Dzi Croquettes em bandália é um musical brasileiro que joga com muitas ficções. E é tão importante que até Claudia Raia veio voando para assistir a abertura do Janeiro de Grandes Espetáculos, no Teatro de Santa Isabel, ontem, no Recife. “Vamos aplaudir Claudia Raia que está na plateia”, solicitou um dos atores. Muita gente aplaudiu o “fantasma” da atriz, que NÃO estava lá. Essa foi uma das muitas brincadeirinhas do grupo, que destilou deboche e criticidade, humor e sagacidade ao longo de quase duas horas.
Esses Dzis não poupam ninguém, nem o Papa pop da vez. Nem o gênero musical importado. Nem o jornalismo, nem a religião. Nem a caretice nossa de cada dia. Nem a deles, “porque eu também sei ser careta, de perto ninguém é normal”.
Sabemos que o documentário Dzi Croquettes, de Tatiana Issa e Raphael Alvarez, lançado há mais de três anos, recuperou a história do grupo. O filme inspirou o ator e diretor Ciro Barcelos a selecionar nove artistas entre quase 500 inscritos para trazer de volta o espírito Dzi.
É lógico que o contexto é diferente. A ditadura militar ficou para trás, a censura agora é mais econômica/financeira e a perfomance gay quase não choca ninguém. Eu disse quase.
Mas não se enganem. Essa celebração à trupe de Lennie Dale (coreógrafo) é mais que justa. E necessária. O fenômeno Dzi Croquettes ocorreu há 40 anos. Abalou estruturas. Derrubou barreiras. A montagem de hoje tem muitos alcances. Histórico, na esteira do próprio grupo. Festivo. Com coragem e entrega dos atores que misturam tons de brasilidades, latinidades, africanidades, tropicalidades e dades.
Um grupo de atores – Pedro Valério, Leandro Melo, Franco Kuster, Thadeu Torres, Cleiton Morais, Udylê Prócopio, Sonny Duque, Kiko Guarabyra e Kostya Biriuk – decidem seguir a filosofia dos Dzi numa experiência teatral, sob a batuta de um remanescente (Barcelos). E criam números que reverenciam o passado no cabaré Dzi, com tango, bolero, rap, passando por Carmen Miranda, Charles Chaplin e pelo teatro rebolado.
A potente direção musical é de Demétrio Gil. A trilha inclui composições do autor, mas também passa por sucessos de Titãs e Mamonas Assassinas.
Além de Ciro Barcelos, que dá show de vitalidade, dança, canta, interpreta, orquestra como um maestro essa encenação, expõe na projeção de imagens de Lennie Dale as pegadas da época. É impressionante a força desse homem de teatro. E é uma alegria aplaudir seu sapateado, seu tango, seu bailado.
Outro integrante da trupe original, Bayard Tonelli faz uma participação especial e é comovente sua interpretação do poema que fez para seus pares, a maioria que já se foi: “Borboletas sangram / sofrem choram / E se desesperam // Mas nunca desistem de voar”?
Ninguém espere que essa máquina do tempo recupere TODA a magia do fenômeno Dzi Croquettes dos anos 1970. Até porque o passado tem uma aura especial, da memória. Mas a trupe investe na irreverência, no escracho, no clima underground.
O forte apelo erótico e visual transpira de corpos bem treinados. Os números estão carregados de humor e androginia e ostentam um invejável vigor físico. A direção extrai e valoriza a versatilidade do elenco que dança, canta e sapateia. As coreografias mesclam as que foram criadas por Dale com outras inventadas por Ciro. Detaque para Leandro Mello cantando Elis Regina.
Os figurinos de Claudio Tovar são lindos. E as trocas de roupa funcionam bem. A iluminação de Aurélio Simoni garante todo o clima. A cenografia de Pedro Valério é bem transada de uma garagem de ensaios cheia de detalhes.
Não há grandes novidades na linha dramatúrgica da montagem e alguns quadros parecem conhecidos e os bastidores expõem o universo de intriga de egos. Mas mesmo com qualquer “já visto” é engraçado e pertinente.
Grupos como os Dzi Croquettes precisam estar ativos para acionar terminações nervosas. Há uma outra marcha em andamento, que reduz e limita o ser humano, que o quer enquadrado. Pensamentos e pessoas que são uma marcha-ré esses meninos combatem com vigor e tesão, humor e carisma. A rebelião antropofágica do corpo continua. Ou precisa continuar. Com ou sem patrocínios oficiais.
O Dzi nos inspira a criar e imaginar sempre. Emocionante ver um espetáculo carregado de irreverência com tantos valores em cena!
Achei a peça mais do que bonita: é vibrante. Os figurinos, iluminação, atores… Que atores! Completos: interpretam (bem), dançam maravilhosamente, cantam, tocam instrumentos musicais… Fora toda acidez e crítica social presente.
Como fui na quinta, o som no início estava ruim, não sei se esse problema se repetiu nos outros dias.
Mas uma pergunta que n deixa de me incomodar: como pode um espetáculo como esse n ter patrocínio?!
Fui assistir ao espetáculo com todos chakras abertos. Queria entrar em contato com o que grupo tinha para apresentar, mas também com a sua memória e foi lindo.