A primeira coisa que eu teria a dizer sobre Era uma vez… Grimm é que tudo é de um profissionalismo impecável. E isso é muito bom. Os atores são ótimos e cantam muito bem. A produção funciona, os efeitos são incríveis, a música reforça que é possível outras partituras mais elaboradas para nossos ouvidos cansados de tanta bobagem. E tem a mão de Tim Rescala, que coloca elementos de ópera nesse musical.
A cenografia, de Ney Madeira, Dani Vidal e Pati Faedo, é composta de um grande livro deitado no chão com inclinação para que o fundo do palco fique mais alto, com páginas que passam digitalmente, uma cortina que separa os músicos e serve de suporte para as ilustrações de Rui de Oliveira e as projeções e animações de Renato e Ricardo Vilarouca. O clima fantástico da montagem é reforçado pelos efeitos especiais, como uma árvore que cresce, as mudanças de estações e sobreposições de roupas. Há ainda os alçapões de onde “brotam” elementos como mesas e cadeiras ou se abrem buracos que engolem objetos ou pessoas.
Os quatro atores/cantores Chiara Santoro, Janaína Azevedo, José Mauro Brant e Wladimir Pinheiro desenrolam a narrativa dos manos alemães, Jacob (1785-1863) e Wilhelm Grimm (1786-1859) eruditos e filólogos, que catalogaram belos contos para crianças. Dois narradores traçam uma breve biografia dos dois autores. E depois apresentam duas histórias: O junípero e Cinderela.
A narrativa é intercalada por falas e canções da trilha original de Tim Rescala, e foram executadas ao vivo aqui por cinco músicos da Orquestra Sinfônica do Recife, sob a batuta do ator, humorista e compositor Tim Rescala. São eles Cromácio Leão (trompa), Frederica Bougeois (flauta), João Carlos Araújo (violoncelo), Jonathan Zacarias (clarinete) e Marcos Antunes (viola).
O Junípero não é uma das narrativas mais conhecidas e traz uma trama semelhante a da Bela Adormecida, com a madrasta malvada que não suporta o enteado e termina por tirar sua vida. Há um requinte de crueldade no meio de uma série de violências e uma reviravolta surpreendente. A árvore que cresce, a neve, os bancos e mesas que surgem, e até pequenas casas enchem os olhos do espectador.
A Cinderela que conhecemos se apresenta sem fada madrinha, mas ganha a bênção dos pássaros e dos seres da floresta. Ela esnoba no seu figurino de candidata a princesa. E as disputas entre as filhas são engraçadíssimas. Essa segunda história tem mais humor e uma comunicação mais rápida com a plateia.
Os figurinos são bonitos, a iluminação revela. O clima de terror se instala. Só faço ressalva quanto ao ritmo em alguns pontos das duas histórias e gostaria de um pouco menos de biografia narrada dos escritores. Mas é um espetáculo limpo, belo, bem cantado e interpretado. Um musical brasileiro para se aplaudir.
Ficha técnica
Texto e Letras: José Mauro Brant (baseado na obra dos irmãos Grimm)
Música Original e Direção Musical: Tim Rescala
Direção: José Mauro Brant e Sueli Guerra
Supervisão: Miguel Vellinho
Elenco / vozes / personagens
José Mauro Brant – Tenor / Wilhelm Grimm, menino, irmã 1, príncipe
Wladimir Pinheiro – Barítono / Jacob Grimm, pai, irmã 2, lobo
Janaina Azevedo – Mezzo Soprano / Jeanette Hassenpflug, Dorothea Wieman e madrastas
Chiara Santoro – Soprano / Dorchen, Marlichen, Cinderela
Cenografia e figurino: Espetacular! Produções & Artes – Ney Madeira, Dani Vidal & Pati Faedo
Iluminação: Paulo César Medeiros
Desenho de som: Fernando Fortes
Animação gráfica: Renato e Ricardo Vilarouca
Ilustrações: Rui de Oliveira
Projeto Gráfico: Maurício Grecco e Úrsula de Mello