O enredo de A gaiola das loucas tinha um componente explosivo quando foi escrita por Jean Poiret e estreou em 1973, no Théâtre du Palais Serrault, em Paris. Trazia a carga crítica contra a hipocrisia. A peça fez tanto sucesso que cinco anos depois foi levada às telas numa produção franco-italiana.
Albin e Georges são casados há mais de duas décadas. Eles mantêm A gaiola das loucas – “a jóia e o orgulho de St. Tropez” – que tem como estrela Zazá, o Albin travestido no cabaré, dirigido por Georges. A gaiola das loucas é famosa pelos seus shows de transformistas.
Tudo está naquela pasmaceira que o tempo instala, quando Laurent, de 24 anos, fruto de um breve caso de Georges com uma corista do Lido de Paris, surge para comunicar que vai se casar com Anne. Isso já seria motivo para abalar as estruturas da casa. Mas o mais grave é que a moça é filha única de Édouard Dindon, presidente do PFTM, Partido da Família, Tradição e Moralidade, que prometeu – se eleito – varrer do mapa os homossexuais da Riviera. O político pai da noiva quer conhecer a família do noivo. E isso gera uma série de confusões.
Trinta e oito anos depois aporta no Recife uma montagem carioca, em sua versão para viagem. Os 16 números musicais foram limados e Diogo Vilela não veio com o elenco. Então ficamos sem Vilela e sem as canções.
Estão lá os quiprocós para fazer rir. E Falabella comanda a brincadeira. A montagem aproxima demais a peça da linguagem da TV. E tudo é fabricado, padronizado, o que não deixa ninguém esquecer das performances do humorísticos globais Sai de baixo e Toma lá da cá.
Algo mudou no mundo desde a estreia de A gaiola das loucas. As relações homoeróticas conquistaram espaço, mas ainda brigam por respeito em qualquer lugar do planeta. Sabemos que a hipocrisia e a discriminação não evaporaram. Talvez isso faça o sucesso do texto, que exalta que “qualquer maneira de amor vale a pena”.
Falabella é um ator de potência, carismático e com domínio cênico impressionante. Mas não sai da zona de conforto. Repete os velhos truques que surtem efeito na plateia. Cai no clichê, na caricatura de si mesmo. Os outros atores seguem o mesmo caminho do estereótipo, dos lugares-comuns.
Mas o público adora a comédia fácil, o riso solto, as gags, os gestos previsíveis e as piadas surradas.
E enquanto Georges (Falabella) fala do preto, do gay, e aparentemente ri de si mesmo, a plateia é contagiada por essa onda de humor rasteiro. Quando o protagonista fala “viado não se reproduz, se alastra”, o público exercita sua pretensa superioridade nas poltronas nem tão confortáveis da Teatro da UFPE. São muitas frases de efeito, ditas com uma autoridade por Falabella, que chega a dar medo. Em “Lição de masculinidade”, ele dá uma aula do que seria um homem de verdade, que anda trincado, aperta a mão do outro com violência e tem pouca sensibilidade.
As tintas são bastante exageradas. E tudo é de um mau gosto de doer.
Mas ninguém pode negar que eles sabem jogar. O elenco – formado por, além de Miguel, Sandro Christopher (Albin), Jorge Maya (Jacó), Davi Guilherme (Lourenço), Carla Martelli (Anne Dieulafoi), Eliana Rocha (Xavière), Carlos Leça (Sr. Dieulafoi), Keila Bueno (Sra. Dieulafoi) e Gustavo Klein (Francis, Mercedes e Cagelles) mostra entrosamento e garante o alcance de suas tiradas com os microfones sem fio.
Minha gente, quem em sã consciência ainda se passa – fora os pobres jornalistas que têm que cobrir, claro! – para ver Miguel Falabella fazendo cópia nacional de musical da Broadway? Quem ainda acredita que um tal teatro comercial possa ter ‘boas intenções’ ao abordar o assunto homossexualidade? Quem ainda crê que atores que estão há décadas no ‘armário’, em função dos compromissos caretas com a imagem televisiva, possam fazer do palco um espaço de questionamento do status quo? Eu nunca!!!!!!!!
Rodrigo,
Escrevi o post para você comentar. OU numa linguagem esportiva. Levantei a bola para você cortar.
Obrigada.
bjs
ivana
O que o Falabella fez? Não me refiro ao conteúdo da peça e sim ao texto espetacular. Trouxe um pastiche do seu próprio espetáculo, que já é ruim, recheado de coisas óbvias, clichês, estereótipos, lugares comuns, apelações, humor de televisão, cenário de televisão…. Um teatro moldado com tudo o que é ultrapassado, com o que há de mais reles na arte do teatro, um teatro velho, medíocre, teatro do século passado. E o público midiota lá. Pois é, cada um come o que gosta. Eles merecem!
O que o Falabella fez com o público recifense que gosta desse tipo de espetáculo? De idiota, de otário. Público esse, que mesmo sendo ludribiado, enganado, que foi levado a comprar gato por lebre, pois o espetáculo foi vendido em cima da versão paulista e carioca, e ainda gostou do que viu no palco. Não precisa dizer mais nada! Eles merecem!
Eita, eu cortei super, Ivana!
bjs
Não me presto a ir assistir um espetáculo como esse. O popularesco toma conta de uma forma ruidosa, entre gargalhadas e aplausos efusivos. Tantas possibilidades e cair numa dessas… Realmente se justifica pelo público, que comparece fiel e engrossa a dinheirama que entra no teatro comercial (pejorativamente falando). Fala-se tanto em “crise” do teatro, em formação de platéia, em diversão… Mas por que não se fala em “teatro para a consciência”?