Magiluth, a cidade, a arte

Intervenção Para Jesus, realizada na Conde da Boa Vista. Foto: Thiago Liberdade

Intervenção Para Jesus, realizada na Conde da Boa Vista. Foto: Thiago Liberdade

No fim do ano passado, alguns integrantes do Grupo Magiluth foram levados para a Delegacia de Santo Amaro para prestar esclarecimentos. Tinham sido flagrados pelas câmeras de segurança espalhadas pelo Bairro do Recife modificando os nomes das ruas. Todas ganharam um só título: Eduardo Campos. Rua Eduardo Campos, Avenida Barão Eduardo Campos e por aí vai. Eles colavam em cima dos nomes originais um adesivo com a mesma cor e letra. Para piorar a situação com a polícia, logo que foram abordados, um dos militares se espantou: “Mas são vocês de novo?”.

Isso porque, dias antes, o ator Lucas Torres foi detido (e quase linchado pela população) depois que estourou uma lâmpada fluorescente no também ator Erivaldo Oliveira. Esse último dançava “Para Jesus” em plena Avenida Conde da Boa Vista, um dos lugares mais movimentados da cidade. A ideia da performance veio da Marcha para Jesus, passeata de evangélicos, e também de vídeos como “O Passinho do Abençoado” e “Pastora Luciana sapateia na cara do demônio”.

As duas ações foram propostas pelo Magiluth dentro do projeto Intervenções urbanas com mídias locativas, apoiado pelo Funcultura. O livro com os registros das performances do grupo será lançado nesta quinta-feira, às 19h, na Rua da Alfândega, no Bairro do Recife. Cem exemplares devem ser distribuídos gratuitamente.

Durante a realização das ações – 24 no total (algumas realizadas em duplas, quartetos, outras pelo grupo inteiro) – as ideias não eram divulgadas previamente. Poucos minutos antes das intervenções ou mesmo depois, o registro era feito através do Facebook e do Instagram.

Eles não queriam espectadores; ou, melhor, não aqueles que esperavam por uma apresentação de um grupo de teatro. “Depois de um tempo, nas ruas principalmente aqui no Centro, onde a maior parte das ações foi executada, as pessoas já nos encontravam e diziam: lá vão os azulzinhos”, brinca o ator Pedro Wagner. Era uma referência às roupas de operário que todos os atores vestiam durante as intervenções.

Intervenção Memórias do cárcere. Foto: Thiago Liberdade

Intervenção Memórias do cárcere. Foto: Thiago Liberdade

Desde o trabalho realizado com o grupo Teatro do Concreto, de Brasília, que resultou, entre outras coisas, na montagem Aquilo que o meu olhar guardou para você, o Magiluth problematiza a cidade – indo desde questões afetivas, como os lugares que mais nos trazem referências e marcam, até os dilemas da metrópole, como o caos no trânsito e o sistema de transporte. Aqui foram muito mais enfáticos e diretos e colocaram dedos nas feridas, levantando debates sobre diversos temas, desde a mercantilização da fé, o ódio entre as torcidas nos estádios de futebol, a ocupação do espaço urbano, a política que manda e desmanda, o preconceito de classe social.

Com esse projeto, todas essas intenções tomaram vulto e dimensão. Mas os atores discutiam não só a urbe – e isso já seria por demais importante -, e sim a própria arte. Operários da arte? Até que ponto essas ações eram vistas como arte pela população? É performance? Como reagir diante de uma ação artística que não tem nada previamente delimitado pela segurança de um espetáculo formal? As presenças do ator e do público, nesse caso, são mais verdadeiras ou reais?

O projeto não necessariamente vai resultar numa montagem; esse não era mesmo o objetivo. Mas questões como a ocupação da cidade e a fé estão sim na pauta de inquietações do Magiluth. Depois de circular o Brasil pelo Palco Giratório, uma das ótimas notícias neste ano de comemoração de dez anos do grupo, é esperar para ver o que os atores vão apreender dessa experiência e/ou misturar com tudo que viveram durante o projeto de intervenções, com o que estão lendo, discutindo, pensando; e, aí sim, levar ao palco convencional – ou não. No caso do Magiluth sempre existe o – “ou não”.

Serviço:
Lançamento do Livro Intervenções Urbanas com mídias locativas
Quando: hoje (13), às 19h
Onde: Rua da Alfândega, Bairro do Recife
Quanto: 100 exemplares do livro serão distribuídos gratuitamente

Capa do livro Intervenções Urbanas com mídias locativas

Capa do livro Intervenções Urbanas com mídias locativas

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1 pensou em “Magiluth, a cidade, a arte

  1. Djaelton Quirino

    O grupo de qual faço parte. Teatro de Retalhos de Arcoverde, está sempre de olho no Magiluth, pois é m grupo que inspira. Pelo conteúdo artístico, intelectual e política que semeiam em seus trabalhos. Belíssimas ações. Espero que o livro também esteja a venda em breve para que possamos adquirir. Abraço ao grupo.

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