Até o tempo resolveu testar a tenacidade dos manifestantes em prol do Teatro do Parque. Se a sexta-feira foi uma jornada esplendorosa de sol, o sábado (26) amanheceu chuvoso, ameaçador. E a pisada foi assim durante todo o dia. Chovia e parava. Mas para que servem os guarda-chuvas, capas ou até mesmo a euforia de dançar na chuva? A movimentação da Virada Cultural do Teatro do Parque foi mais suave pela manhã. As apresentações começaram na hora, apesar do aguaceiro. A garra dos organizadores e dos artistas participantes contagiou o sábado e, no começo da tarde, a Rua do Hospício já tinha virado um encontro festivo de cidadania e reivindicação dos direitos culturais.
Os “Parques” Henrique Celibi, Rural (do Som da Rural de Roger de Renor), Poético Clarice Lispector / Firmo Neto viram desfilar paixão, garra, euforia, protesto, cobrança, reivindicação em verso e prosa, musicado, falado, sentido. O público aplaudiu e abraçou a causa entre um gole e outro, entre um passo e outro.
Foi bonita a festa, que seguiu numa maratona de mais de 12 horas seguidas, com as apresentações e depoimentos espontâneos. Os antigos frequentadores do local compareceram. Depois de sete anos fechado o Teatro, estava ali de novo bulindo, dizendo que quer muitos 102 anos de vida cultural. A rua ficou cheinha de gente. Imagem linda. Figuras, figurinhas e figuraços foram em busca de memórias afetivas forjadas em sessões de cinema, música, teatro e dança. E encontraram uma raça que nunca mais tinha sido vista.
A Virada Cultural do Teatro do Parque foi uma demonstração de que a população está disposta a lutar pelos seus direitos.
A articulação do evento já havia conquistado um posicionamento da Prefeitura do Recife. A PCR anunciou no dia 22 a abertura de licitação para restauro e reformas do equipamento cultural. E a data de reabertura para julho de 2019. Não dá para comemorar porque datas e promessas já foram feitas anteriormente. O representante do Movimento Teatro do Parque Resiste Oséas Borba disse que já ouviu essa conversa outras vezes, em 2014 e em 2016.
Mas o mais importante da audiência pública realizada quinta-feira (24/08) na Câmara Municipal, numa ação proposta pelo vereador Ivan Moraes (PSOL), foi a inclusão da sociedade civil no desenvolvimento do trâmite. “Uma das intenções do movimento é ter representação na comissão que irá acompanhar todas as etapas da obra. Desde os processos licitatórios até a restauração física do prédio. Essa comissão foi uma vitória significativa da audiência pública”, pontua a produtora e atriz Simone Figueiredo, da equipe de organização da Virada Cultural. Para ela, a ação Virada Cultural foi um grito da classe artística e da sociedade civil sobre o descaso da atual gestão em estabelecer diálogo sobre a produção cultural do Recife
Outro da coordenação, o ator e diretor Claudio Ferrário já havia exposto nos seus minimanifestos do facebook: “Não permitiremos que um espaço como o Teatro do Parque desapareça pela incompetência e negligência de um poder público que despreza o valor cultural, afetivo e cidadão que um lugar como este constrói na cidade, pela cidade e por sua população”.
A cúpula das ações do Virada Parque faz hoje uma avaliação do acontecimento. “Particularmente achei um grande evento, onde tudo funcionou. Foi maravilhoso ver tanta gente produzindo e consumindo arte e cultura. Parecia um carnaval!”, comentou Diogenes D. Lima.
É simbólico que a ação tenha esse caráter festivo, do encontro, de congraçamento, da troca de afetos. Porque o Teatro do Parque significa tudo isso. E também por que a moral do brasileiro anda baixa, com as decisões autoritárias do governo golpista e um Congresso com figuras suspeitas de corrupção a avançar no confisco dos direitos do cidadão. O Recife amedrontado com a onda de violência e uma administração que vira as costas para a cultura da cidade deu uma resposta de coragem, alegria e bravura.
“Pensamos em, a partir de agora, fazer dessa Virada um evento continuado até a reabertura do Teatro do Parque”, propõe Diogenes D. Lima, que foi o idealizador / provocador da ação. “Se das outras vezes foram feitos protestos anuais (em cada aniversário do teatro) dessa vez será bimestral…trimestral… não decidimos ainda, mas o fato é que dessa vez não podemos dispersar. Vamos firmes até a reabertura!”.
A Virada foi um evento belíssimo que uniu todas as linguagens em nome de uma causa. O teatro do Parque. Parabéns pela belíssima matéria !