/05 – 20h – Herança – Teatro do Parque – Rua do Hospício, 81 – Boa Vista – 70 min – R$ 15 a R$ 30 –

– 25/05 – 9h – Debates Críticos sobre “Vento forte para água e sabão” e “Herança” – Livraria do Jardim – – – – –

– 25/05 – 14h – Cantigas de Fiar – Teatro Marco Camarotti – R. Treze de Maio, 455 – Santo Amaro – 50 min – R$ 15 a R$ 30 –

– 25/05 – 14h – Feirinha Criativa – Praça de Campo Santo – – – – –

– 25/05 – 15h – Caboclinho Canidé de Goiana – Praça de Campo Santo – 25 min – Gratuito

– 25/05 – 16h – Pensamento Giratório com Amir Haddad – Praça do Campo Santo –

– 25/05 – 19h – Riso interior – Teatro Capiba – Av. Norte, Rod. Gov. Miguel Arraes de Alencar, 1190 – 50 min – R$ 15 a R$ 30

– 25/05 – 20h – Alguém pra fugir comigo – Teatro do Parque – Rua do Hospício, 81 – Boa Vista – 90 min – R$ 15 a R$ 30

– 26/05 – 9h – Debate Crítico sobre “Alguém para fugir comigo”, “Cantigas de fiar” e “Riso Interior” – Sesc Santo Amaro

– 26/05 – 15h – Debate sobre os Festivais de Artes Cênicas no Brasil: práticas de desenvolvimento e desenvolvimento da cena local – Sesc Santo Amaro

– 26/05 – 16h – Zenaide Bezerra – um espetáculo para eternizar – Teatro do Parque – Rua do Hospício, 81 – Boa Vista – 50 min – R$ 15 a R$ 30 –

– 26/05 – 16h – Cabelos arrepiados – Teatro Capiba – Av. Norte, Rod. Gov. Miguel Arraes de Alencar, 1190 – 50 min – R$ 15 a R$ 30

– 26/05 – 18h – Zaratustra – uma transvaloração dos valores – Teatro Marco Camarotti – R. Treze de Maio, 455 – Santo Amaro – 90 min – R$ 15 a R$ 30

– 27/05 – 9h – Debate Crítico sobre “Cabelos Arrepiados”, “Zaratustra”, “Zenaide Bezerra: um espetáculo para eternizar” – Livraria do Jardim

– 27/05 – 14h – Oficina de Dança com o Grupo NegraÔ – Sesc Santo Amaro

– 27/05 – 16h – Aldeias – Espaço O Poste – Rua do Riachuelo, 641 – Boa Vista – 60 min – R$ 15 a R$ 30

– 27/05 – 19h – Enquanto Godot não vem – Teatro Capiba – Av. Norte, Rod. Gov. Miguel Arraes de Alencar, 1190 – 45 min – R$ 15 a R$ 30

– 27/05 – 20h – Adobe – Teatro Marco Camarotti – R. Treze de Maio, 455 – Santo Amaro – 60 min – R$ 15 a R$ 30

– 28/05 – 9h – Debate Crítico sobre “Adobe”, “Aldeias”, “Enquanto Godot não vem” – Livraria do Jardim

– 28/05 – 16h – Ne Rope – a fertilidade da nossa origem – Teatro André Filho (Fiandeiros) – Rua da Saudade, 240 – Boa Vista – 70 min – R$ 15 a R$ 30

– 28/05 – 18h – Se eu fosse Malcolm? – Teatro Capiba – Av. Norte, Rod. Gov. Miguel Arraes de Alencar, 1190 – 60 min – R$ 15 a R$ 30

– 28/05 – 20h – Abebé – O reflexo do corpo preto nos trinta anos do Grupo de Dança Afro NegraÔ – Teatro Apolo – R. do Apolo, 121 – 52 min – R$ 15 a R$ 30

– 29/05 – 9h – Debate Crítico sobre “Abebé”, “Në Rope– a fertilidade da nossa origem – Grão comum” e “Se eu fosse Malcolm?” – Sesc Santo Amaro

– 29/05 – 18h – Histórias de um Pano de Roda – Teatro Hermilo Borba Filho – Cais do Apolo, 142 – 60 min – R$ 15 a R$ 30

– 29/05 – 20h – Dama da noite – Teatro Marco Camarotti – R. Treze de Maio, 455 – Santo Amaro – 55 min – R$ 15 a R$ 30

– 29/05 – 20h – O equilibrista – Teatro Apolo – R. do Apolo, 121 – 70 min – R$ 15 a R$ 30

– 30/05 – 9h – Debate Crítico sobre “A Dama da Noite”, “Desvio”, “Histórias de um pano de roda” e “O equilibrista” – Sesc Santo Amaro

– 30/05 – 14h – Circo Sciense – do Mangue ao Picadeiro – Teatro Luiz Mendonça

– 30/05 – 16h – Arreia – Teatro Marco Camarotti – R. Treze de Maio, 455 – Santo Amaro – R$ 15 a R$ 30

– 30/05 – 20h – Eu vim da ilha – Teatro Marco Camarotti – R. Treze de Maio, 455 – Santo Amaro – 45 min – R$ 15 a R$ 30

– 31/05 – 9h – Debate Crítico sobre “Arreia”, “Circo Scienc – do mangue ao picadeiro” e “Eu vim da ilha” – Sesc Santo Amaro

– 31/05 – 14h – O Pequeno Príncipe – Teatro Luiz Mendonça – Av. Boa Viagem, S/N – Boa Viagem – 60 min – R$ 15 a R$ 30

– 31/05 – 16h – Os Títeres de Porrete: tragicomédia de Dom Cristóvão e Sinhá Rosinha – Teatro Capiba – Av. Norte, Rod. Gov. Miguel Arraes de Alencar, 1190 – 60 min – R$ 15 a R$ 30

– 31/05 – 18h – Caosmose – Espaço Rede Moinho da Ilha – Rua do Brum, 166 – 60 min – R$ 15 a R$ 30

–  31/05 – 20h – Um minuto para dizer que te amo – Teatro Marco Camarotti – R. Treze de Maio, 455 – Santo Amaro – 80 min – R$ 15 a R$ 30

– 01/06 – 9h – Debate Crítico sobre O Pequeno Príncipe, Os Títeres de Porrete, Caosmose e Um minuto para dizer que te amo – Sesc Santo Amaro

– 01/06 – 19h – A fábrica dos ventos – Teatro Santa Isabel

– 01/06 – 21h – Lançamento de livros e exposição do Festival e Escola Pernambucana de Circo – Sesc Santa Rita

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O Magiluth desnuda as engrenagens do colapso
Crítica do espetáculo Estudo Nº1: Morte e Vida

Temporada comemorativa dos 20 anos do grupo. Foto: Vitor-Pessoa

                                           Por Ivana Moura

“Não faltaram alertas. As sirenes apitaram o tempo todo. A consciência dos desastres ecológicos é antiga, viva, fundamentada, documentada, provada, mesmo desde o início da chamada ‘era industrial’ ou ‘civilização da máquina’. Não podemos dizer que não sabíamos.  Contudo, existem muitas maneiras de saber e de ignorar ao mesmo tempo”, pondera o filósofo francês Bruno Latour no seu livro Diante de Gaia: Oito Conferências sobre a Natureza no Antropoceno (Ubu Editora, 2020), um dos mais contundentes manifestos sobre as alterações climáticas que assombram nosso presente. Para Latour, vivemos um momento de profunda ruptura, em que as certezas da modernidade desmoronam diante de Gaia, essa força indomável que reage às agressões humanas e nos obriga a repensar radicalmente nossa relação com a Terra.

É nesse cenário de urgência e perplexidade que se insere Estudo Nº1: Morte e Vida, um mergulho visceral nas entranhas do nosso tempo, conduzido por um grupo de artistas-pesquisadores que se lançam no desafio de atualizar a obra de João Cabral de Melo Neto à luz das urgências do presente. Nessa travessia, o Grupo Magiluth – formado pelos atores Bruno Parmera, Erivaldo Oliveira, Giordano Castro, Mário Sergio Cabral, Lucas Torres e Pedro Wagner (que não está no elenco desta montagem) – mobiliza um arsenal de recursos cênicos e dramatúrgicos para expor as engrenagens do capitalismo global e seus impactos sobre a vida humana e o planeta. A peça está em cartaz no Teatro Arraial Ariano Suassuna como parte das comemorações dos 20 anos de trajetória da trupe recifense.

Com direção de Luiz Fernando Marques e direção musical de Rodrigo Mercadante, o Magiluth implode as fronteiras entre o teatro, a performance e a instalação para dissecar as vísceras expostas de um sistema que produz morte e desigualdade em escala mundial. No palco-mundo, os “severinos” do nosso tempo ganham carne, osso e grito: refugiados climáticos, trabalhadores precarizados, populações deslocadas pela seca, pelas guerras e pela fome.

Ao longo do espetáculo, somos chacoalhados por imagens que nos arrancam da zona de conforto e nos obrigam a encarar a realidade crua da crise que nos devora. Das enchentes que arrasaram o sul do Brasil à elevação do nível dos oceanos que ameaça engolir nações insulares como Kiribati, o Magiluth cartografa a geografia desigual dos desastres ambientais, expondo como eles atingem de forma desproporcional os mais pobres e marginalizados. Uma radiografia implacável da insustentabilidade do modelo de desenvolvimento predatório que rege nossa civilização.

Ressoa no palco as consequências da crise climática no Rio Grande do Sul, que são devastadoras: mais de 1 milhão de pessoas impactadas, mais de cem mortos e desaparecidos. Um cenário de guerra alertado pela ciência há décadas e que hoje é parte da nova (e grave) realidade do clima. Uma realidade que se impõe de forma brutal, escancarando a negligência e a ganância dos políticos abutres que historicamente trataram a questão ambiental com desprezo no Brasil.

É importante lembrar que Estudo Nº1: Morte e Vida estreou em janeiro de 2022, em um momento de grande tensão política no país, às vésperas de uma eleição presidencial decisiva. Naquele contexto, o espetáculo já trazia em suas camadas de sentido uma reflexão sobre o papel crucial do Nordeste e de seu povo na resistência democrática, como ficou evidente com a vitória de Lula sobre Bolsonaro, graças em grande parte aos votos nordestinos.

Agora, em maio de 2024, na temporada comemorativa dos 20 anos do Magiluth, as questões ambientais abordadas na peça ganham ainda mais relevância e urgência, diante da tragédia que se abateu sobre o Rio Grande do Sul.

Mas Estudo Nº1: Morte e Vida não se limita a um diagnóstico sombrio do presente. Ele é, sobretudo, um grito de alerta e convocação, que nos desafia a reimaginar radicalmente nossa relação com a natureza, com os outros seres e com o próprio sistema econômico que nos governa. Ao atualizar a obra de João Cabral à luz das urgências do nosso tempo, o Magiluth reafirma o papel da arte como trincheira de luta por um mundo mais justo e sustentável, capaz de fabular outros futuros possíveis a partir dos escombros do Antropoceno.

Essa postura implica em reconhecer que não há saídas fáceis ou individuais para a crise sistêmica que vivemos, e que precisamos construir coletivamente novas formas de existência e coexistência na Terra. Formas que passam necessariamente por uma reinvenção radical de nossa relação com os outros seres, com os ecossistemas e com os próprios limites do planeta. Uma reinvenção que exige criatividade, coragem e compromisso ético-político, para além das fórmulas prontas e das soluções de mercado.

É nesse sentido é preciso prestar atenção e dar visibilidade às histórias, práticas e modos de vida que brotam nas brechas e nas ruínas do capitalismo. Modos de vida que muitas vezes são invisibilizados ou desqualificados pelos discursos hegemônicos, mas que carregam consigo sementes de resistência e reinvenção.

Cena do canavial, trabalhador da cana dança Michael Jackson. 

Sugiro que o espetáculo do Magiluth se alinha a uma postura ético-estética de habitar as contradições do presente e de buscar saídas coletivas para a crise que nos assola. Uma postura que se traduz na própria forma fragmentária e multivocal da encenação, que recusa as narrativas lineares e totalizantes em prol de uma dramaturgia mais aberta e porosa, em condições de acolher diferentes vozes, saberes e modos de existência.

Ao mesmo tempo, ao trazer para o palco os corpos e as histórias dos “severinos” do nosso tempo – os refugiados climáticos, os trabalhadores precarizados, as populações deslocadas pela seca e pela fome -, o Magiluth parece abraçar a densidade poética desses modos de vida que resistem e reexistem nas margens do capitalismo. Modos de vida que carregam consigo não apenas o testemunho da catástrofe em curso, mas também a potência de outros mundos possíveis.

Bruno Latour no prefácio de Diante de Gaia, escrito para a edição brasileira lançada em 2020, fala que, naquele momento, o Brasil enfrentava uma verdadeira “tempestade perfeita”, com a sobreposição de múltiplas crises – sanitária, política, ecológica, moral e religiosa. Um cenário agravado pela postura negacionista e irresponsável do governo Bolsonaro, que não apenas negligenciou a gravidade da pandemia, mas também aprofundou o desmonte das políticas ambientais e o ataque aos direitos dos povos indígenas e das populações mais vulneráveis.

Na estreia de Estudo Nº1: Morte e Vida em janeiro de 2022, vivíamos em meio às incertezas de um ano eleitoral decisivo para os rumos do país. Naquele momento, a cena em que os atores entoam “olé, olé, olá, Severino, Severino” ganhava uma conotação política explícita, com o público progressista respondendo com o grito de “Lula lá”. Uma manifestação espontânea da esperança de que a eleição de Lula representasse uma inflexão no enfrentamento das crises que assolavam (e ainda assolam) o Brasil.

Passados dois anos, e com Lula novamente à frente do governo, o espetáculo ganha novas camadas de sentido em sua temporada comemorativa dos 20 anos do Magiluth. Se, por um lado, a cena do “olé, olé, olá”” perde protagonismo, por outro ela se reveste de uma dimensão histórica, como um lampejo da memória de um tempo que não podemos esquecer. Um tempo em que a própria possibilidade de vislumbrar outros futuros parecia ameaçada pela sombra do autoritarismo.

Paralelamente, as questões das migrações e da crise climática, que já estavam presentes no espetáculo desde sua estreia, ganham ainda mais relevância e urgência no contexto atual.

Mudar nossa ideia sobre a Terra, sobre a vida, sobre nós mesmos. Eis o desafio que o Magiluth nos lança, com a coragem de quem sabe que a arte não pode mais se dar ao luxo da inocência.  E é nessa travessia incerta, feita de perguntas sem resposta e de gestos de reinvenção, que o teatro se faz trincheira e semente, luto e luta, morte e vida severina. Um teatro que nos ajuda a fabular outros mundos, antes que seja tarde demais.

Serviço
Espetáculo Estudo nº1: Morte e Vida
Teatro Arraial Ariano Suassuna (Rua da Aurora, 457, Boa Vista – Recife-PE)
Dias: 9, 10, 11, 12, 16, 17, 18 e 19 de maio de 2024
Horários: Quintas, sextas e sábados, às 20h; Domingos, às 17h
R$ 60 (inteira) e R$ 30 (meia), à venda no Sympla
Classificação indicativa: 16 anos

Leia Mais. A crítica da temporada de estreia em 2022:  Ensaio nº 1: Morte e Vida. 2022.

 

Este texto integra o projeto arquipélago de fomento à crítica, com apoio da Corpo Rastreado.

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Rumos 2023-2024 seleciona 100 projetos.
Quase metade é do Nordeste

Grupo Experimental de Dança, do Recife, foi selecionado com Campo Minado. Pernambuco aprovou 11 projetos e o Nordeste ficou com 41 contemplados no total, ultrapassando o Sudeste, com 29. Foto: Rogério Alves

A 20ª edição do programa Rumos Itaú Cultural 2023-2024 selecionou 100 projetos culturais de todo o país. O Itaú Cultural divulgou o resultado hoje. Esta versão trouxe uma importante mudança em seu foco, passando a aceitar exclusivamente projetos de criação artística relacionados à arte e cultura brasileiras. Os projetos escolhidos – de 9.389 inscritos – , abrangem uma ampla gama de linguagens artísticas, das mais tradicionais às mais experimentais. Eles passaram por um longo processo de avaliação, que contou com a participação de uma comissão diversificada de várias regiões do país. A comissão de seleção final foi formada por Adriana Ferreira, Ave Terrena, Cristina Castro, Dani Nega, Divino Sobral, Jé Oliveira, Joana Mendes, Joel Zito Araújo, Juliana Jardim, Juliano Holanda e Paulo Miyada. Além dos gestores do Itaú Cultural: Anna Paula Montini, André Furtado, Galiana Brasil, Gilberto Labor, Jader Rosa, Sofia Fan, Tânia Rodrigues, Tatiana Prado e Valéria Toloi.

Nesta edição, a região Nordeste liderou em número de projetos selecionados, alcançando 41% do total, seguida pelo Sudeste com 29%, o Norte com 12%, o Sul com 9%, e o Centro-Oeste com 8%, além de uma pequena parcela de projetos (1%) oriundos de outros países. No que diz respeito à distribuição por estados, o Rio de Janeiro ficou com 13 projetos selecionados, seguido de perto pela Bahia com 12, e tanto São Paulo quanto Pernambuco com 11 projetos cada.

Entre os de Pernambuco estão propostas como Infâmia – 20 anos do Coletivo Angu de Teatro, com dramaturgia a quatro mãos de Marcelino Freire e Newton Moreno, que tem como foco as mentiras / fake news existentes na sociedade brasileira desde os tempos da colonização/ império; e Longusu Xenupre Dudu Nordestina Pe, d’O Poste Soluções Luminosas, ambos do Recife, na categoria Teatro. 

Campo Minado é uma pesquisa criativa do Grupo Experimental, do Recife, que celebra a comunidade do Ibura, destacando a arte das favelas. A obra, uma cocriação da diretora Mônica Lira e Daniel Semsobrenome, transforma um campo de futebol em palco para 22 bailarinos locais, refletindo a diversidade e riqueza cultural da área. O projeto visa não apenas exaltar a estética das comunidades, mas também incitar reflexões sobre racismo, homofobia e discriminação.

Além de A luta inglória de Vânia contra o mar (Boa Hora) de Olinda, na categoria HQ; Taumatrópio, de Djaelton Quirino, de Arcoverde e Asa Branca,  de Carchíris, do Recife, nas categorias Teatro e Artes Visuais, respectivamente.

Ainda em Pernambuco, destacam-se projetos como Sonho, um Inferninho, para desenvolvimento de Minissérie de Ficção, de Hanna Godoy, na categoria Audiovisual/Cinema. Na música, o estado é representado por Luthieria afro-pindorâmica, tecnologias ancestrais e instrumentalização eletrônica, de Thulio Xamba Xamba de Olinda e O Enigma do Frevo, de La Casa En El Aire, do Recife.

Outros estados nordestinos também se destacam com projetos que demonstram a vitalidade artística da região, como a Bahia, que conta com nove projetos selecionados, entre eles Ajeum Bó, de Vovó Cici de Salvador, na categoria Gastronomia; Zumví: Na rota das Manifestações Afro Culturais de Itaparica ao Recôncavo Baiano, de Zumví, também de Salvador, na categoria Artes Visuais; e Tinta da Bahia – romance, de Luciany Aparecida Alves Santos, igualmente da capital baiana, na categoria Literatura.

O Ceará marca presença com quatro projetos, incluindo Oniroscópio: A Máquina dos Sonhos, de Chico Henrique, de Quixeré e O Leilão, de Débora Cristina Lima dos Santos, de Fortaleza, ambos na categoria Teatro.

Cantos Sagrados kariri-xocó, da Artefatos Sagrados tk, de Porto Real do Colégio, de Alagoas. Reprodução da internet

Alagoas marca presença com projetos como Cantos Sagrados kariri-xocó, da Artefatos Sagrados tk, de Porto Real do Colégio, na categoria Música, e Trilha da Cachoeira: Uma imersão em Solos Criativos, do Museu Coleção Karandash de Arte Popular e Contemporânea, de Maceió, na categoria Artes Visuais.

Já no Maranhão, o projeto Osso é Criola Beat, da Upaon Mundo, de São Luís, na categoria Música, explora as raízes da cultura afro-maranhense.

A Paraíba comparece com projetos como Desumanização em Miniatura, do Coletivo Ser Tão Teatro, de João Pessoa, na categoria Teatro. Além de Totonho e Os Cabra – Funk de Embolada e Hip Hop do Mato, de Toroh Música & Cultura, também de João Pessoa, na categoria Música, evidenciando a fusão de gêneros musicais tradicionais e contemporâneos.

No Piauí, projetos como Flow da Caatinga, do Original Bomber Crew, de Teresina, na categoria Dança, e Marias da Terra, as palhaças agricultoras em processo de matrigestão, de Tércia Alves Ribeiro), também de Teresina, na categoria Circo, atestam a potência criativa do estado.

O projeto O Interior do Interior Da Minha Avó, de Regina Azevedo, de Natal, na categoria Literatura, representa o Rio Grande do Norte, explorando as memórias e as histórias familiares.

Já Sergipe conta com Olha pro céu, meu amor, da Aldeia Escola de Circo, de Aracaju, na categoria Circo, e Rua da Frente – o romance, de Euler Lopes Teles, também de Aracaju, na categoria Literatura.

Esses projetos evidenciam a riqueza e a diversidade cultural do Nordeste, abrangendo diferentes linguagens artísticas e temáticas relevantes para a região e para o país como um todo.

O diretor Jé Oliveira e os gestores do Itaú Cultural Valéria Toloi e Jader Rosa, da comissão de seleção. Foto: Letícia Vieira / Divulgação

Além da forte presença nordestina, a seleção do Rumos Itaú Cultural 2023-2024 contempla projetos de todas as regiões do Brasil.

Na região Norte, o Amazonas emplaca quatro projetos, entre eles Óculos de Okotô, de Keila dos Santos Serruya e Sebastião, da Ateliê 23, ambos de Manaus, nas categorias Artes Visuais e Teatro, respectivamente. O Pará também participa com projetos como Documentário Fogo No Rabo, de LH Produções, de Belém, na categoria Audiovisual/Cinema, e Um altar cheirando à oriza, com ruídos do mar, de Luciana Lemos, de Bragança, na categoria Artes Visuais.

No Centro-Oeste, o Distrito Federal se sobressai com cinco projetos, incluindo Desenvolvimento de roteiro do longa-metragem Vão das Almas, da Nada Consta Produções e Hacker Leonilia, da Fontele Studios, ambos de Brasília, nas categorias Audiovisual/Cinema. Mato Grosso também se destaca com Kamukuwaká Realidade Virtual – Um Patrimônio Arqueológico E Cultural Indígena Brasileiro, da Pirata Waura e Plantas Medicinais do Alto Xingu – Ervas Tunuly, do Pigma Wajurupa Kamayura, ambos de Canarana, nas categorias Arte e Tecnologia e Audiovisual/Cinema, respectivamente.

Na região Sudeste, São Paulo conta com 11 projetos selecionados, abrangendo diversas linguagens artísticas. Destaques incluem Batucada Tamarindo, Maurício Alves de Oliveira, na categoria Música; Madrugada no Edifício Terezinha, da (Coala Filmes, na categoria Audiovisual/Cinema; e Recolheita, da Cidade Quintal, na categoria Design, todos da capital paulista. O Rio de Janeiro figura com 13 projetos, como Ensaio sobre uma atriz que está ficando cega, da Pé de Vento, na categoria Performance, e O Cometa: performatividade transexual negra nas artes visuais, de Guilhermina Augusti da Silva Santos, na categoria Artes Visuais, ambos da cidade do Rio de Janeiro.

Minas Gerais contribui com projetos como Dos cantos para as cordas – Arranjos instrumentais para Vissungos, de Felipe Mancini, de Ouro Preto, na categoria Música, e Kakxop pahok: as crianças cegas, de Charles Bicalho, de Belo Horizonte, na categoria Audiovisual/Cinema. O Espírito Santo aparece com Recolheita, Cidade Quintal, de Vitória, na categoria Design.

Por fim, a região Sul está representada por projetos como Rainha, de Karin Serafin, de Florianópolis e Entre: Palhaçaria e Acesso, da Laço Cia. de Arte, de Jaraguá do Sul, ambos de Santa Catarina, nas categorias Dança e Teatro, respectivamente. O Paraná se destaca com Monstruosas alianças: práticas simbióticas de dança e ecologia, da Selvática Ações Artísticas, de Curitiba, na categoria Dança, e Venha ver a revoada: projeto de criação aberta de romance sobre migração brasileira no Japão, de Rafaela Tavares Kawasaki, também de Curitiba, na categoria Literatura. Já o Rio Grande do Sul está representado por projetos como IGBA AWO, do Cavalo de Ideias, de Porto Alegre, na categoria Música, e O Palhaço Morto – Máquinas Para Chorar e Sorrir, do De Pernas Pro Ar, de Canoas, na categoria Teatro.

Ao analisar a lista dos 100 projetos selecionados pelo Rumos Itaú Cultural 2023-2024, –  a partir do título, região e proponente; já que os detalhes, segundo a assessoria de imprensa, só serão disponibilizados “à medida que os projetos forem lançados” – é possível identificar uma diversidade de linguagens artísticas e temáticas abordadas.

Na categoria Arte e Tecnologia, Atlas Imaginário, Manaus, de Gabriela Bìlá, de Brasília-DF, propõe uma investigação sobre a capital amazonense por meio de recursos tecnológicos, explorando novas formas de representação e percepção do espaço urbano. Já Kamukuwaká Realidade Virtual – Um Patrimônio Arqueológico E Cultural Indígena Brasileiro, do Pirata Waura), de Canarana-MT, busca preservar e difundir o patrimônio cultural indígena através da realidade virtual.

No campo da Dança, o trabalho Monstruosas alianças: práticas simbióticas de dança e ecologia, da Selvática Ações Artísticas, de Curitiba-PR, investiga a relação entre corpo, movimento e natureza, propondo uma reflexão sobre a crise ambiental contemporânea. Rainha” (Karin Serafin), de Florianópolis-SC, explora questões de gênero e identidade por meio da linguagem da dança.

Na Literatura, Depois de mim não haverá nada, de Bárbara Pereira Mançanares, de Eunápolis-BA, aborda temas como memória, ancestralidade e resistência negra. Venha ver a revoada: projeto de criação aberta de romance sobre migração brasileira no Japão, de Rafaela Tavares Kawasaki, de Curitiba-PR, propõe uma reflexão sobre os deslocamentos humanos e a construção de identidades em contextos interculturais.

Nas Artes Visuais, O que é uma pessoa negra quando não é Deus ou miserável?, de Lais Machado, de Salvador-BA, questiona estereótipos e representações raciais por meio de uma investigação poética e conceitual. Trilha da Cachoeira: Uma imersão em Solos Criativos, do Museu Coleção Karandash de Arte Popular e Contemporânea, de Maceió-AL, propõe uma experiência imersiva que conecta arte, natureza e ancestralidade.

No Teatro, Desumanização em Miniatura, do Coletivo Ser Tão Teatro, de João Pessoa-PB, aborda questões sociais e políticas através da linguagem do teatro de animação. Forma negativa, do Gabinete 3, de Brasília-DF, investiga os limites entre realidade e ficção, explorando novas possibilidades cênicas.

A seleção dos 100 projetos pelo Rumos Itaú Cultural 2023-2024 demonstra um esforço em promover uma distribuição geográfica equilibrada, contemplando diferentes regiões do país. Esse aspecto é positivo, pois valoriza a diversidade cultural brasileira e busca descentralizar a produção artística, historicamente concentrada nos grandes centros urbanos.

Ao dar visibilidade a projetos de estados e cidades muitas vezes marginalizados no circuito artístico nacional, essa edição do Rumos contribui para o fortalecimento de cenas locais e para a descoberta de novos talentos. Essa abordagem inclusiva e plural é fundamental para a democratização do acesso à cultura e para a construção de um panorama mais representativo da arte contemporânea brasileira.

Além da questão geográfica, a seleção também parece ter valorizado pautas identitárias, trazendo para o primeiro plano projetos que abordam questões de raça, gênero, sexualidade, etnia e outras interseccionalidades. Essa escolha é relevante, pois garante protagonismo a grupos historicamente silenciados e marginalizados, permitindo que suas narrativas, experiências e perspectivas sejam compartilhadas e reconhecidas.

Para além da representatividade, é importante que os projetos selecionados tenham um caráter questionador, provocativo e transformador. A arte tem o poder de desestabilizar estruturas, romper com padrões estabelecidos e propor novas formas de pensar e agir. Nesse sentido, espera-se que, dentre as propostas contempladas, haja muitas que instiguem reflexões incômodas, que problematizem o sistema vigente e que proponham alternativas criativas e disruptivas.

Projetos que ousam experimentar linguagens, que subvertem formatos tradicionais e que criam pontes entre diferentes campos do conhecimento têm o potencial de oxigenar a cena artística e de apontar novos caminhos. Essas iniciativas são fundamentais para manter a arte viva, pulsante e conectada com as questões mais urgentes do nosso tempo.

Portanto, a seleção do Rumos Itaú Cultural 2023-2024 parece ter dado passos importantes na direção de uma maior inclusão, representatividade e descentralização da produção artística brasileira. Agora, cabe acompanhar o desenvolvimento desses projetos, torcer para que eles realizem todo o seu potencial crítico e transformador.

Projetos selecionados

01. AfroCirco: Rir, Resistir e Recriar (Oriri Agência Cultural)
Ribeirão Preto – São Paulo
Região impactada: São Paulo
Tema: Circo

02. Encantaria – teatro lambe-lambe (Tábatta Iori Thiago MEI)
Vilhena – Rondônia
Região impactada: Rondônia
Tema: Teatro

03. Ensaio sobre uma atriz que está ficando cega (Pé de Vento)
Rio de Janeiro – Rio de Janeiro
Região impactada: Rio de Janeiro
Tema: Performance

04. Oniroscópio: A Máquina dos Sonhos (CHICO HENRIQUE)
Quixeré – Ceará
Região impactada: Ceará
Tema: Teatro

05. [B]ERRANTES (ASSOCIAÇÃO GIRA MUNDO)
Macapá – Amapá
Região impactada: Amapá, Amazonas, Ceará, Paraíba, Santa Catarina, São Paulo, África do sul, Bélgica, México
Tema: Teatro

06. 2/3 de Desejo (Companhia PeQuod Teatro de Animação)
Rio de Janeiro – Rio de Janeiro
Regiões impactadas: Rio de Janeiro
Tema: Dança

07. A luta inglória de Vânia contra o mar (Boa Hora)
Olinda – Pernambuco
Região impactada: Pernambuco
Tema: HQ

08. A última temporada (Fb9 Produções)
Rio de Janeiro – Rio de Janeiro
Região impactada: Rio de Janeiro
Tema: Audiovisual/Cinema

09. ACRE NEGRO: OS PRETOS QUE FIZERAM O ACRE (Francisco Teddy Falcão)
Rio Branco – Acre
Região impactada: Acre
Tema: Audiovisual/Cinema

10. AJEUM BÓ (Vovó Cici)
Salvador – Bahia
Região impactada: Bahia
Tema: Gastronomia

11. ANTICORO (Masina Pinheiro)
Rio de Janeiro – Rio de Janeiro
Região impactada: Rio de Janeiro
Tema: Artes visuais

12. AS GAROTAS DO FANTÁSTICO NÃO FALAM (Akan Produções)
Fortaleza – Ceará
Região impactada: Ceará
Tema: Audiovisual/Cinema

13. As Queer As Fashion – Drag, Moda e criações QUEER (João Paulo Pereira Guimarães)
Valença – Bahia
Região impactada: Bahia
Tema: Moda

14. Asa Branca (Carchíris)
Paço do Lumiar – Maranhão
Região impactada: Maranhão e Piauí
Tema: Artes visuais

15. Atlas Imaginário, Manaus (Gabriela Bìlá)
Brasília – Distrito Federal
Região impactada: Amazonas e Distrito Federal
Tema: Arte e tecnologia

16. Batalha Imaginada (MAURÍCIO POKEMON)
Teresina – Piauí
Região impactada: Piauí
Tema: Artes visuais

17. Batucada Tamarindo (Maurício Alves de Oliveira 02085681409)
São Paulo – São Paulo
Região impactada: São Paulo
Tema: Música

18. CAMPO MINADO (MONICA LIRA DE QUEIROZ TRINDADE 39770494453)
Recife – Pernambuco
Região impactada: Pernambuco
Tema: Dança

19. Canções do amor e do tempo (Sanzala Cultural)
Cachoeira – Bahia
Região impactada: Bahia
Tema: Música

20. Cantos Sagrados kariri-xocó (Artefatos Sagrados tk)
Porto Real do Colégio – Alagoas
Região impactada: Alagoas
Tema: Música

21. Capa Preta (PANAN FILMES)
Maceió – Alagoas
Região impactada: Alagoas
Tema: Audiovisual/Cinema

22. CAPENGA! (Maria Estela Galvão Lapponi)
São Paulo – São Paulo
Região impactada: São Paulo
Tema: Dança

23. Corpo Liminar (Lucas Ogasawara de Oliveira)
São Vicente – São Paulo
Região impactada: São Paulo
Tema: Arte e tecnologia

24. Criação de roteiro para o filme de palhaças que viajam de bicicleta pelo Brasil (Mone Melo)
Cabo de Santo Agostinho – Pernambuco
Região impactada: Pernambuco
Tema: Audiovisual/Cinema

25. Da Macega à Makaia – abrindo caminhos na tradução do falar negro de terreiro (Ricardo de Moura)
Belo Horizonte – Minas Gerais
Região impactada: Minas Gerais
Tema: Literatura

26. De Codó a Ceilândia (Gustavo Azevedo da Silva Santos)
Brasília – Distrito Federal
Região impactada: Distrito Federal e Maranhão
Tema: Artes visuais

27. Depois de mim não haverá nada (Bárbara Pereira Mançanares)
Eunápolis – Bahia
Região impactada: Bahia, Minas Gerais e Pernambuco
Tema: Literatura

28. Desenvolvimento de roteiro do longa-metragem Vão das Almas (Nada Consta Produções)
Brasília – Distrito Federal
Região impactada: Distrito Federal
Tema: Audiovisual/Cinema

29. Desumanização em Miniatura (Coletivo Ser Tão Teatro)
João Pessoa – Paraíba
Região impactada: Paraíba
Tema: Teatro

30. DOCUMENTÁRIO “BAIAFRO: as raízes do AfroFuturismo nos anos 70” (INSTITUTO DJALMA CORREA)
Rio de Janeiro – Rio de Janeiro
Região impactada: Bahia e Rio de Janeiro
Tema: Audiovisual/Cinema

31. DOCUMENTÁRIO FOGO NO RABO (LH Produções)
Belém – Pará
Região impactada: Pará
Tema: Audiovisual/Cinema

32. Dos cantos para as cordas – Arranjos instrumentais para Vissungos (Felipe Mancini)
Ouro Preto – Minas Gerais
Região impactada: Minas Gerais
Tema: Música

33. EDSON (Matheus Macena Associação Cultural)
Rio de Janeiro – Rio de Janeiro
Região impactada: Rio de Janeiro
Tema: Teatro

34. Elefante (Mariana Alves Pereira Fernandes Machado)
São Caetano do Sul – São Paulo
Região impactada: São Paulo
Tema: Teatro

35. ELEGBAPHO – Território Afro-cênico de Celebração Negra (Zâmbia – Produções e Eventos)
Alagoinhas – Bahia
Região impactada: Bahia
Tema: Teatro

36. ENTRE: Palhaçaria e Acesso (Laço Cia. de Arte)
Jaraguá do Sul – Santa Catarina
Região impactada: Santa Catarina
Tema: Teatro

37. Esculturas crespas: o afrofuturismo cerradeiro (Maria das Neves Jardim de Deus)
Aparecida de Goiânia – Goiás
Região impactada: Goiás
Tema: Moda

38. Eu não me calo — A África nas ruas de São Paulo (Manuel Kafina)
Benguela – Benguela
Região impactada: São Paulo
Tema: Teatro

39. Flow da Caatinga (ORIGINAL BOMBER CREW)
Teresina – Piauí
Região impactada: Piauí
Tema: Dança

40. Foi um jeito de derreter (Jessica Brisola Stori)
Curitiba – Paraná
Região impactada: Paraná
Tema: Literatura

41. Forma negativa (GABINETE 3)
Brasília – Distrito Federal
Região impactada: Distrito Federal
Tema: Teatro

42. Fotomisantropia (romance epistolar gráfico) (Luisa Bruno Lopes de Abreu Lima)
Rio de Janeiro – Rio de Janeiro
Região impactada: Rio de Janeiro
Tema: Literatura

43. FRANCISCA LUIS (NAIRA NANBIWI SOARES)
Salvador – Bahia
Região impactada: Bahia
Tema: Audiovisual/Cinema

44. FRETE GRÁTIS PARA TODO O NORTE, EXCETO PARA O BRASIL (EMBUÁ PRODUTORA CULTURAL)
Boa Vista – Roraima
Região impactada: Roraima
Tema: Artes visuais

45. Geovana – Beijo Sabor Cereja (Maria Teresa Gomes)
São Paulo – São Paulo
Região impactada: São Paulo
Tema: Música

46. Hacker Leonilia (Fontele Studios)
Brasília – Distrito Federal
Região impactada: Distrito Federal
Tema: Audiovisual/Cinema

47. IGBA AWO (CAVALO DE IDEIAS)
Porto Alegre – Rio Grande do Sul
Região impactada: Rio Grande do Sul
Tema: Música

48. Ilustre Desconhecido (CAROL CONY)
Rio de Janeiro – Rio de Janeiro
Região impactada: Rio de Janeiro
Tema: Circo

49. imigração chinesa: a nova geração (Jefferina Tong)
São Paulo – São Paulo
Região impactada: Amazonas, Paraíba, Pernambuco, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e São Paulo
Tema: Artes visuais

50. Infâmia – 20 anos do Coletivo Angu de Teatro (Atos Produções Artísticas Ltda. – ME)
Recife – Pernambuco
Região impactada: Pernambuco e São Paulo
Tema: Teatro

51. Isso é Criola Beat (Upaon Mundo)
São Luís – Maranhão
Região impactada: Maranhão
Tema: Música

52. Kakxop pahok: as crianças cegas (Charles Bicalho)
Belo Horizonte – Minas Gerais
Região impactada: Minas Gerais
Tema: Audiovisual/Cinema

53. KAMUKUWAKÁ REALIDADE VIRTUAL – UM PATRIMÔNIO ARQUEOLÓGICO E CULTURAL INDÍGENA BRASILEIRO (50.913.535 Pirata Waura)
Canarana – Mato Grosso
Região impactada: Mato Grosso e Rio de Janeiro
Tema: Arte e tecnologia

54. Longusu Xenupre Dudu Nordestina Pe (O Poste Soluções Luminosas)
Recife – Pernambuco
Região impactada: Pernambuco
Tema: Teatro

55. Luthieria afro-pindorâmica, tecnologias ancestrais e instrumentalização eletrônica: pesquisa, experimentação e construção musical do grupo Orí. (Thulio Xamba Xamba)
Olinda – Pernambuco
Região impactada: Paraíba e Pernambuco
Tema: Música

56. Madrugada no Edifício Terezinha (COALA FILMES)
São Paulo – São Paulo
Região impactada: São Paulo
Tema: Audiovisual/Cinema

57. Marias da Terra, as palhaças agricultoras em processo de matrigestão (TÉRCIA MARIA ALVES RIBEIRO)
Teresina – Piauí
Região impactada: Piauí
Tema: Circo

58. MARIMBÃ ESTÁ ACONTECENDO (Marin Monteiro Maciel)
Fortaleza – Ceará
Região impactada: Ceará
Tema: Audiovisual/Cinema

59. Monstruosas alianças: práticas simbióticas de dança e ecologia (Selvática Ações Artísticas)
Curitiba – Paraná
Região impactada: Bahia, Paraná, Rio de Janeiro, Santa Catarina e São Paulo
Tema: Dança

60. Morro do Criminoso: uma história sobre heranças e diálogos (Mayara Barbosa Silva)
Campo Grande – Mato Grosso do Sul
Região impactada: Mato Grosso do Sul
Tema: HQ

61. Mundaréu (Criação de história em quadrinhos sobre impactos ambientais) (Álvaro Maia)
Palmas – Tocantins
Região impactada: Tocantins
Tema: HQ

62. Na Toca do Gambá (Leandro Paz)
Manaus – Amazonas
Região impactada: Amazonas
Tema: Teatro

63. Nação (Maria Clara Guiral)
São Paulo – São Paulo
Região impactada: São Paulo
Tema: HQ

64. O COMETA: performatividade transexual negra nas artes visuais (Guilhermina Augusti da Silva Santos)
Rio de Janeiro – Rio de Janeiro
Região impactada: Rio de Janeiro
Tema: Artes visuais

65. O DEPOIMENTO VIVO DE MANICONGO (Chica Andrade)
São Paulo – São Paulo
Região impactada: São Paulo
Tema: Audiovisual/Cinema

66. O Enigma do Frevo (LA CASA EN EL AIRE)
Recife – Pernambuco
Região impactada: Pernambuco
Tema: Música

67. O INTERIOR DO INTERIOR DA MINHA AVÓ (REGINA AZEVEDO)
Natal – Rio Grande do Norte
Região impactada: Rio Grande do Norte
Tema: Literatura

68. O JARDIM – de Denilson Baniwa (DENILSON BANIWA ESTUDIO LTDA)
Niterói – Rio de Janeiro
Região impactada: Amazonas e Rio de Janeiro
Tema: Audiovisual/Cinema

69. O Leilão (Débora Cristina Lima dos Santos 03569562379)
Fortaleza – Ceará
Região impactada: Ceará
Tema: HQ

70. O MUNDO FORA DA PEDRA (Papo Amarelo Produções Cinematográficas)
Recife – Pernambuco
Região impactada: Mato Grosso e Pernambuco
Tema: Literatura

71. O PALHAÇO MORTO – Máquinas para chorar e sorrir (De Pernas Pro Ar)
Canoas – Rio Grande do Sul
Região impactada: Rio Grande do Sul
Tema: Teatro

72. O que é uma pessoa negra quando não é Deus ou miserável? (Lais Machado)
Salvador – Bahia
Região impactada: Bahia
Tema: Artes visuais

73. O Raio que o Trava (Rafaela Maria Moreira Monteiro)
Ananindeua – Pará
Regiões impactadas: Pará
Tema: Artes visuais

74. Óculos de Okotô (Keila dos Santos Serruya)
Manaus – Amazonas
Região impactada: Amazonas
Tema: Artes visuais

75. Olha pro céu, meu amor (Aldeia Escola de Circo)
Aracaju – Sergipe
Região impactada: Sergipe
Tema: Circo

76. OPHIDIA (Wallace Ferreira)
Rio de Janeiro – Rio de Janeiro
Região impactada: Rio de Janeiro
Tema: Performance

77. Plantas Medicinais do Alto Xingu – Ervas Tunuly (Pigma Wajurupa Kamayura)
Canarana – Mato Grosso
Região impactada: Mato Grosso
Tema: Audiovisual/Cinema

78. RAINHA (Karin Serafin)
Florianópolis – Santa Catarina
Região impactada: Santa Catarina
Tema: Dança

79. Ramino, o som da natureza em transformação. (Camila Silva Ribeiro)
Rio das Ostras – Rio de Janeiro
Região impactada: Rio de Janeiro
Tema: Música

80. Recado (Paulo Roberto Guedes Bastos)
Macapá – Amapá
Região impactada: Amapá e São Paulo
Tema: Música

81. RECOLHEITA (CIDADE QUINTAL)
Vitória – Espírito Santo
Região impactada: Espírito Santo e São Paulo
Tema: Design

82. Rocha Navegável (volumes II e III) (FABIO JOSE RIOS DA COSTA)
Salvador – Bahia
Região impactada: Bahia
Tema: HQ

83. Rua da Frente – o romance (Euler Lopes Teles)
Aracaju – Sergipe
Região impactada: Sergipe
Tema: Literatura

84. Sebastião (Ateliê 23)
Manaus – Amazonas
Região impactada: Amazonas
Tema: Teatro

85. Sob o Signo Ancestral (Daniel Cesart)
Salvador – Bahia
Região impactada: Bahia
Tema: HQ

86. SONHO, UM INFERNINHO (Desenvolvimento de Minissérie de Ficção) (Hanna Godoy)
Recife – Pernambuco
Região impactada: Pernambuco
Tema: Audiovisual/Cinema

87. TAMBOA (Isaar Maria de França Santos)
Recife – Pernambuco
Região impactada: Maranhão, Minas Gerais e Pernambuco
Tema: Música

88. Taumatrópio (Djaelton Quirino dos Santos)
Arcoverde – Pernambuco
Região impactada: Pernambuco
Tema: Teatro

89. Territórios Compartilhados: Antologia Indígena em Quadrinhos (Eá Borum)
Paraty – Rio de Janeiro
Regiões impactadas: Rio de Janeiro
Tema: HQ

90. Tibungo (MAFE)
São Paulo – São Paulo
Região impactada: São Paulo
Tema: Audiovisual/Cinema

91. Tinta da Bahia – romance (Luciany Aparecida Alves Santos)
Salvador – Bahia
Região impactada: Bahia
Tema: Literatura

92. TÍTULO: Mboraí Nhe’ên – Espírito Cantar (Tainara Takua)
Uruçuca – Bahia
Região impactada: Bahia, Maranhão e Santa Catarina
Tema: Música

93. Totonho e Os Cabra – Funk de Embolada e Hip Hop do Mato (Toroh Música & Cultura)
João Pessoa – Paraíba
Região impactada: Paraíba
Tema: Música

94. Trilha da Cachoeira: Uma imersão em Solos Criativos (MUSEU COLEÇÃO KARANDASH DE ARTE POPULAR E CONTEMPORÂNEA)
Maceió – Alagoas
Região impactada: Alagoas
Tema: Artes visuais

95. Trilogia sobre a Velhice – escrita do Terceiro Livro (Dayse Torres)
Campinas – São Paulo
Região impactada: São Paulo
Tema: Literatura

96. Um altar cheirando à oriza, com ruídos do mar (LUCIANA LEMOS)
Bragança – Pará
Região impactada: Pará
Tema: Artes visuais

97. VAZANTE (CANTEIRO – CRIAÇÃO, PRODUÇÃO E PRATICAS ARTÍSTICAS)
Teresina – Piauí
Região impactada: Piauí, Rio de Janeiro e São Paulo
Tema: Dança

98. Venha ver a revoada: projeto de criação aberta de romance sobre migração brasileira no Japão (Rafaela Tavares Kawasaki)
Curitiba – Paraná
Região impactada: Paraná e Japão
Tema: Literatura

99. ZAMAK (PICADA LIVROS)
Curitiba – Paraná
Região impactada: Paraná
Tema: Artes visuais

100. Zumví: Na rota das Manifestações Afro Culturais de Itaparica ao Recôncavo Baiano (Zumví)
Salvador – Bahia
Região impactada: Bahia
Tema: Artes visuais

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Ser antirracista é um exercício constante
Crítica da peça Para Meu Amigo Branco

Reinaldo Junior e Alex Nader. Foto: Sabrina da Paz / Divulgação

Cenário branco. Foto: Sabrina da Paz

O espetáculo Para Meu Amigo Branco traça um cruzamento instigante entre racismo e o privilégio da branquitude, conceitos que se manifestam de maneiras distintas, mas estão relacionados. O sistema de desigualdade baseado na raça, discrimina, marginaliza e oprime pessoas pretas, pardas e outras, enquanto o privilégio da branquitude confere vantagens sociais, políticas e econômicas às pessoas brancas. Muitos sabemos. Poucos admitem perder os privilégios.

Numa reunião de escola de classe média alta, ou de elite, entre pais e educadores, Monsueto Ferreira (interpretado pelo ator Reinaldo Júnior), o pai da pequena Zuri de 8 anos, relata que sua filha foi vítima de racismo por um colega, tendo sido chamada pejorativamente de “negra fedorenta”. Este incidente é o ponto de partida da peça Para Meu Amigo Branco, dirigida por Rodrigo França e inspirada no livro homônimo do jornalista e ativista Manoel Soares. França e Mery Delmond assinam a adaptação do texto, que expõe com humor e verdade o racismo estrutural da sociedade brasileira.

A história desafia a visão simplista da escola que tenta enquadrar o ato de racismo como um caso de bullying, enquanto o pai da menina esforça-se para evidenciar a complexidade do preconceito racial e chamar os envolvidos à responsabilidade. Sim, porque o pequeno racista é a ponta de uma cadeia de outros conectores da mesma sintonia e a escola assume uma postura, no mínimo, omissa.

Já sabemos, ou deveríamos saber, que o racismo não é apenas um conjunto de preconceitos individuais, mas uma construção social que permeia as instituições e a cultura. Então, o racismo é uma realidade social construída que se movimenta através da linguagem, práticas institucionais e interações cotidianas. Quando um homem branco é confrontado com seu racismo, o que acontece?

Personagem André  Schneider (Alex Nader), tenta convencer o inconvencível. Foto: Sabrina da Paz / Divulgação

É muito interessante, inteligente e perspicaz como o espetáculo Para Meu Amigo Branco desvela as camadas de negação e autoengano presentes em indivíduos que não reconhecem seu próprio racismo. Existe um humor cáustico nesse procedimento de expor a dissonância cognitiva, teoria desenvolvida por Leon Festinger que esmiúça a inconsistência entre as crenças de uma pessoa e suas ações. O personagem André  Schneider (Alex Nader), pai do pequeno Júnior não consegue interpretar o mundo fora de seu próprio quadro de referência.

A escritora feminista norte-americana, ativista antirracista e acadêmica Peggy McIntosh, em seu trabalho Unpacking the Invisible Knapsack, explora o conceito de privilégio branco como uma coleção invisível de vantagens não merecidas (vamos sublinhar) que os brancos podem contar, mas que frequentemente ignoram ou não reconhecem como tal. McIntosh argumenta que o privilégio é como uma mochila invisível de provisões especiais, mapas, passaportes, códigos, vistos e ferramentas que indivíduos brancos carregam inconscientemente. Essa metáfora ilustra como o privilégio branco permeia as experiências cotidianas, afetando a percepção de si e as interações sociais sem que haja necessariamente uma consciência ativa dessas vantagens.

O personagem André  Schneider é assim. Em princípio ele se solidariza com a violência racial sofrida pela filha de Mansueto. Até descobrir que quem cometeu o crime foi seu próprio filho. As capas e máscaras começam a cair. Como num ringue em que os pais, o preto e o branco, atuam para defender suas posições. Os melhores argumentos, os mais racionais e humanos de Mansueto recebem aplausos e apoio da plateia (foi assim quando assisti).

O cenário de Clebson Prates busca sublimar os padrões de conduta da branquitude dominante e hegemônica de uma escola de elite. Para isso, ele utiliza um linóleo, a lousa e as carteiras escolares na cor branca. Ao mesmo tempo, diversos livros de autores negros estão suspensos no ar,  como os de Rodrigo França, Nei Lopes, Marilene Felinto, Mario Medeiros, Jarid Arraes, Sonia Rosa, Emicida, Mery Delmond, Elisa Lucinda, Miró, Mário de Andrade, Lázaro Ramos, entre outros.

A escolha da figurinista Marah Silva de usar cores específicas para diferenciar os personagens brancos e negros é uma estratégia visual rica para projetar as dinâmicas raciais. As figuras brancas estão vestidas de roupas em branco e as personagens negras em tons de marrom. O branco, além de associado a ideias de pureza e blábláblá, pode ser visto como uma caricatura da “folha em branco”, sugerindo uma posição de neutralidade ou até de ignorância em relação às complexidades das questões raciais. Já o marrom para as personagens negras reflete uma conexão com a cor da pele, além de invocar a terra, sugerindo raízes, resistência e uma conexão com a ancestralidade.

Alguns espectadores ficam sentados nas carteiras, dispostas em formato circular, participando do conjunto da reunião. Os atores interagem com essa plateia e com o todo para questionar as violências raciais muitas vezes veladas ou minimizadas como “brincadeiras”. Aliás, alguns jogos são inseridos no espetáculo. 

AS atrizes Mery Delmond e Marya Bravo. Foto: Sabrina da Paz / Divulgação

Quando convocada para mediar o conflito, a professora Valéria Oliveira (Mery Delmond) praticamente desenha para quem ainda não entendeu que o racismo está entrelaçado nas estruturas de poder da sociedade. Ela explica a Teoria Crítica da Raça e as manifestações de privilégio racial e que a capacidade de permanecer ignorante das realidades do racismo é um luxo sustentado por estruturas de poder desiguais. Pode chegar como didático para quem já tem letramento no assunto, mas chega a ser bonita a progressão. Dizer pedagógico não é um problema, é um processo.

A jornada da professora Magda Antunes (Marya Bravo) – de técnica alienada que apoia os posicionamentos de poder dos brancos, que não se solidariza com a dor de uma criança preta e que acha possível simular pacificação em conflitos complexos – à uma tomada de consciência dos problemas profundos – é praticamente uma utopia em sua rapidez. Vale apostar na utopia, mas parece um trajeto mais intricado. Mas vamos confiar trabalhando por mudanças. 

De todo modo, reconhecer os emaranhados dessas dinâmicas é um passo crucial para desmontar as estruturas de poder que perpetuam as desigualdades raciais. Essa produção teatral vibrante e dinâmica faz a sua parte.

Desejo que Para Meu Amigo Branco, com suas performances impactantes e sua narrativa crítica e antirracista, corra o Brasil e frequente muitos lugares para sacodir as ordens injustas estabelecidas. 

Reinaldo Junior interpreta o pai dedicado que defende sua filha do racismo. Sabrina da Paz / Divulgação

 

FICHA TÉCNICA

Para Meu Amigo Branco
Inspirado no livro de Manoel Soares
Texto: Rodrigo França e Mery Delmond
Direção: Rodrigo França
Elenco: Reinaldo Junior e Alex Nader
Atrizes convidadas: Stella Maria Rodrigues, Mery Delmond e Marya Bravo
Direção de movimento: Tainara Cerqueira
Cenário: Clebson Prates
Figurino: Marah Silva
Iluminação: Pedro Carneiro
Trilha sonora original: Dani Nega
Consultoria pedagógica: Clarissa Brito
Consultoria de representações raciais e de gênero: Deborah Medeiros
Fotografia: Afroafeto por Gabriella Maria, Sabrina da Paz e Agátha Flora
Identidade visual: Nós Comunicações
Assessoria de imprensa: Canal Aberto — Márcia Marques, Daniele Valério e Marina Franco
Operação de som: Hugo Charret
Operação de luz: Lucas da Silva
Assistência de produção: Ludimila D´Angelis e Eduardo Rio
Produção executiva: Júlia Ribeiro
Contabilidade: Cristiano Geraldo Costa dos Santos
Idealização e direção de produção: João Bernardo Caldeira
Produção: São Bernardo

Este texto integra o projeto arquipélago de fomento à crítica, com apoio da Corpo Rastreado.

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