Os empregados que têm chefes aos quais precisam pedir um aumento, esses seres que já incorporaram o discurso nojento da empresa, são ridículos. E risíveis. Já os que ostentam o poder de dizer sim ou não são tacanhos pensando que são superiores. E isso é matéria de um monólogo cômico, mesmo que a situação do protagonista seja desventurada.
O espetáculo A arte e a maneira de abordar seu chefe para pedir um aumento é defendido por Marco Nanini. Seu personagem aparece para dar uma palestra que versa sobre o título da peça e expõe o problema de um funcionário mediano de uma grande corporação.
O que existe de divertido na tentativa de um infeliz homem de pedir um acréscimo no seu contracheque a seu chefe imediato? Depois de mais de 30 anos de serviços prestados, o coitado praticamente não saiu do lugar. Nunca recebeu uma promoção. Mas a aposentadoria, ou o fim, se aproxima e ele cria coragem de falar com o chefe de seção.
A partir daí, começa um jogo de palavras, esquema matemático em que o personagem expõe um manual combinatório de probabilidades. O organograma intricado e pontuado de ironia mostra as chances de sucesso e fracasso na ingrata incumbência.
O público ri, então há comicidade. A plateia antevê que o infeliz não tem a menor chance de levar a melhor, ele se transforma num divertido personagem. E Nanini passa de narrador a empregado subalterno e chefe de seção com humor.
A comicidade é alcançada pelas aspirações frustradas. Ou porque o chefe está doente e morre. Ou porque ele é diminuído pelo superior e diz que ele deveria sentir orgulho de fazer parte daquele conglomerado, como uma minúscula molécula. Ou porque o chefe mais convincente o induz de que um simples aumento de salário iria mexer com a economia internacional. E garante que na próxima reunião dos executivos, vai sugerir uma medalha por serviços prestados.
Quem traduziu o texto de Georges Perec (1936-1982) para o grupo foi José Almino. No Brasil, a obra já tinha sido publicada com tradução de Bernardo Carvalho, pela Companhia das Letras, em 2010.
Não há uma narrativa clássica. As falas são repetidas, com pequenas variações. As ambições do protagonista são ridicularizadas de modos diferentes. O ridículo da situação também é uma crítica às corporações, com ironias. Mas são farpas muito discretas, que não desafiam a inteligência do espectador.
Nanini sozinho no palco é o que se espera dele, um ator de pleno domínio técnico, com um timing invejável e com inflexões vocais e gestos para garantir a diversão. Ele conta com recursos visuais (criados por Batman Zavareze), que são projeções do organograma para apresentar os prós e os contras da empreitada, que chegam às palavras sim e não.
O cenário é formado por totens com tonalidade cinza, e segundo a cenógrafa Bia Junqueira foi inspirado no design modernista dos filmes de Jacques Tati. A ágil direção é Guel Arraes.
E, como diz o personagem, …”para simplificar pois sempre é bom simplificar”, o grande Nanini pode qualquer coisa em cima do palco. Inclusive o seu stand-up.