Por trás daquela máscara de palhaço há um ser que chora, perde a paciência com o filho, faz coisas desinteligentes, mas principalmente se comove profundamente com a dor humana. Quando se caracteriza de doutor da alegria faz de tudo para diminuir ou apagar o sofrimento dos pequenos internados em hospitais públicos de São Paulo. São muitos profissionais, mas insuficientes para tanta carência de afetos.
Atuar como Doutores da Alegria parece uma nobre missão para aqueles que buscam ativar de sopro vital com o riso, os pacientes, com doses de esperança no futuro. E a trajetória é feita de vitórias felizes e vitórias tristes, quando meninos viram anjos.
No espetáculo Aquele Momento Em Que… a trupe fala sobre os desafios cotidianos enfrentados por esses profissionais, que labutam na saúde pública. As tentativas de fazer o melhor no trabalho, os momentos à paisana fora do hospital. Quatro deles representam esse grupo na peça. Estão em cena os palhaços David Taiyu, Suely Andrade, Sandro Fontes e Tereza Gontijo.
A dramaturgia de Nereu Afonso expõe em pequenos quadros, quase flashs, os momentos e motivações de cada um deles. Perder óculos, se atrapalhar com pequenas atos ou como alimentar a tolerância com as birras do filho são cenas exploradas.
Não é fácil integrar os Doutores da Alegria. O contexto hospitalar que salienta que a vida está sempre por um fio, as resistências dos pequenos, as brincadeiras que exigem improvisação dependendo das respostas do outro jogador.
Na peça eles narram / mostram alguns episódios vividos por eles nos hospitais públicos onde, sabemos, há uma precariedade de equipamentos e escassez de médicos, enfermeiros. Bons palhaços que são, eles valorizam os pequenos detalhes, o jogo de corpo, alguma gag. Quase que demonstram como constroem as atividades lúdicas, mas há o truque que é segredo.
A organização Doutores da Alegria atua no Brasil há 28 anos. A peça tem essa função também de estreitar os laços com quem está fora desse circuito de hospitais, para ressaltar a dignidade do trabalho.
As mães estão sempre presentes junto aos seus filhos; alguns – poucos – pais também. Eles pensam que os homens precisam participar mais desses processos. São tantas coisas fora do lugar. Não à censura. Sim à cultura. Eles lembram. A luta é boa por uma sociedade melhor.
Apesar das manobras bem-sucedidas do humor, Aquele Momento Em Que… traz um tom de melancolia, talvez por tratar de algo tão surpreendente como a vida, que goteja. Talvez porque a tarefa é árdua ao atravessar cada porta, cada corredor, cada situação para extrair o riso e estancar a dor.
Humanos que são, esses palhaços também sentem os efeitos do desmonte da cultura, dos sofrimentos da Natureza e das ações maléficas de um grupo que ocupa o poder, das ameaças constantes à vida nesse país varonil; a vida que é o grande bem defendido por esses doutores. Mas encarar dificuldades faz parte do métier desses profissionais, que seguem espalhando dignidade no cenário dos hospitais.
Serviço:
Aquele Momento Em Que…
do Doutores Da Alegria
Quando: sexta, sábado e segunda, às 21h; domingo, às 20h. Até 30 de setembro
Onde: Galpão do Folias (Rua Ana Cintra, 213, Santa Cecília)
Quanto: Ingressos gratuitos
Capacidade: 99 lugares
Duração: 70 minutos
Classificação indicativa: 12 anos
Ficha técnica:
Direção: Val Pires
Dramaturgia: Nereu Ramos
Direção de movimento: Ronaldo Aguiar
Elenco:
Cenário: Bira Nogueira
Figurino: Cleuber Gonçalves
Assistentes de figurino: Glória Amaral, Leninha Castilho
Desenho de luz: Giuliana Cerchiari
Assistente de Iluminação: Emerson Fernandes
Trilha sonora: Leandro Simões
Coordenação de produção: Marcela Castilho
Assistente de produção: Suenne Sotero
Realização: Doutores da Alegria